Título: DISCRIMINAÇÃO GANHA TERRENO NA FRANÇA
Autor: discrimninal
Fonte: O Globo, 10/09/2006, O Mundo, p. 44
PARIS. No dia 9 de março, L., uma francesa originária da Mauritânia, chegou à Prefeitura de Argenteuil, na periferia de Paris, para um momento muito especial. Depois de quase duas décadas vivendo na França, ela acabara de obter a nacionalidade, como apontava um decreto nacional. Mas ao entrar na prefeitura, a surpresa: o prefeito George Mothron, do UMP ¿ o partido de direita, no poder ¿ ao vê-la com um véu islâmico, recusou-se a entregar os documentos, bradando um discurso de que ela estava numa república laica. A França de hoje tem estimados cinco milhões de muçulmanos e o Islã já é a segunda religião do país.
O caso está nos tribunais. É mais um na pilha crescente de brigas judiciais que o Movimento contra o Racismo e pela Amizade entre os Povos (Mrap), em Paris, resolveu comprar, na sua luta contra o que considera uma onda de ¿islamofobia¿ no país. Ou seja, a tendência, entre alguns franceses, de colocar no mesmo saco árabes, muçulmanos, terroristas e estrangeiros. O secretário-geral do Mrap, Mouloud Aounit, francês de origem argelina, soa o alarme:
¿ Os ataques de 11 de Setembro foram um detonador. É a terrível realidade, incontestável. Desde 2001, nunca vimos esta forma nova de racismo ganhar uma tal dimensão ¿ diz.
Foi à partir de 11 de setembro de 2001 que grupos de extrema-direita, na sua maioria, passaram a profanar cemitérios muçulmanos na França e atacar mesquitas. Foi também depois desse dia que a França assistiu a uma proliferação de sites na internet com mensagens que associam os árabes e os muçulmanos a terroristas.
Para complicar, organizações ativistas estão divididas. Aounit foi taxado de pró-árabe por outras organizações de combate ao racismo, porque acusa as autoridades francesas de reagirem em casos de anti-semitismo, mas ignorarem a discriminação contra muçulmanos.
¿ A França de hoje é hipócrita. O ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, esforçou-se para dissolver o Tribuka, uma associação de negros anti-semitas. Mas há cinco anos pressionamos o ministério para combater a islamofobia sem sucesso ¿ reclama.
Casos de discriminação extrema contra árabes e muçulmanos acontecem, mas o mais duro para muçulmanos ou árabes da França é a discriminação velada do dia-a-dia, na hora de se candidatar a um emprego ou tentar alugar um apartamento.
¿ Quando você se chama Mohamed, acontece com freqüência de um francês de origem árabe ser barrado em discoteca ¿ diz o jovem advogado do Mrap, Fayçal Megherbi, um argelino há apenas seis anos na França. ¿ Mas é preciso olhar isso tudo com uma certa distância. A discriminação é um comércio político.
De fato, a disputa pela sucessão do presidente Jacques Chirac, em maio de 2007, está esquentando em três temas: segurança, imigração e "islamização" da França. Jacques de Villiers, candidato da extrema-direita, é quem mais explora o tema da ¿islamização¿ da França. Para Vicent Geisser, autor de "A nova islamofobia", os ataques de 2001, segundo ele, só fizeram acordar um velho sentimento antiárabe, resquício do colonialismo.