Título: Um batalhão de teólogos em defesa do Papa
Autor: Graça Magalhães
Fonte: O Globo, 16/09/2006, O Mundo, p. 39

Para pensadores da religião, as palavras de Bento XVI foram tiradas de contexto e mal-interpretadas

BERLIM. Depois que muçulmanos do mundo inteiro criticaram radicalmente o discurso do Papa, teólogos e jornais alemães saíram em defesa do Pontífice, opinando que ele quis apenas usar uma fonte científica para mostrar que ¿a crença e a religião nunca podem estar ligadas à violência¿.

Alguns acreditam que Bento XVI confundiu seu antigo papel de professor de teologia com o atual, de chefe da Igreja Católica.

¿ Ele perdeu a costumeira cautela e falou como o professor de teoria teológica ¿ disse Thomas Winkel, redator de teologia da agência de notícias católica KNA, que pertence à Conferência dos Bispos da Alemanha.

Jornais consideram reação islâmica exagerada

Christoph Dohmen, diretor da Faculdade de Teologia Católica da Universidade de Ratisbona, é um dos que procuram matizar o significado do que Bento XVI disse em seus discursos. Para ele, a ¿aula¿ de alta teologia era, na verdade, destinada a uma platéria seleta, porque o assunto é complexo demais para ser entendido por um público amplo. Segundo o professor Dohmen, até entre os estudantes havia alguns que não estavam ainda aptos a compreender ¿um tema específico da teologia abordado em um alto nível¿.

¿ Como cientista, o seu discurso devia ser visto como uma contribuição acadêmica ¿ disse ele.

Muitos jornais alemães vêem como exageradas as reações muçulmanas, que seriam associadas à falta de prática de uso de citações polêmicas tendo em vista uma abordagem científica. O filósofo Otto Kallscheuer, que foi aluno do então professor Joseph Ratzinger na Universidade de Bonn, aconselhou o Pontífice a não perder os nervos.

¿ O Papa não deve pedir desculpas porque não fez nada de condenável . O Vaticano deve tentar explicar ao mundo muçulmano que as declarações foram compreendidas erradamente porque foram retiradas de contexto ¿ disse.

Para o teólogo Rainer Kampling, a polêmica começou na Turquia porque o país tem uma relação complicada com a religião. Na época de Constantinopla, a Turquia passou a ser muçulmana. Mas, assim mesmo, o país quer receber a visita do Papa no final de novembro ¿ apesar das ameaças de alguns políticos turcos ¿ porque a vê como importante para o processo de ingresso do país na União Européia.

Mas Hans Küng, professor de teologia que conheceu o então professor Joseph Ratzinger como colega, disse que Bento XVI mostrou mais uma vez o seu unilaterismo, como já fez no passado também em relação ao protestantismo.

¿ Não foi uma ofensa intencional, mas um discurso infeliz. Eu o aconselharia a uma explicação e que admitisse no mesmo contexto que também a sua Igreja Católica tem a sua carga de responsabilidade por violência no passado ¿ disse Küng.