Título: Desequilíbrio no FMI
Autor: Gilberto Scofield Jr.
Fonte: O Globo, 19/09/2006, Economia, p. 27

Membros aprovam elevação de cota da China, mas peso maior na decisão ainda é de EUA e UE

Os ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais reunidos para o encontro anual do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (Bird) aprovaram ontem a resolução que aumenta as quotas de China, México, Coréia do Sul e Turquia no Fundo e inicia as discussões para a mudança futura no peso dos 184 países-membros no processo de votação - e decisão - do organismo. A resolução foi aprovada por 90,6% dos membros (o mínimo exigido era 85%).

- Foi bastante positiva a aprovação da resolução por mais de 90% dos membros - disse o ministro das Finanças da Alemanha, Peer Steinbrueck, à agência de notícias Reuters, ressaltando, porém, que o posterior arranjo sobre como a mudança será feita deverá ser bem mais difícil.

De fato. O resultado já era esperado, mas a falta de unanimidade - com muitos países, liderados por um grupo que incluiu Brasil, Argentina, Índia e Egito, recusando a mudança nos termos propostos - indica que a discussão sobre o formato final do modelo não será tranqüila.

Os países até concordam com a idéia geral da reforma, que pretende dar mais voz aos emergentes no FMI. Mas eles se opõem à fórmula de cálculo do peso, que propõe considerar o PIB dos países (29% de peso na formação da quota) e sua abertura ao exterior (50% de peso).

Os países dissidentes, no entanto, temem que, por este critério, o aumento das quotas dos emergentes seja feito em detrimento das posições atuais de outras nações em desenvolvimento, explicou o ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega:

- No caso brasileiro, as quotas vão cair de 1,42 para 1,4, o que significa que países emergentes com grande importância no cenário mundial vão perder espaço para outros, enquanto os ricos vão manter sua fatia. Ou seja, o FMI continuará sem legitimidade.

Emergentes querem que ricos abram mão de seus votos

Os países dissidentes querem que os ricos abram mão de seus votos no Fundo em favor das nações emergentes e pobres, o que dificilmente ocorrerá. E defendem que a nova fórmula considere o PIB medido pelo conceito de Paridade do Poder de Compra (PPC) e o nível de exposição a riscos externos. Quanto maior a defesa contra turbulências (como superávit fiscal, saldo na balança comercial e nível de reservas), maior a quota.

Apesar da derrota de ontem, os emergentes vão continuar pressionando por uma fórmula diferente durante o prazo para implementação e regulamentação do novo mecanismo, fixado entre 12 meses (2007) e 24 meses (2008).

Na prática, a votação no FMI só deixará de ser dominada por EUA e União Européia (UE) se cada um deles ficar com menos de 15% dos votos, já que uma decisão só é vetada se não obtiver 85% do total. Os EUA hoje têm hoje 17% e a UE, 23%.

COMO FUNCIONA HOJE

A quota dos 184 países-membros do FMI é determinada hoje por sua posição econômica em relação a outros membros, de acordo com dados que incluem PIB, balanço em conta corrente e nível de reservas. Quando um país entra para o Fundo, ele recebe uma quantidade de quotas parecida com as de países de tamanho semelhante.

O maior detentor de quotas no Fundo hoje são os Estados Unidos, com cerca de US$55,1 bilhões, e o menor é Palau, com US$4,6 milhões. Mas o sistema determina ainda outras obrigações e direitos com relação ao FMI:

SUBSCRIÇÃO OU ASSINATURA: A quantidade máxima de recursos com o qual o país-membro é obrigado a contribuir para o caixa do Fundo. Pelo menos 25% devem ser pagos em dólar, iene, libra, euro ou SDRs (unidade monetária do FMI) e o restante, em moeda do próprio país.

PODER DE VOTO: As quotas determinam o poder do país-membro no Fundo, pois dizem respeito ao peso do voto. Os EUA, por exemplo, têm 17,8% do total dos votos e Palau, 0,01%.

ACESSO A FINANCIAMENTO: As quotas limitam também o valor do empréstimo do FMI a um país. Hoje, um país pode, em tese, pedir até 100% do valor de sua quota por ano e 300% cumulativamente, mas este nível pode ser ampliado dependendo da situação econômica (numa crise, por exemplo).