Título: MINISTRO BOLIVIANO RENUNCIA DEPOIS DA CRISE
Autor: Janaina Figueiredo, Eliane Oliveira e Monica Tavar
Fonte: O Globo, 16/09/2006, Economia, p. 36
Titular da pasta de petróleo deixa governo de Evo Morales depois de `congelada¿ resolução que afetava Petrobras
BUENOS AIRES e BRASÍLIA Um dia depois de ter sido obrigado a ¿congelar¿ uma polêmica resolução que transferia para o Estado boliviano o controle da comercialização do petróleo e derivados, medida que provocou um gravíssimo incidente com o governo brasileiro, o ministro boliviano dos Hidrocarbonetos, Andrés Soliz Rada, apresentou ontem sua renúncia ao cargo. Em carta enviada ao presidente da Bolívia, Evo Morales, Soliz Rada alegou motivos pessoais para abandonar o governo. No entanto, segundo informações que circularam ontem em La Paz, o ex-ministrou sentiu-se humilhado pela decisão do governo Morales de suspender a medida anunciada terça-feira passada, em meio à forte pressão do governo Lula.
O novo ministro é Carlos Villegas, que deixa o Ministério de Planificação do Desenvolvimento, a ser ocupado por Hernando Larrazábal Córdoba. Na posse de Villegas, o vice-presidente boliviano, Álvaro García Linera, reforçou que existe negociação, mas que o governo fará valer decreto de nacionalização:
¿ Às companhias petrolíferas, dizemos que temos ampla capacidade de negociação, mas também seremos intransigentes quando chegar o momento. Existe uma etapa de negociação, mas também de aceitação. Seremos duros se não for acatado o decreto de nacionalização.
Segundo recentes pesquisas divulgadas na Bolívia, Soliz era o ministro mais popular do gabinete de Morales, com quase 50% de aprovação.
Brasil vê sinais de manutenção da suspensão
Também renunciaram o vice-ministro de Industrialização e Comercialização, William Donaire, o diretor geral de Produção e Exploração, Humberto Claure, o diretor geral de Industrialização e Comercialização, Mariano Dupleich, e a diretora geral de Assuntos Jurídicos, Cecília Rocabado. Há cerca de um mês, a equipe de Soliz sofreu um revés, quando foi afastado o ex-presidente da YPFB Jorge Alvarado.
Na carta dirigida a Morales, o ex-ministro lamenta o fato de ¿não termos conseguido incluir no decreto a expropriação das ações necessárias da Chaco (British Petroleum), Andina (Repsol YPF) e Transredes (Shell e Ashmore), de forma a dar a YPFB o controle imediato de 50% mais um do pacote de ações¿. A declaração prova que ele era um dos ministros mais radicais do governo.
Além da demissão do ministro, o governo da Bolívia emitiu ontem mais um sinal de que manterá o ¿congelamento¿ da resolução que determinava a transferência do controle da comercialização da produção da Petrobras. Pela manhã, em um rápido encontro com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, no plenário da reunião do Movimento dos Países Não-Alinhados, em Havana, Cuba, Morales confirmou, pela primeira vez, a suspensão da medida. Segundo ele, a suspensão vai ¿facilitar as negociações técnicas e jurídicas¿ com a Petrobras.
¿ Nesse processo pode haver algumas diferenças ¿ reconheceu Morales, ressaltando que a Bolívia ¿precisa de sócios, não de patrões nem donos¿.
O governo brasileiro comemorou a notícia da saída de Soliz. No Palácio do Planalto, a demissão foi vista como vitória do lado ponderado e um gesto de que o momento é de negociação. Alguns interlocutores chegaram a afirmar, ironicamente, que no governo estavam ¿todos de luto¿.
¿ Sem ele, será mais fácil negociar com a Bolívia ¿ afirmou uma fonte do governo.
Antes do encontro com Morales, Amorim reforçava a decisão de o Brasil continuar negociando, desde que os interesses sejam preservados:
¿ Não é que o Brasil venha ameaçando a Bolívia com isto ou aquilo. Temos as melhores intenções de ter boas relações, mas há coisas que ocorrem naturalmente. A Bolívia precisa de investimentos, inclusive para continuar exportando o gás.
Responsável pela negociação com o governo boliviano, o assessor especial para assuntos internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, disse ao GLOBO que o próximo passo será a reunião marcada para o mês que vem:
¿ O governo brasileiro reagiu prontamente. O importante é que agora haverá uma negociação, e não uma atitude unilateral. Pelo menos, foi isso o que ficou garantido.
(*) Com agências internacionais