Título: Frutos amargos
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/09/2006, O GLOBO, p. 2

Dos efeitos eleitorais da tramóia do dossiê antitucano saberemos com certeza só no domingo próximo. Nem os analistas nem os institutos de pesquisa arriscam previsões sobre a relação tempo-propagação-dano de um episódio como este, grave porém turvado pelas fumaças de campanha. Mas ainda que ele risque apenas a superfície eleitoral, não afetando a reeleição de Lula, são óbvios seus efeitos políticos sobre um eventual segundo mandato.

Hoje, pelo menos, ele parece prometido mais à instabilidade e à radicalização do que ao entendimento e à distensão em que antes pensava Lula. Como poderá ele chamar todos os partidos a um entendimento sobre as questões essenciais, um propósito já anunciado, depois da tentativa de melar a vitória tucana em São Paulo e barrar a marcha de José Serra para 2010? Dando certo, e havendo dossiê, era este o objetivo.

Como irá o ministro Tarso Genro dar curso à sua proposta de concertação, começando pelas reformas tributária e política, com o PFL e o PSDB defendendo a impugnação ¿a posteriori¿ da candidatura de Lula ou pregando seu impeachment? Na crise do valerioduto, antes do recuo da oposição, Lula havia dito aos seus: ¿Vamos enfrentá-los na rua¿. O roteiro da distensão de Tarso ficará na gaveta, à espera de melhores condições políticas.

Ainda se acredita, no governo, que com Lula reeleito, Aécio Neves e José Serra, que serão os grandes cardeais tucanos, vão preferir a trégua a guerrear com o poder central, dedicando-se a produzir bons governos de olhos postos em 2010. A área política do governo ainda acha que pode refazer as pontes. Mesmo assim, o bunker da oposição continuará forte no Senado, sob o comando de ACM, Jereissati, Arthur Virgílio e companhia.

As investigações sobre o dossiê já começaram a produzir filhotes, como a relação de alguns dos envolvidos com ONGs que receberam recursos federais. Para investigar o onguismo petista, suspeitando que ele esconda um dreno de recursos públicos para o partido, o senador Heráclito Fortes (PFL-PI) já está coletando assinaturas para instalar uma CPI. A farra das ONGs é velha, clama por uma faxina há tempos mas esta CPI já nascerá com roteiro pronto.

Um talento político extraordinário será exigido de Lula e dos seus para obter a transfiguração do PMDB em um verdadeiro partido e com ele formar uma coalizão disciplinada e ordeira para sustentar governo. Mas para isso, o partido cobrará um latifúndio do governo.

As possibilidades negativas são grandes mas com algum otimismo pode-se pensar que nenhum dos dois lados, ao contrário do que possa parecer, esteja querendo nos levar para a Venezuela, para o confronto destrutivo e permanente. Que os ganhadores resolvam todos governar nos primeiros três anos, marcando outro duelo para 2010.

Nesta semana eleitoral decisiva, Lula pode perder quase todo o tempo de seus programas eleitorais. A oposição deve ganhar algumas ações punitivas que já estão no TSE.