Título: HÁ MAIS JOVENS DE 15 A 17 ANOS FORA DA ESCOLA
Autor: Luciana Rodrigues, Leticia Lins e Lino Rodrigues
Fonte: O Globo, 16/09/2006, Economia, p. 32

Especialistas alertam que quadro pode afetar, no futuro, qualidade da mão-de-obra. Ensino ruim pode explicar êxodo

RIO, RECIFE e SÃO PAULO. Com o Ensino Fundamental praticamente universalizado, o Brasil ainda esbarra na dificuldade de aumentar a escolarização de seus jovens. Pelo segundo ano consecutivo, a parcela de adolescentes entre 15 e 17 anos fora da escola subiu e, em 2005, chegou a 18%. Se por um lado esses jovens foram atraídos por um mercado de trabalho mais dinâmico; por outro, sua saída precoce dos bancos escolares prejudica a qualidade da mão-de-obra. E poderá levar, no futuro, a uma queda mais lenta da desigualdade de renda no país.

¿ O maior número de jovens fora da escola foi a pior notícia da Pnad em 2004 e, agora, se repete. Por razões fiscalistas, o Fundeb (fundo para financiar o Ensino Básico) demorou quatro anos para ser aprovado. Espero que agora, quando o Fundeb entrar em vigor, esse quadro se corrija ¿ afirmou Sergei Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Para Naércio Menezes Filho, economista da USP, se confirmada que a saída dos jovens da escola é um fenômeno estrutural ¿ e não apenas um movimento cíclico dos últimos dois anos ¿ acende-se um sinal de alerta para o futuro:

¿ O maior nível de educação no mercado de trabalho teve um papel importante na redução consistente da desigualdade que começou a ocorrer desde 2001.

Menezes Filho defende uma ampliação do Bolsa Família que, hoje, só atende a crianças até os 14 anos, como forma de reter os jovens na escola. Segundo ele, muitos adolescentes param de estudar porque avaliam que a qualidade do ensino é ruim e não vai compensar, em termos de renda no futuro, o desgaste de uma jornada dupla.

O paulistano Danilo, que pede para não divulgar o nome todo, não suportou o peso de estudar e trabalhar ao mesmo tempo. Optou por deixar a escola e, em julho, largou a oitava série noturna de uma escola pública na periferia da Zona Sul de São Paulo.

Vendedor informal de perfumes na Ladeira Porto Geral, no Centro da capital paulista, ele ganha entre R$100 e R$150 por mês. Parte do dinheiro ajuda nas despesas da família, o que sobra é gasto em roupas e refeições fora de casa. Danilo conta que abandou a escola por causa da dupla jornada.

¿ Era muito pesado trabalhar de dia e estudar à noite ¿ conta Danilo, de 17 anos.

Em Recife, Fábio Santos Lopes, 17, o quarto de uma família de quatro irmãos, é o único que não concluiu o Ensino Médio. Órfão de pai e mãe, Fábio conta que sua avó sempre lhe diz que quem não estuda não consegue serviço que preste. Mas Fábio diz que deixou a escola porque se sentia discriminado quando não entendia as lições.

¿ Chegou a um limite que eu não entendia mais nada. Fui perdendo a paciência, achava os professores arrogantes e terminei com vergonha dos colegas e deixei a escola. Saí, mas me arrependo, porque sei que vai ser difícil arranjar emprego. Até hoje só arranjei biscate.

À exceção da faixa etária entre 15 e 17 anos, cresceu a escolarização das crianças. A parcela de 5 ou 6 anos fora da escola caiu de 18,9% para 18,5%. E cresceu em 370 mil o número de alunos nas universidades.

Para o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Lauro Ramos, a queda na escolarização dos jovens pode ser o efeito colateral do aquecimento no mercado de trabalho:

¿ Como a escolarização ficou menor exatamente nas regiões Sudeste e Sul, onde se paga mais e há mais oportunidades, os jovens podem ter sido atraídos para o mercado de trabalho.

Mas a mesma pesquisa mostrou que a ocupação nessa faixa caiu:

¿ Então, a situação fica mais preocupante, pois demonstra que esses jovens estão à procura de emprego, ou seja, desempregados. Outra opção é não estar nem estudando ou trabalhando. É preciso investigar melhor essa situação.

Para o sociólogo Adalberto Cardoso, do Iuperj, mesmo com essa queda recente entre os jovens, a escolarização total vem crescendo sistematicamente há décadas:

¿ Fruto de políticas públicas consistentes. Houve uma mudança na importância da educação para as famílias. E toda a sociedade ganha, há um efeito civilizatório nesse processo.