Título: FMI: FRACASSO NA OMC AMEAÇA CRESCIMENTO GLOBAL
Autor: Giberto Scofield Jr.
Fonte: O Globo, 20/09/2006, Economia, p. 31
Diretor-gerente do Fundo diz que ampliação de trocas comerciais é a 'melhor esperança' para a economia mundial
CINGAPURA. O diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Rodrigo de Rato, afirmou que o ciclo de crescimento mundial pode estar próximo de seu fim, caso as conversas sobre liberalização do comércio mundial da Rodada de Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC) - interrompidas por intransigência dos países ricos em abrir seus mercados agrícolas às nações pobres -, não consigam extinguir a onda protecionista que toma conta do planeta.
Praticamente todos os ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais que discursaram ontem na abertura da reunião de governadores do FMI e do Banco Mundial (Bird) se referiram ao impasse comercial como uma das maiores ameaças ao crescimento mundial e se dispuseram a pressionar seus colegas das pastas de Comércio, Indústria e Relações Exteriores a retomarem as conversas.
- A melhor esperança para a manutenção das altas taxas de crescimento é ampliar as trocas comerciais. Se isso não ocorrer, o cenário futuro é menos encorajador - disse Rato.
O FMI apontou três riscos para a economia global: o protecionismo no comércio mundial; a manutenção dos preços do petróleo em patamares elevados, alimentando a inflação; e desequilíbrios nas contas de muitos países.
Rato e o presidente do Bird, Paul Wolfowitz, elogiaram a decisão dos países de aprovar a sugestão de mudança no sistema de votos (e de poder) no FMI e apontaram o percentual acima de 90% como uma "aprovação espantosa".
O FMI não revelou como cada país votou, mas a agência de notícias Reuters, citando uma fonte do Fundo, afirmou que 23 países foram contra a proposta de mudança: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Comoros, República Dominicana, Equador, Egito, Haiti, Índia, Irã, Maldivas, Omã, Panamá, Paraguai, Peru, Qatar, Sri Lanka, Trinidad e Tobago, Uruguai, Venezuela e Iêmen.
Apesar de ter pregado incansavelmente o uso de informações sobre o nível de corrupção nos países como mais um parâmetro para concessão de empréstimos do Bird, Wolfowitz tratou com discrição o tema em seu discurso e preferiu jogar luz sobre os esforços do banco na luta contra a pobreza:
- O banco destinou US$9,5 bilhões (a fundo perdido) para programas de ajuda a países pobres, metade na África. Os empréstimos para países de renda média (a maioria dos emergentes) chegaram ao nível mais alto dos últimos setes anos: US$14,2 bilhões.
Apesar de não terem se rebelado abertamente com relação ao processo de decisão do FMI e de ainda terem sido beneficiados na última rodada de revisão de quotas com uma participação maior para a China e a Coréia do Sul, os países do Leste e Sudeste da Ásia - a região que mais cresce no mundo hoje, com um PIB de US$4 trilhões, segundo estudo do Bird - vão roubar do FMI seu poder de influência na região ao criarem um mecanismo local de ajuda financeira em casos de crises.
Além disso, a reunião anual do FMI e do Bird acabou sendo o palco para o amadurecimento da chamada Unidade Monetária Asiática (UMA), proposta pelo Banco de Desenvolvimento Asiático, e que funcionaria como uma moeda escritural dos países da região, com o objetivo de simplificar as transações financeiras e comerciais. Nada menos que 54% das trocas comerciais dos países asiáticos são feitos dentro da própria região, segundo o Bird.
Para analista, fundo local 'lança sombra' sobre FMI
Além de terem feito reformas que os permitiram sair da situação de crise após o colapso das moedas da região, em 1997, os países do Leste e do Sudeste da Ásia caminham para se tornar uma região de renda média até 2010, quando Vietnã e, possivelmente, Camboja finalmente devem sair da categoria de países de baixa renda.
Para os países do Sudeste da Ásia, a experiência com as receitas do FMI durante a crise na região foi amarga, o que em parte explica o volume atual de reservas internacionais deste países, na casa de US$1,7 trilhão, o triplo da época da crise. "A iniciativa dos asiáticos (de criar um fundo de socorro financeiro próprio) já começa a lançar uma sombra sobre o FMI e pode ser tarde para o Fundo interromper esta trajetória", disse Fred Bergsten, diretor do Instituto de Economia Internacional de Washington, à agência Bloomberg.
LULA: FRACASSO DE DOHA PODE GERAR TERROR, na página 36