Título: O país está sempre em transição¿
Autor: Renata Malkes
Fonte: O Globo, 24/09/2006, O Mundo, p. 47

ISTAMBUL. O pesquisador Ali Carkoglu, do Departamento de Ciências Políticas da Universidade Sabanci, de Istambul, acredita que a Turquia depende mais de si mesma do que da aprovação dos países europeus para a entrada definitiva na União Européia. Há pelo menos dez anos dedicado ao estudo da política externa de seu país, Carkoglu é o co-autor do livro ¿Turquia e a União Européia¿, lançado em 2003 em parceria com o israelense Barry Rubin, chefe do Instituto de Pesquisas Turcas do Centro Interdisciplinar de Hertzelia.

Temerosa, a Europa tem vários argumentos contra a entrada da Turquia na UE. O que o país pode proporcionar aos europeus?

ALI CARKOGLU: Esta não é a pergunta mais importante no momento. As elites da UE já apertaram o botão para colocar-nos dentro, apesar da incerteza do público. As massas não terão muito o que dizer até a aprovação final pelo Executivo. A pergunta é o quanto os turcos vão se esforçar para manter as reformas e mudanças que permitirão o grande passo. Vejo o processo estagnado e o governo pouco disposto, o que não pode acontecer. A verdadeira pergunta é o que pode mudar esta realidade. Nenhum dos países-membros estava real e logisticamente pronto para a entrada, mas havia um desejo real que não estou seguro de termos.

O que dificulta as mudanças sócio-políticas na Turquia?

CARKOGLU: Ao contrário de países como a Suécia e a Noruega, onde mudanças ocorrem a cada meio século, a Turquia está sempre em transição. É como ter vários bebês e ter que cuidar de todos ao mesmo tempo. As dificuldades do presente tornam difícil uma visão de bem-estar no futuro. O que pode manter as taxas de crescimento do país a longo prazo? Não somos apenas um país islâmico e democrático, pois isto é o resultado final de diversos processos em andamento, como autonomia na agricultura, desenvolvimento da energia e sobretudo um sistema social e de educação que vem sendo melhorado constantemente.

Por que o senhor acredita que o primeiro-ministro Erdogan desacelerou o ritmo das reformas?

CARKOGLU: Porque seu histórico conservador às vezes faz com que perca a sensibilidade no dia-a-dia, atirando-o no velho poço da demagogia islâmica. Em vez de olhar para frente, olha para trás. Ele tende a ser vítima desta doença. É compreensível, afinal quem não lê a Bíblia na Casa Branca? Ou que premier israelense pode ficar indiferente a grupos religiosos? Não é fácil para governos da América Latina lidar com a Igreja ou para os EUA lidar com os evangélicos. Destacar o secularismo turco e deixar a religião totalmente fora das questões de Estado é uma questão vital para nosso futuro. (R.M.)