Título: GOVERNO CORTA R$ 1,6 BI NO ORÇAMENTO DESTE ANO
Autor: Regina Alvarez/Lino Rodrigues
Fonte: O Globo, 26/09/2006, Economia, p. 25

Aumento de salário mínimo, crescimento do déficit da Previdência e receita menor com impostos exigiram ajuste

BRASÍLIA e SÃO PAULO. A primeira conseqüência do aumento dos gastos correntes no ano eleitoral apareceu antes mesmo do pleito. O governo anunciou ontem uma redução de R$1,6 bilhão nas chamadas despesas discricionárias (não obrigatórias), que deve atingir principalmente os investimentos federais. O corte é necessário para garantir o cumprimento da meta de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas no país) para o superávit primário - economia para pagamento de juros - em uma conjuntura mais desfavorável para as contas públicas, com menos receita e mais gastos com funcionalismo.

O corte foi necessário porque há aumento de R$2,1 bilhões nos gastos obrigatórios este ano, crescimento de R$539,1 milhões no déficit da Previdência Social e redução de R$299,7 milhões na previsão da receita líquida para o ano, em relação às projeções feitas em julho.

Previsão de crescimento do PIB foi reduzida para 4%

As novas previsões e a indicação de necessidade de cortes nos gastos de custeio e investimentos estão no Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do quarto bimestre, encaminhado ao Congresso na última sexta-feira, seguindo determinação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A equipe econômica reviu a previsão de crescimento do PIB, de 4,5% para 4%, para adaptar o Orçamento às projeções do mercado e às informações já divulgadas pelo IBGE sobre o comportamento da economia até o segundo trimestre. E isso interferiu nas projeções para as receitas de impostos e contribuições.

Em São Paulo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, minimizou o anúncio do corte de R$1,6 bilhão. Segundo ele, foi um ajuste normal, mas necessário para compensar a queda nos índices de inflação.

- Com a revisão das projeções de inflação para o ano, a receita nominal será menor. Estamos reconhecendo também que a expansão do PIB em 4,5% não será possível, mas vamos perseguir os 4% - disse.

A boa notícia, de acordo com Mantega, é que o PIB do terceiro trimestre deve registrar crescimento de 1,2% a 1,4%, em relação ao trimestre anterior. Esse crescimento, diz Mantega, se dará por causa da melhoria da economia nesse último trimestre, com os aumentos da massa salarial, do emprego e do crédito e também da redução dos juros. Para 2007, ele acredita que a economia reúna condições para uma expansão do PIB acima dos 5%.

As previsões de Mantega são muito diferentes das estimativas do mercado. Pelo relatório Focus, divulgado ontem, foi reduzida de 3,11% para 3,09% a projeção para crescimento do PIB este ano.

Pelo relatório enviado ao Congresso, as maiores quedas de arrecadação são esperadas no Imposto de Renda, na Cide (tributo cobrado sobre os combustíveis) e no Imposto sobre Produtos Industrializados(IPI). A previsão menor para as receitas administradas (impostos e contribuições federais) chega a R$1,3 bilhão, mas, em parte, é compensada pelo aumento das receitas não administradas (como concessões e dividendos).

Na reavaliação de receitas e despesas, a previsão de esforço do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) para o superávit primário foi reduzida em R$1,395 bilhão, valor que será utilizado para cobrir parte do aumento das despesas obrigatórias. Isso foi possível graças à melhora nas contas de estados e municípios, cuja previsão de superávit subiu de 0,95% para 1% do PIB.

Sem estados e municípios, corte teria que ser maior

O esforço exigido das estatais é de 0,85% do PIB. Somados, os resultados chegam aos 4,25% fixados na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para todo o setor público. Sem esta melhoria nas contas dos estados e municípios, o corte de investimentos federais seria ainda maior.

Ao longo do ano, a equipe econômica foi reduzindo suas projeções para o superávit do governo central. Em dezembro de 2005, esse resultado fechou em 2,76% do PIB. Em fevereiro, o governo anunciou que faria economia equivalente a 2,55% do PIB para compensar os gastos maiores dos estados e municípios no ano eleitoral. Mas agora só pretende fazer 2,4% do PIB, o que abre espaço para gastos adicionais de R$7,5 bilhões em relação ao superávit de 2005.

- O resultado da avaliação do quarto bimestre mostra o que já era possível prever quando foram anunciados o aumento do salário mínimo e os reajustes para os funcionários públicos. A conseqüência desses aumentos é a redução dos investimentos. Esse é um modelo esgotado que precisa ser revisto - afirma o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas.

O governo não detalhou onde serão os cortes, mas fontes da área econômica confirmaram que os investimentos serão mais atingidos do que as despesas de custeio, onde há pouca margem para reduzir gastos. O Congresso aprovou investimentos de R$21 bilhões no Orçamento deste ano e o governo havia liberado até agora R$16 bilhões. Os cortes serão sobre esse montante.