Título: A CIA E O FIM DE PRISÕES SECRETAS
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Fonte: O Globo, 22/09/2006, O Mundo, p. 36

Agentes teriam se recusado a continuar com interrogatórios

WASHINGTON. Quando o presidente dos EUA anunciou no início do mês a suspensão do programa de detenções secretas da CIA (Agência Central de Inteligência), alguns analistas disseram que George W. Bush buscava votos para os republicanos nas eleições de novembro. Mas, segundo o jornal inglês "Financial Times", foram interrogadores da CIA que obrigaram o presidente a fechar os cárceres secretos e enviar os presos para a base de Guantánamo, em Cuba, por medo de que as técnicas fossem consideradas ilegais e que eles fossem processados.

Fontes ouvidas pelo jornal contaram que os agentes se recusaram a continuar com os interrogatórios até que a situação fosse esclarecida. Havia muitas críticas ao programa, acusado de maus-tratos aos detidos. Mas a CIA negou a reportagem.

- A noção de que agentes se recusaram a interrogar prisioneiros, e que isso levou às transferências, está completamente errada - disse o porta-voz da agência, Mark Mansfield.

O governo explicou na ocasião que a decisão de fechar as prisões no exterior e de enviar 14 detidos a Guantánamo se devia ao clima de incerteza que rondava os métodos de interrogatório após a Suprema Corte determinar que todos os detidos deveriam ser protegidos pela Convenção de Genebra. Mas John Bellinger, assessor jurídico do Departamento de Estado, disse ao jornal que os interrogatórios começaram a seguir num ritmo mais lento em dezembro, após o Congresso aprovar a lei proibindo tortura e tratamento desumano aos prisioneiros.

O artigo foi publicado no momento em que a Casa Branca vive uma intensa negociação com o Congresso para assegurar a aprovação de uma lei que permita a continuação dos interrogatórios e julgamento de suspeitos, em meio à rebelião de alguns senadores republicanos, que não queriam a aprovação do projeto como estava.

Governo e republicanos rebeldes chegam a acordo

Ontem, o governo anunciou um acordo com os senadores rebeldes, e Bush pediu ao Congresso que aprove a lei antes das eleições.

- Este acordo preserva a mais potente ferramenta que temos na proteção dos EUA e para frustrar ataques terroristas - disse o presidente.

Não foram revelados detalhes, mas John McCain, um dos senadores rebeldes, disse que "a integridade e o espírito da Convenção de Genebra foram preservados". Já o senador Bill Frist, líder da maioria, comentou que o acordo preservava dois pontos, considerados cruciais pelo governo: "informações confidenciais não serão compartilhadas com os terroristas" durante os julgamentos e "o programa de interrogatórios continuará".

O acordo será apresentado aos senadores e à Câmara de Representantes, e ainda não está claro como os democratas reagirão.

Mais cedo, cinco investigadores do Conselho de Direitos Humanos da ONU haviam acusado tanto o projeto inicial de Bush quanto as prisões secretas no exterior de violarem as Convenções de Genebra.

"Pedimos ao governo o fechamento da prisão de Guantánamo e, até esse momento chegar, a restrição de qualquer prática que leve a tortura, tratamento cruel, desumano ou degradante", dizia o comunicado lido pela argelina Leila Zerrougui, presidente do grupo de trabalho da ONU. Outro relator, o argentino Leandro Despouy, comparou os métodos empregados pelos EUA aos usados pelas ditaduras militares na América Latina.

Ao coro de críticas se juntou o ex-presidente Bill Clinton, para quem a proposta de Bush daria uma ampla aprovaçào à tortura:

- Se aprovarmos leis que legitimem a violação da Convenções de Genebra e institucionalizem o que aconteceu em Abu Ghraib, vamos ter problemas.