Título: POLÍTICA EM MEIO À DOR EM NY
Autor: Helena Celestino
Fonte: O Globo, 11/09/2006, O Mundo, p. 18

Presidente tenta recuperar popularidade enquanto homenageia mortos do 11 de Setembro

Na véspera do quinto aniversário do atentado terrorista que mudou o mundo, o presidente George W. Bush voltou ontem ao Ground Zero para homenagear os 2.749 mortos do 11 de Setembro em Nova York e, ao mesmo tempo, tentar recuperar a popularidade perdida após anos de guerras sucessivas no Oriente Médio e medidas políticas domésticas contestadas.

Numa coreografia cuidadosamente desenhada pelos estrategistas da Casa Branca, o presidente e a primeira-dama, Laura Bush, desceram de mãos dadas uma rampa às 16h55m em direção ao grande buraco deixado pelo desabamento do World Trade Center no coração de Manhattan. Vestidos de preto, jogaram uma coroa de flores ¿ com cravos brancos e vermelhos e lírios azuis ¿ num espelho d¿água improvisado no lugar onde ficava a Torre Norte e, enquanto as flores flutuavam, permaneceram de cabeça baixa e em silêncio. Repetiram o mesmo ritual no espaço antes ocupado pela Torre Sul.

Depois, ao lado do prefeito Michael Bloomberg, do governador George Pataki e do ex-prefeito Rudolph Giulliani, os dois participaram de um serviço religioso ecumênico na catedral de Saint Paul, uma igrejinha de 249 anos ao lado do local onde ficava o World Trade Center que sobreviveu por milagre à derrubada das torres.

Bush visita local dos outros ataques hoje

Bush e Laura passaram oito minutos no Ground Zero, mas isso foi suficiente para os serviços de segurança fecharem o espaço aéreo de Manhattan por dois dias (ontem e hoje) e bloquear todas as ruas em volta do buraco, mantendo longe de Bush os vários grupos de protestos que se reuniram perto das barreiras de ferro para protestar com faixas e palavras de ordem contra a guerra do Iraque e a redução das liberdades civis causadas pela política antiterrorista americana.

¿ Bush vem aqui fazer política, sem vergonha de usar a tragédia e a tristeza dos nova-iorquinos ¿ disse uma das senhoras da Brigada de Avós e Avôs contra a guerra, com uma faixa pedindo o impeachment de Bush.

A volta do presidente ao Ground Zero ontem é uma tentativa de atrasar o relógio do tempo. Foi logo depois da tragédia que Bush viveu seu melhor momento politico, simbolizado por uma imagem dele, no meio dos escombros ainda fumegantes do World Trade Center, com um capacete de bombeiros e a bandeira americana como pano de fundo.

É em busca de pelo menos uma parte dos 91% de aprovação conseguidos com sua reação aos atentados que a Casa Branca desenhou a estratégia de cerimônias para lembrar os cinco anos do 11 de Setembro. Hoje, pela primeira vez desde 2002, Bush visitará os três lugares atacados. Ele e a primeira-dama começarão o dia tomando café da manhã com bombeiros de Nova York e, junto com eles, observarão um minuto de silêncio às 8h46m, hora exata em que o primeiro avião bateu na torre. De Manhattan, vai para a Shanksville, a cidade da Pensilvânia onde o vôo 93 foi derrubado pelos passageiros na tentativa de evitar que os seqüestradores usassem o avião como bomba. Termina o dia de volta em Washington, onde visita o Pentágono e, à noite, faz um discurso no Salão Oval da Casa Branca, repetindo outra cena de cinco anos atrás: foi nesse mesmo cenário, em 11 de setembro de 2001, que o presidente americano lançou a chamada ¿doutrina Bush¿, a política de guerra preventiva que serviu de justificativa para a guerra do Afeganistão, a invasão do Iraque e a adoção de duras políticas domésticas.

A nove semanas de difíceis eleições legislativas ¿ nas quais os republicanos podem perder a maioria na Câmara e no Senado ¿ e com popularidade em torno de 35%, Bush e os estrategistas da Casa Branca estão jogando todas as fichas no quinto aniversário dos ataques para tentar tirar o país do pessimismo com o fracasso militar no Iraque e da depressão com sucessivas denúncias de desrespeito às convenções de Genebra no trato de prisioneiros de guerra. Ontem, o vice-presidente, Dick Cheney, e a secretária de Estado Condoleezza Rice separadamente, defenderam a política americana no Iraque, mas uma pesquisa de opinião mostrou que 54% dos americanos acham que as ações bélicas dos EUA estão criando mais terroristas.

¿ Acho claro que estamos mais seguros, mas ainda não exatamente seguros, embora já tenhamos feito muito ¿ disse Rice.

Cheney, que previra em 2004 o fim do fôlego dos insurgentes iraquianos, reconheceu que a situação está mais difícil do que pensara.

¿ Estavam mais organizados e eram mais capazes do que antecipamos ¿ disse Cheney, que defendeu a invasão do Iraque.

Para mudar o clima de pessimismo dos americanos com o governo, Bush fez semana passada quatro discursos, relembrando a ameaça terrorista e reafirmando sua estratégia para proteger o solo americano de novos ataques.