Título: A NOVA E MAIS SANGRENTA FASE DA RESISTÊNCIA TALIBÃ
Autor: Tom Coghian e Kim Sengupta
Fonte: O Globo, 10/09/2006, O Mundo, p. 47

Combates no Afeganistão são os mais pesados desde a queda do regime. Cultivo de papoula para ópio atinge nível recorde

ve uma guerra sem fim, principalmente no sul

Cinco anos atrás, a al-Qaeda, aliada do Talibã, lançava ataques devastadores aos Estados Unidos que precipitariam a guerra ao terror, a invasão americana do Afeganistão e a subseqüente invasão do Iraque.

Longe de acabar com o terrorismo, as táticas de George W. Bush de usar uma poderosa força militar para combater o extremismo parecem ter tido o efeito contrário, disseminando uma epidemia global de terrorismo que custou 72.265 vidas desde 2001, a maioria delas de civis iraquianos. Os demais, 30.626 de acordo com estimativas americanas, foram mortos numa combinação de ataques terroristas e ações de contra-insurgência dos Estados Unidos e seus aliados.

A invasão liderada pelos EUA varreu o regime talibã em questão de semanas, e fez o mesmo com o Partido Baath, de Saddam Hussein, em 2003. Mas longe de trazer estabilidade para Afeganistão e Iraque, o resultado foi a guerra permanente. Semana passada, centenas de soldados da Otan se envolveram numa ofensiva a sudoeste de Kandahar, que tem sido o centro da resistência talibã. Trezentos rebeldes morreram na batalha, que matou também quatro canadenses. Mais de 2.300 pessoas já morreram este ano em confrontos no país, que registrou os combates mais pesados desde a queda do regime fundamentalista islâmico.

¿O Talibã está de volta¿, diz estudo de centro britânico

O distrito onde nasceu o líder do Talibã, mulá Omar, está novamente sob controle da milícia fundamentalista islâmica, uma situação que se repete em outras áreas do sul do país. O governo de Hamid Karzai tenta manter o controle de cidades do sul, enquanto as tropas da Otan em Kandahar e Helmand estão presas à guerra.

Nos distritos de Punjwai e Jerai, a sudoeste de Kandahar, cerca de 1.500 combatentes talibãs resistem às tentativas de soldados afegãos e canadenses de removê-los. A resistência marca uma nova fase na crescente insurgência talibã, uma evolução da tática ataca-e-foge, que envolvia grupos de 8 a 15 combatentes, antes de grandes grupos de rebeldes tomarem o território.

Em meio à guerra, um antigo problema alcançou proporções alarmantes. As colheitas de papoula para ópio atingiram este ano os mais altos índices já registrados. Segundo o diretor da agência da ONU para Drogas e Crimes, Antonio Maria Costa, houve um aumento de quase 50% em relação a 2005.

O crescimento foi estimulado pelos rebeldes, afirma a ONU. O Talibã chegou a distribuir folhetos incentivando fazendeiros a aumentarem seus cultivos em troca de proteção. O tráfico se transformou em fonte de renda dos insurgentes, que recebem dinheiro ao assegurar a passagem de comboios de drogas.

¿ Este ano a colheita ficará em torno de 6.100 toneladas de ópio, 92% do total do fornecimento mundial ¿ informou Costa.

A situação em que o país se encontra levou o centro de estudos britânico Senlis Council a dizer que ¿o Afeganistão está caindo nas mãos do Talibã¿.

¿O Talibã está de volta e tem forte controle psicológico e militar sobre metade do país¿, diz o relatório ¿Afeganistão, cinco anos depois: o retorno do Talibã¿. O texto acrescenta que ¿a comunidade internacional fracassou em alcançar a estabilidade e a segurança¿ no país.

O estudo afirma que os afegãos se sentem traídos pela comunidade internacional. Apesar do alto crescimento econômico registrado nos últimos cinco anos (acima de 10% anuais), o Afeganistão continua sendo um dos países mais pobres do mundo. Embora tenha havido conquistas ¿ como a volta de 4,5 milhões de refugiados e a escolarização de 5 milhões de crianças ¿ 60% da população ainda não têm energia elétrica e 80% não têm acesso à água potável.

Mesmo diante da extrema pobreza, é cada vez maior a distância entre os fundos militares e aqueles para a reconstrução. O relatório do centro britânico afirma que entre 2002 e 2006 foram destinados US$82,5 bilhões para gastos militares e apenas US$7,3 bilhões para estimular o desenvolvimento. ¿A menos que as prioridades da comunidade internacional mudem imediatamente e radicalmente, o apoio ao Talibã crescerá e levará ao colapso do país¿, diz o informe.

Outro fato que parece ter progredido pouco é a situação das mulheres que, cobertas da cabeça aos pés, transformaram-se num símbolo da repressão talibã. Embora conquistas tenham sido registradas em áreas controladas pelo governo ¿ e até um ministério tenha sido criado ¿ um relatório da Anistia Internacional do ano passado afirma que poucas são as afegãs que estão a salvo da violência.

Com agências internacionais