Título: 'PETRÓLEO É DOS BOLIVIANOS', DIZ NOVO MINISTRO
Autor: Janaína Figueiredo
Fonte: O Globo, 19/09/2006, Economia, p. 29

Villegas defende resolução polêmica, que está congelada, e afirma que 'a Petrobras não vai nos torcer o braço'

BUENOS AIRES. O novo ministro dos Hidrocarbonetos da Bolívia, Carlos Villegas, disse ontem que a polêmica resolução anunciada e depois "congelada" semana passada pelo governo de Evo Morales - que transfere para o Estado boliviano o controle da comercialização de petróleo e seus derivados - será aplicada, pois "a Petrobras não vai nos torcer o braço".

Em seu primeiro dia de reuniões com representantes de companhias petrolíferas que operam na Bolívia, Villegas, que assumiu o cargo sexta-feira, fez questão de defender a resolução aprovada por seu antecessor, Andrés Soliz Rada, que renunciou após a nova crise aberta com o Brasil.

- Quero ratificar que, como insumo e como produto, o petróleo é e será dos bolivianos - garantiu Villegas. - Além disso, quero afirmar que a resolução promulgada por Andrés não foi anulada, a decisão da equipe dos hidrocarbonetos foi congelar a medida, fazer um parêntese, para gerar condições favoráveis na negociação com a Petrobras. Mas a Petrobras não vai nos torcer o braço.

Villegas: "Decreto será aplicado de forma inflexível"

A Petrobras não quis comentar as declarações do novo ministro. Semana passada, a Petrobras Bolívia afirmou que a resolução autorizada por Soliz Rada "inviabiliza totalmente os negócios de refino da companhia no país". A estatal brasileira tem duas refinarias na Bolívia.

Villegas não informou quando será a próxima reunião entre autoridades do governo boliviano e a Petrobras, mas insistiu em dizer que o prazo para chegar a um acordo - leia-se a assinatura de novos contratos entre a Bolívia e a Petrobras - vence no próximo dia 28 de outubro.

Caso não seja alcançado um entendimento, afirmou o ministro boliviano, seu governo aplicará o artigo 3º do decreto de nacionalização dos hidrocarbonetos (28.701). O documento estabelece que "as companhias que não tenham assinado (novos) contratos não poderão continuar operando no país".

- O decreto será aplicado de forma inflexível - enfatizou Villegas, que iniciou a nova rodada de reuniões com representantes da espanhola Repsol YPF.

Segundo confirmou o porta-voz da Presidência, Alex Contreras, fim de semana passado, as negociações com as companhias petrolíferas não serão comandadas exclusivamente por Villegas. A equipe que participará das discussões estará integrada também pelos ministros da Presidência, Juan Ramón Quintana, da Fazenda, Luis Arce, do Planejamento e Desenvolvimento, Luis Larrazábal, e da Defesa, Walker San Miguel.

Villegas conversou ontem com seu antecessor sobre o processo de nacionalização dos hidrocarbonetos, iniciado em maio passado. Em sua despedida do cargo, Soliz Rada aproveitou para criticar tanto o Brasil como o governo Morales. O ex-ministro questionou a "descomunal" reação que provocou no Brasil a resolução aprovada por sua equipe semana passada.

- Acharam que era um confisco (das refinarias) - lamentou Soliz Rada.

Ex-ministro critica empresas e presidente Morales

O ex-ministro apelou para uma metáfora na hora de explicar os fundamentos do processo de nacionalização boliviano. Ele comparou as refinarias da Petrobras a uma padaria e explicou que o petróleo que passa pelo processo de refino seria como a massa que se usa para fazer pão. O governo boliviano precisa da padaria para fazer o pão, disse Soliz Rada, "mas o pão é dos bolivianos". Ou seja, empresas como a Petrobras passariam a ser apenas prestadoras de serviço.

- É fácil governar a Bolívia dizendo sim às companhias petrolíferas e às oligarquias de países vizinhos - declarou o ex-ministro, numa clara referência ao presidente Morales. - O único problema é que engendram reações populares de tal magnitude que produzem comoção e revolução.