Título: 'De repente, virei uma Geni', diz Suassuna
Autor: Chico de Gois
Fonte: O Globo, 13/09/2006, O País, p. 10

Em depoimento ao Conselho de Ética do Senado, senador chora e nega envolvimento com os sanguessugas

BRASÍLIA. Em depoimento de mais de duas horas no Conselho de Ética do Senado, na presença dos filhos e da mulher, o senador Ney Suassuna (PMDB-PB) chorou e negou que tenha se beneficiado do esquema de superfaturamento de venda de ambulâncias a prefeituras. Ele culpou seu ex-assessor Marcelo Carvalho, a quem acusou de agir por conta própria, embora o tenha elogiado em vários momentos. Suassuna comparou-se a um personagem do livro "Bola de sebo", de Guy de Maupassant, depois musicado por Chico Buarque.

- De repente, virei uma Geni - disse o senador, em alusão ao personagem que, embora tenha se prostituído para salvar prisioneiros de seu país, acabou atacada.

As declarações de Suassuna, porém, não abalaram as convicções do relator de seu processo, Jefferson Peres (PDT-AM). Embora não tenha adiantado o teor de seu parecer, que deverá apresentar na próxima quarta-feira, Peres disse que "o parlamentar pode ter cometido falta de decoro sem necessariamente ter cometido ato ilícito".

"Eu não mereço isso", reclama Suassuna

Suassuna chorou ao ler a carta de uma suposta eleitora de 16 anos, disse que na Paraíba é conhecido como senador trabalhador e que é rico e não precisa de migalhas, numa alusão ao valor baixo da propina que supostamente teria recebido:

- Eu não mereço isso.

Suassuna partiu para o ataque, mas não fez denúncias contra seus colegas parlamentares, como chegou a insinuar que faria. Os alvos preferenciais, além de Darci e Luiz Antonio Vedoin, sócios da Planam, chamados de bandidos pelo senador, foram a imprensa e membros da CPI dos Sanguessugas, especialmente seu presidente, deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ). Em depoimento ao Conselho de Ética do Senado, Biscaia disse que Suassuna lhe havia dito que "90% dos parlamentares pegam uma beirada nas emendas ao orçamento". Perguntado sobre por que Biscaia faria tal acusação, o senador disse:

- Vaidade. Ele se acha o dono do mundo. É a terceira vez que este cidadão bate em mim dizendo coisas que não devia.

O senador disse que a imprensa tem feito um patrulhamento não apenas contra ele, mas contra todos os senadores para que cassem seus pares. E ao contrário do que afirmara antes, quando negou que soubesse das emendas que apresenta ao Orçamento da União, confirmou que apresentou emendas para a compra de ambulâncias, mas se disse enganado por Marcelo Carvalho:

- Tudo aconteceu às minhas costas. Eu sabia de quase tudo.

Ele mostrou laudo grafotécnico para provar que não eram suas as assinaturas em ofícios cobrando a liberação de emendas. Mas admitiu que os documentos foram assinados por sua funcionária, que, segundo contou, o fez de boa-fé.

Peres estranhou o fato:

- Não é preciso cometer ilícito penal para quebrar o decoro parlamentar. Pode ter quebrado o decoro por muitas outras ações e omissões.

Depois de Suassuna, o chefe de gabinete do senador Magno Malta (PL-ES), Hazenclever Lopes Cançado, prestou esclarecimentos. Darci Vedoin havia dito que encontrara com ele no gabinete do senador. Hazenclever negou.

O que mais chamou a atenção do relator Demóstenes Torres (PFL-GO), responsável pelo processo de Malta, foi a suspeita de enriquecimento ilícito por parte de Hazenclever, que contou que sua mulher e suas duas filhas são proprietárias de uma faculdade de ensino à distância. E teve uma concessão de TV, depois revendida, segundo contou.

Demóstenes também tem dúvidas sobre a origem do veículo usado por Malta, que disse que o deputado Lino Rossi (PP-MT) lhe emprestara o veículo. Porém, um dos donos do carro, José Luiz Cardoso, teve dificuldades em explicar por que, um ano depois de vendido, o automóvel ainda continuava em seu nome.

- A única certeza que temos é que o carro saiu da fábrica- ironizou Demóstenes.

A última atividade do conselho foi a acareação entre Luiz Antonio Vedoin, o genro da senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), Paulo Roberto Ribeiro, e o genro de Darci Vedoin, Ivo Marcelo Spínola. Ribeiro manteve o que disse anteriormente: que teria recebido R$37.200 da Planam como pagamento por venda de materiais hospitalares. Vedoin disse que pagou R$35 mil em dinheiro para ele pagar dívidas de campanha de Serys, mas fez questão de livrar a senadora.