Título: MERCADO DE CRÉDITOS DE CARBONO
Autor: Rubens Barbosa
Fonte: O Globo, 12/09/2006, Opinião, p. 7

Omercado de carbono é uma das mais interessantes facetas do esforço internacional para combater a mudança do clima, principal tema ambiental da atualidade.

O Protocolo de Kioto, assinado em 1997, mas que só entrou em vigor em 2005, é um dos resultados concretos das discussões no contexto da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, aprovada na Conferência do Rio, 1992.

O protocolo define metas quantitativas de limitação de emissões apenas para os países desenvolvidos e países europeus ex-comunistas. Esses países podem atingir suas metas individualmente ou em conjunto, por meio de ¿mecanismos de flexibilização¿, como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), derivado de proposta brasileira. Os países em desenvolvimento não têm metas a cumprir pelo protocolo, mas projetos realizados em seus territórios, uma vez aprovados pelo Conselho Executivo do MDL, podem ser usados por países desenvolvidos para obter créditos que os ajudem a cumprir com as metas que assumiram no protocolo.

Apesar de o terem assinado em 1998 (governo Clinton), os Estados Unidos anunciaram em 2001 que não ratificarão o Protocolo de Kioto, alegando que o instrumento seria injusto e ineficaz por não estabelecer metas para os grandes países em desenvolvimento. Não obstante, criou-se na Bolsa de Chicago um mercado voluntário para as empresas que se interessarem em comercializar créditos de carbono, além de algumas iniciativas estaduais, destacando-se a da Califórnia e de outros estados do Nordeste americano.

Com a oferta de projetos em países em desenvolvimento e a demanda de créditos por parte de empresas dos países desenvolvidos, formou-se um mercado para a compra e venda desses créditos, inicialmente na Europa, em Paris, em Londres e na Noruega. Cerca de US$12 bilhões de créditos foram transacionados no ano passado. Em 2006, esse número deverá triplicar.

Na Europa, o mercado para transação de licenças de dióxido de carbono entrou em vigor em 1 de janeiro de 2005, com o estabelecimento do esquema europeu de comércio de emissões (European Union Emission Trading Scheme ¿ ETS). O ETS objetiva limitar, conforme as metas de Kioto, as emissões de CO2 de fontes definidas (geradoras de energia elétrica, siderúrgicas, refinarias, fábricas de cimento etc.).

Em abril passado, a União Européia divulgou as quantidades de emissões medidas e certificadas em 2005, o primeiro ano do sistema. Foi a primeira vez que se realizou esse tipo de contagem, pois até então se trabalhava apenas com previsões. Revelou-se que vários países, incluindo a França e a Espanha, emitiram menos que o previsto. De pronto o mercado reagiu negativamente: haveria excesso na oferta de créditos. As cotações despencaram, passando de 27 euros para perto de 10 euros em poucos dias. Hoje, porém, as cotações já se recuperaram em boa parte e se situam ao redor de 20 euros.

Além desse comportamento volátil no curto prazo, outras incertezas existem no longo prazo, principalmente com relação ao que ocorrerá após o encerramento do primeiro período de Kioto, em 2012. As regras para 2013 em diante ainda estão em discussão. A longo prazo é improvável que um esquema de redução de emissões funcione adequadamente com um preço abaixo de certo limite. Pode-se esperar que os países membros do ETS e do Protocolo de Kioto se mobilizem para sustentar preços em determinado nível.

É importante o acompanhamento dessas movimentações no mercado internacional de emissões porque o Brasil já participa como um dos mais importantes ofertantes de projetos de MDL, ao lado da Índia e, sobretudo, da China (com projetos avaliados em mais de US$6 bilhões), e porque a BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros) deverá se tornar um ator importante nesse mercado.

A BM&F já lançou o Banco de Projetos e deverá inaugurar, ainda este ano, o sistema de negociação de créditos de carbono de MDL. Por meio deste sistema, a BM&F organizará leilões eletrônicos que poderão ser acessados, via internet, pelos participantes do mercado de carbono internacional. Este será o primeiro ambiente organizado e regulado na América Latina que estará voltado à negociação de créditos de MDL. A implementação de um centro de liquidez transparente deverá contribuir para o maior desenvolvimento do mercado de MDL no Brasil e no mundo, uma vez que favorece o fechamento de negócios justos, seguros, e que envolvam baixos custos transacionais.

RUBENS BARBOSA é consultor e presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).