Título: CPI deve apurar repasse de Valério para Freud
Autor: Bernardo de la Peña
Fonte: O Globo, 21/09/2006, O País, p. 12

Empresa em nome da mulher de ex-assessor de Lula recebeu R$98.500 da SMP&B em janeiro de 2003

BRASÍLIA. A CPI dos Sanguessugas vai requisitar à concluída CPI dos Correios documentos mostrando o repasse de dinheiro da empresa SMP&B, de Marcos Valério, para a empresa Caso Comércio e Serviços Ltda., empresa em nome da mulher do ex-assessor de Lula Freud Godoy, suspeito no escândalo do dossiê contra os tucanos. A Caso recebeu R$98.500 da SMP&B no dia 20 de janeiro de 2003. O presidente da CPI, Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ), disse que vai analisar o caso.

Freud é o homem de confiança de Lula citado pelos petistas presos pela PF e acusados na operação de compra do dossiê da família Vedoin contra tucanos paulistas. Freud foi nomeado assessor especial do presidente em março de 2003, mas trabalha com Lula há mais de dez anos. O pagamento à Caso aparece na contabilidade apresentada à CPI dos Correios por Valério, acusado de ser o operador do mensalão, com repasses a parlamentares da base aliada. A informação sobre o repasse da SMP&B à Caso foi revelada pelo "Estado de S.Paulo". Os pagamentos para a Caso foram registrados como referentes a "ass. geral. reestruturação adm" na contabilidade da SMP&B.

Acordo para investigar apenas compra do dossiê

Depois de afirmar que não tinha tomado conhecimento do conteúdo do documento da SMP&B arquivado na CPI dos Correios, Biscaia disse que, por enquanto, existe acordo na comissão para investigar apenas o que tiver relação com a tentativa de compra do dossiê contra os tucanos José Serra e Geraldo Alckmin.

Ontem, líderes da oposição no Congresso e outros integrantes da CPI dos Sanguessugas cobraram da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça uma investigação sobre o repasse de dinheiro à Caso.

- Se houver documento na CPI dos Correios que tenha relação com o assunto, ele será requisitado - disse Biscaia.

Segunda-feira, quando Freud pediu demissão da Secretaria Particular do gabinete de Lula, assessores do Planalto disseram que ele era responsável por assuntos referentes à família do presidente e que, por isso, tinha sala no Palácio do Planalto.

- Freud é o homem que toma conta das contas de Lula. O valerioduto passava próximo dele. É mais um item no processo (do mensalão que tramita no STF). O Ministério Público tem obrigação de analisar. A empresa é da equipe palaciana - disse o líder da minoria na Câmara, José Carlos Aleluia (PFL-BA).

- Somos levados a conclusões por causa da proximidade dele com o presidente. As informações devem ser checadas, mas cabe à PF investigar. O esquema de corrupção sobreviveu às CPIs e está sendo usado num momento eleitoral. E envolvendo pessoas próximas de Lula - disse o líder da minoria no Senado, Álvaro Dias (PSDB-PR).

Para o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), o pagamento mostra que as mesmas pessoas continuam atuando:

- É a mesma organização. A que organizou o mensalão e que organizou a compra do dossiê na sexta-feira. Por isso tiveram os pagamentos. Eles mantiveram a mesma estrutura. Os que não foram pegos continuaram operando - afirmou Maia.

O pefelista põe em dúvida o destino do dinheiro pago por Valério à Caso:

- Abre-se novo questionamento sobre como foram custeadas as despesas pessoais do presidente da República. Com a documentação da CPI, isso terá de ser investigado.

Mais de 60 horas de depoimentos

Ontem, Valério informou em nota que não falaria sobre o assunto. Pessoas próximas ao empresário disseram, entretanto, que as informações na contabilidade entregues por ele eram verdadeiras. E destaca que já prestou, em mais de 60 horas de depoimentos, "todos os esclarecimentos solicitados pelas autoridades federais". Ele ressalta também que entregou, em todas as instâncias, milhares de documentos demonstrando a regularidade fiscal e tributária das empresas das quais foi sócio.

Para o vice-presidente da CPI dos Sanguessugas, Raul Jungmann (PPS-PE), o assunto não deve ser investigado pela comissão, mas pela Justiça:

- É um caso claro de promiscuidade e que merece investigação, mas não tem relação com a CPI. É algo para ser investigado pelo Ministério Público e pela Justiça. É um dado a mais da promiscuidade e ausência de limites entre público e privado.

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), integrante da CPI, defendeu a investigação:

- Tem que ver o que é. Ele (Freud) trabalha com o Lula há muito tempo. Tem que ver qual foi a prestação de serviço.