Título: HELOÍSA NEGA POSSIBILIDADE DE VOLTA DA INFLAÇÃO
Autor: José Meirelles Passos/Lydia Medeiros/Cássio Bruno
Fonte: O Globo, 19/09/2006, O País, p. 18

Candidata discute em entrevista na TV Globo e erra ao falar de política externa com correspondentes estrangeiros

Sem conseguir explicar exatamente por que, a senadora Heloísa Helena, candidata do PSOL à Presidência da República, afirmou em entrevista ao "Bom Dia Brasil", da TV Globo, que é impossível a ocorrência de um surto inflacionário no Brasil. Num estilo próximo à retórica do presidente Lula, ela foi taxativa:

- Não haverá, porque nunca na história do Brasil nem na história da humanidade aconteceu um surto inflacionário isoladamente em um país - disse, ao responder pergunta sobre a hipótese de volta da alta dos preços com a reposição salarial mensal da inflação, prevista no programa do PSOL.

O debate sobre as idéias da candidata para a economia levou a uma discussão dura entre ela e a jornalista Miriam Leitão, que participou da entrevista. Miriam lembrou que não é verdade a idéia de que a inflação só existe num país se todos os demais também tiverem o problema.

- Nós vivemos um período de inflação de 30 anos, e o mundo inteiro tinha inflação baixa... - disse a jornalista.

- Não. Não é verdade - rebateu Heloísa.

Senadora diz que não fará terrorismo com inflação

Miriam citou como exemplos a Turquia e a Venezuela, com inflação acima de 10%, mas a candidata manteve sua posição. Miriam insistiu no risco:

- Nesse momento não há, mas pode haver.

- No meu governo não haverá - disse Heloísa.

- A senhora é quem decide? - provocou Miriam.

- Não é uma vontade soberana, é que as regras do mercado estabelecem isso - disse a candidata. - Não vamos fazer terrorismo da volta da inflação porque não haverá.

Em outro momento, ao falar de Previdência, Heloísa voltou a discutir duramente. A jornalista lembrou que a senadora brigara com o PT quando o governo propôs a redução das maiores aposentadorias:

- Essa é a sua forma de defender os mais pobres Ö brigar pelo direito de quem ganhar mais no sistema previdenciário? - perguntou Miriam.

- Isso é impossível. Meu Deus, estou impressionada com essa colocação. Realmente, os aprendizes de (Joseph) Goebbels, que era o publicitário de estimação de (Adolph) Hitler, que dizia que "mentira repetida muitas vezes vira verdade"...

Miriam retrucou:

- A senhora está dizendo que eu estou mentindo?

- Não, não. Eu estou dizendo que eles enganaram.

Candidata cobra investigação de dossiê

No calçadão de Bangu, em corpo a corpo, Heloísa cobrou que a Polícia Federal investigue não só a origem de R$1,7 milhão que seria usado na compra de um dossiê contra o candidato do PSDB ao governo de São Paulo José Serra, mas todos os escândalos de corrupção.

- São dólares nas peças íntimas do vestuário feminino, são milhões de reais onde ninguém sabe de onde é. Precisamos saber se esse dinheiro é da corrupção, se foi roubado de algum lugar clandestino ou se é do narcotráfico e do crime organizado. Não é possível que não se identifique tanto dinheiro rolando.

Ainda de manhã, ela revelou, em entrevista na Associação dos Correspondentes de Imprensa Estrangeira (Acie), que sua estratégia se apóia sobre dois pilares: a intuição e a especulação. Disse que devido à falta de recursos para contratar pesquisas qualitativas, é intuindo e especulando que tem "certeza absoluta" que disputará o segundo turno com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Ao falar de política externa, disse que "meninas brasileiras que tentam melhorar de vida" entrando clandestinamente nos Estados Unidos, fugindo "do capitalismo perverso e cruel do Brasil para a terra da liberdade", são barradas por um muro na fronteira do México com os EUA "que é pior que o muro de Berlim". E completou:

- Quem tenta passar por esse muro é morto por choques elétricos ou então fuzilado.

Quando Luis Esnal, do jornal "La Nación", de Buenos Aires, perguntou-lhe o que achava do presidente argentino Néstor Kirchner, cometeu um equívoco:

- Kirchner nunca foi homem de esquerda. Ele sempre se identificou como um conservador, e ainda assim acabou tendo perante o FMI uma posição mais de esquerda do que o presidente brasileiro, que se diz esquerdista - disse ela, ignorando o fato de Kirchner ser, de fato, de esquerda, tendo sido inclusive militante do grupo guerrilheiro Montoneros.

O repórter argentino comentou com o colega ao lado:

- Nessa aí ela viajou...