Título: VATICANO LANÇA MENSAGENS DE RECONCILIAÇÃO
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Fonte: O Globo, 20/09/2006, O Mundo, p. 37

Santa Sé condena violência e pede respeito entre povos. Texto do discurso do Papa poderá ser modificado no site oficial

CIDADE DO VATICANO. As crescentes pressões por um claro pedido de desculpas de Bento XVI sobre declarações em que relacionava Islã e violência levaram a Santa Sé a emitir ontem novas mensagens de reconciliação. Num telegrama de condolências às companheiras da freira Leonella Sgorbati, morta domingo na Somália, o Vaticano condenou "todo tipo de violência" e pediu "a fraternidade entre os povos". Além disso, vários religiosos e políticos tentaram acalmar os ânimos, enquanto o jornal católico "L'Osservatore Romano" publicava o discurso em árabe, na primeira página, para esclarecer seu significado.

"Sua Santidade espera que o sangue derramado pela fiel discípula do Evangelho se converta em semente para construir a autêntica fraternidade entre os povos, em respeito recíproco entre as convicções de cada um", dizia o telegrama do secretário de Estado do Vaticano, Tarcisio Bertone, sobre a morte da freira.

Em Roma, o presidente do Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso, cardeal Paul Poupard, reuniu-se ontem com líderes de outras religiões, num convite ao diálogo:

- A via alternativa ao terrorismo e à violência é o diálogo. E ela passa pelo reconhecimento das diferenças - disse Poupard.

O imã Sami Salem concordou e disse que a comunidade islâmica na Itália dava a crise por encerrada, mas lembrou que apesar de líderes religiosos se orgulharem de suas crenças, "deviam respeitar as demais".

Bento XVI revoltou muçulmanos na semana passada durante sua visita à Alemanha. Num discurso, citou o imperador bizantino Manuel II Paleólogo, que disse que o profeta Maomé trouxera apenas o mal. No domingo, o Papa lamentou a reação às suas palavras - mas não chegou a pedir desculpas.

Segundo o site do Vaticano, a versão oficial do discurso é "provisória" e pode ser "enriquecida". Para a imprensa italiana, isso significa que o texto será corrigido, num caso sem precedentes. "O Santo Padre se reserva o direito de acrescentar a este texto uma redação enriquecida com notas", diz a nota.

Na Itália, religiosos defenderam o Papa e disseram que suas palavras foram usadas fora de contexto. Mesmo políticos de outros países defenderam Bento XVI. A secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, elogiou seu "amor pela Humanidade".

- Precisamos entender que às vezes podemos ofender os outros sem querer - disse Condoleezza à rede ABC.

A segurança foi reforçada não só em torno do Papa, como em locais de culto do Aeroporto Fiumicino, em Roma, em meio a novas ameaças. O grupo Jund al-Sham (Combatentes do Levante), fundado pelo então líder da al-Qaeda no Iraque, Abu Musab al-Zarqawi, pediu a aplicação da sharia (lei islâmica) contra quem insultar o islamismo. "Os cães do Ocidente conduzem uma campanha contra o profeta. O último é o cão de Roma", diz a nota. Além disso, o desconhecido Exército da Orientação palestino prometeu atacar alvos cristãos na Faixa de Gaza.

Na Turquia, funcionários do Diretório Geral para Assuntos Religiosos pediram a prisão do Papa, que tem viagem ao país marcada para novembro. E o presidente do Paquistão, Pervez Musharraf, pediu à ONU que proíba "a difamação do Islã". Já o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, disse acreditar que as palavras de Bento XVI "foram distorcidas". Um dia antes, o aiatolá Ali Khamenei, líder espiritual do país, classificara o discurso como o "último elo" da cruzada americano-sionista.