Título: OS NÚMEROS DE CADA UM
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 13/09/2006, O País, p. 4

Não há nada que irrite mais os eleitores de Lula situados entre os de maior renda e os mais escolarizados, do que a afirmação de que a possível reeleição já no primeiro turno se deveria aos votos do eleitorado de menor renda e de menor escolaridade, especialmente os do nordeste. A pesquisa do Datafolha divulgada ontem pelo Jornal Nacional, embora confirme o favoritismo de Lula em todas as regiões do país, informa que exatamente isso está acontecendo. O candidato tucano já vence entre os eleitores de renda familiar acima de cinco salários mínimos, sendo que ganhou nada menos que 14 pontos percentuais entre os que têm renda superior a dez salários, passando de 38% para 52% das intenções de voto, maior taxa desde junho, e que lhe dá uma vantagem de 27 pontos sobre Lula, que caiu de 35% para 25% nesse segmento.

Entre os que têm rendimentos entre cinco e dez salários mínimos, Lula passou de 41% para 36% e Alckmin variou de 34% para 39% das intenções de voto. O candidato tucano voltou a ganhar sete pontos percentuais entre os eleitores com escolaridade superior, passando de 36% para 43%, enquanto o petista caiu de 34% para 29% nesse segmento. É verdade que Lula ganha em todas as regiões do país, mas no sul já empata com Alckmin - 35% a 34% - e abre ampla vantagem mesmo é no norte - 53 a 30 - e principalmente no nordeste, onde vence de 70 a 15.

Segundo o Datafolha, as maiores variações nas intenções de votos se devem à elevação do tom das críticas no horário eleitoral e nas entrevistas, em especial o programa em que, baseado em uma reportagem do Jornal Nacional, Alckmin percorreu a BR-316, no Maranhão, considerada a pior estrada do país.

A mudança de posicionamento dos eleitores desses segmentos é mais expressiva ainda quando se compara com o resultado da pesquisa anterior, quando Lula subiu de aceitação entre esses mesmos eleitores. Lula vence com folga tanto nas regiões metropolitanas - 46 a 29 - quanto no interior - 53 a 27 -, mas a intenção de votos nele também está caindo em todas as cidades: até 35 mil habitantes, caiu de 56 para 47; de 35 mil a 100 mil habitantes, caiu de 54 para 41 e nas de mais de 100 mil habitantes caiu de 46 para 35.

Também a taxa de rejeição a Lula voltou ao mesmo patamar do início de agosto: 29% não votariam de jeito nenhum nele no primeiro turno da eleição para presidente, taxa cinco pontos maior do que a de Geraldo Alckmin, que é rejeitado por 24% dos eleitores. Embora não seja uma conclusão oficial do Datafolha, essa volatilidade do eleitorado indicaria que uma campanha mais agressiva por parte do candidato tucano na reta final da eleição pode levar a novos movimentos nessa camada de eleitores.

Essa seria a única chance de Alckmin conseguir levar a eleição para o segundo turno, já que no eleitorado de menor renda e menos escolaridade, o voto em Lula parece consolidado. A favor de Lula, há diversos indicadores na pesquisa divulgada ontem: o voto espontâneo, que é considerado consolidado, continua sendo da ordem de 40% e, ao contrário do que dizem os analistas da oposição, o eleitorado de Lula mostra-se o mais bem informado sobre qual número digitar na hora de votar.

Segundo o Datafolha, embora tenha aumentado o conhecimento dos eleitores sobre o número de seus candidatos após quatro semanas de horário eleitoral gratuito no rádio e na TV, "parcela expressiva", nada menos que 54% dos eleitores, ainda não sabe que número deve digitar na urna eletrônica. Os eleitores que têm intenção de votar em Lula são os mais bem informados: 53% respondem corretamente.

Já entre os eleitores de Geraldo Alckmin, 61% ainda não sabem que número devem digitar. Os analistas da oposição têm uma tese com relação a isso: se a diferença entre Lula e os demais candidatos chegar ao dia 1 de outubro com menos de dez pontos percentuais, ela pode ser desfeita nas urnas devido aos votos nulos, em brancos e às abstenções, os chamados "não-votos".

Essa diferença seria maior entre os eleitores de Lula, pois acontece historicamente de o nordeste ter um índice maior desses "não-votos" do que as demais regiões do país. A vantagem de Lula, que era de 13 pontos, caiu para 11 nesta pesquisa. Lula estaria reeleito com 56% dos votos válidos.

A média dos que consideram ótimo ou bom o governo Lula caiu de 48% para 46%, o que indicaria, para a oposição, o teto de intenções de votos de Lula. Em pesquisas internas, a oposição continua trabalhando com números diferentes do que apontam as pesquisas: Lula teria por volta de 45%, e Alckmin 32%, o que indicaria o segundo turno. Para que esses números de concretizem nas urnas, seria necessário que nos próximos 18 dias Alckmin subisse entre 4 a 5 pontos percentuais e Lula caísse outro tanto.

Embora as últimas pesquisas mostrem uma tendência de queda de Lula e uma curva ascendente de Alckmin, o ritmo de mudança é bastante lento. Para os governistas, o que há é uma estabilidade, com os números variando dentro da margem de erro. Para os oposicionistas, a subida de Alckmin se acelerará nos últimos dias de campanha.

Nada indica que exista tempo para essa virada, e a campanha de Alckmin não demonstra interesse em acelerar a estratégia mais agressiva. Se, apesar disso, conseguir ir para o segundo turno, Alckmin reforçará o mito de que é bom de eleição. Se perder no primeiro turno, como tudo indica, confirmará que é apenas um político regional.