Título: AS ENTRANHAS E OS ESTÔMAGOS
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 22/09/2006, O País, p. 2

As baixas na campanha do presidente Lula limparam o ar, mas não haverá refresco até o dia da eleição. Lula sustentou sua posição na pesquisa e trackings, mas isso só estimula a oposição a manter o fogo alto, exigindo a revelação da origem do dinheiro com o qual o grupo de franco-atiradores petistas pagaria o dossiê antitucano. Ontem, a PF achou uma quarta conta bancária e indícios de entrada ilegal de dólares no país.

Todos os presidenciáveis da oposição exploraram o assunto de forma contundente em seus programas eleitorais de ontem. O tucano Geraldo Alckmin, finalmente, exibiu a agressividade que seus aliados sempre cobraram. Em entrevista à CBN, disse que "o governo federal tem atuado como uma sofisticada organização criminosa".

- Ladrão de carro, quando é preso em flagrante, também diz: eu não precisava disso... Mas roubou.

Pelas duas declarações, a campanha de Lula pensava ontem em entrar com ação de crime eleitoral contra ele junto ao TSE.

- Alckmin está perdendo a serenidade e o autocontrole, tão próprios dos admiradores da Opus Dei - disse o ministro Tarso Genro.

Neste ritmo, o fogo ainda vai longe.

Apesar de a pesquisa Ibope-TV Globo ter mostrado Lula com 49%, contra 30% de Alckmin e 42% do conjunto de concorrentes (vantagem de sete pontos percentuais, portanto), o ambiente na campanha de Lula também é de tensa expectativa. Os que têm culpa evidente foram jogados ao mar. Já Ricardo Berzoini, disse Lula ao "Bom dia, Brasil", da TV Globo, foi afastado porque, tendo de dar explicações o tempo todo, não teria mais condições de coordenar sua campanha. Disse ainda estar exigindo que a PF mostre as entranhas do caso. Não há mesmo outra saída, mas as entranhas podem revolver estômagos eleitorais. À medida que elas forem aparecendo, ele pode continuar sangrando, o que em algum momento pode virar hemorragia de votos, pondo a perder a vitória em primeiro turno.

A exposição das entranhas exigirá a apresentação da origem do dinheiro. Se isso não acontecer antes da eleição, a oposição gritará que a Polícia Federal está sendo impedida de fazê-lo para proteger Lula. Que o dinheiro deve ser sujo ou público, como dizia José Serra ontem. A Polícia Federal, diz o ministro Márcio Thomaz Bastos, está trabalhando com a celeridade possível. Ontem encontrou indícios de que a parcela em dólares pode ter entrado ilegalmente no país, e encontrou em São Paulo mais uma conta bancária em que foram feitos saques, além das três do Rio. Se o dinheiro foi reunido a partir de contribuições diversas, isso pode implicar mais de uma pessoa.

Serão dez dias de trovoada e de incerteza sobre como os eleitores vão digerir o caso. A velocidade com que isso acontece também é imprevisível. Pode ser aos poucos, pode ser nas horas finais. Mudarão de lado os que até agora separaram Lula dos transgressores de seu partido e valorizam os resultados de seu governo? Essa é a questão.