Título: Ironias, ataques e tensão na noite do Projac
Autor: Leila Youssef e José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 28/09/2006, O País, p. 14

Candidatos de oposição trocam olhares de cumplicidade e se aliam contra Sergio Cabral, que fica nervoso no início

- O que é isso, Sérgio Cabral? Já quer me derrubar?

O tom de deboche do petista Vladimir Palmeira ao tropeçar num banco atrás do adversário peemedebista, Sérgio Cabral Filho, assim que entrou no estúdio da Rede Globo, em Jacarepaguá, parecia ser a melhor pista do que dominaria o debate, na noite de anteontem, entre os postulantes à cadeira da governadora Rosinha Garotinho no Palácio Guanabara. A pista acabou se confirmando com a avalanche de ataques ao líder nas pesquisas até agora. Mas, por trás das câmeras da TV, outras estratégias se revelaram.

A principal delas foi a sucessiva troca de olhares de cumplicidade, acenos de cabeça e troca de sorrisos entre Sergio Cabral e Marcelo Crivella (PRB), este atual adversário e suposto aliado de Denise Frossard (PPS) no caso de ter segundo turno e ser ela a adversária do peemedebista. A cumplicidade, ainda que circunstancial, surgia a cada resposta incompleta ou ataques sofridos por Frossard, a principal ameaça aos dois na votação de domingo.

Torcidas se unem por duas vezes

As torcidas - cerca de 20 assessores a que cada um tinha direito - também se uniram por duas vezes ao aplaudirem juntos o que consideravam os melhores ataques. Em contraste, lá no fundo do estúdio, as expressões pesadas, com mãos postas sobre o rosto, dos pefelistas Rodrigo Maia, Solange Amaral e Indio da Costa, a tropa de choque do prefeito Cesar Maia, principal guru político de Denise Frossard.

Faltava meia hora começar o embate quando o primeiro debatedor entrou no palco. Era Eduardo Paes (PSDB), sem gravata, acenando para a platéia. Em seguida, Sérgio Cabral pisou no cenário. Foi cortês com o tucano. O oposto de Frossard, que passou direto pelos adversários, ocupou a bancada e limitou-se a acenar para assessores.

Vladimir entrou em cena, fez a brincadeira com Cabral, que, por sua vez, não disfarçou a cara de poucos amigos. Crivella foi o último. Apertou a mão de todos e ficou estático na sua bancada. O clima era tenso até que Vladimir, em nova intervenção, comentou com os produtores:

- É a primeira vez na vida que tenho o rabo preso, hein? - disse, referindo-se ao fio que prendia o microfone à lapela dos candidatos e, na outra ponta, à base de sua banqueta.

Do alongamento de pernas de Cabral à ginástica facial de Crivella, valia tudo para descontrair o ambiente até o fim da novela das oito.

Iniciado o debate, o que mais procurava os olhares de aprovação de seus coordenadores e da platéia era Cabral, visivelmente nervoso nos dois primeiros blocos - de um total de cinco - quando foi mais atacado. Da irmã Cláudia ao prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis, o peemedebista foi o que mais levou convidados. A cada intervalo, recebia informes da pesquisa qualitativa que a campanha contratou para ter a avaliação, em tempo real, de seu desempenho nas respostas e nos contra-ataques. O mesmo fez Marcelo Crivella.

Fora do alcance das câmeras, quem estava dentro do estúdio testemunhou os risos de Eduardo Paes para sua arquiinimiga Frossard, a impaciência de Vladimir andando de um lado para outro e a expressão firme de Crivella. Nos últimos três blocos, Cabral foi o único que se deu ao luxo de se sentar, observando, mais relaxado, o desempenho dos adversários.

Deslizes passam despercebidos

Apesar das alfinetadas trocadas pelos candidatos a governador durante o debate de anteontem à noite, na Rede Globo, alguns deslizes cometidos pelos participantes passaram despercebidos de seus implacáveis adversários.

Denise Frossard cobrou de Marcelo Crivella um pronunciamento à época da rebelião no Presídio Bangu I, em 2002. Crivella disse que havia visitado a casa de custódia, levando advogados e dando assistência às famílias. Frossard não percebeu que Crivella se referia a uma outra rebelião, ocorrida em 2004, na Casa de Custódia de Benfica.

Ao responder a Vladimir Palmeira sobre transporte, Sérgio Cabral disse que há um projeto do estado com o governo coreano para modernização dos trens urbanos. O programa, de US$243 milhões, foi firmado entre o estado e o Banco Mundial. Coreanos são os trens.

Numa pergunta a Sérgio Cabral, Eduardo Paes disse que o Fundo de Combate à Pobreza acabaria este ano. A mordida será menor a partir de 2007, mas o fundo vai até 2010.