Título: PACTO MILITAR ENTRE CHÁVEZ E MORALES
Autor: Janaína Figueiredo
Fonte: O Globo, 29/09/2006, O Mundo, p. 37
Oposição boliviana denuncia acordo que permitiria ingerência da Venezuela em crises internas
A aliança selada entre os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e da Venezuela, Hugo Chávez, voltou a provocar ontem uma crise entre o governo boliviano e seus opositores. Desta vez, o conflito foi desencadeado pela assinatura em maio de um acordo de cooperação militar entre os países que, após ter sido rapidamente aprovado na Câmara, enfrentou uma dura resistência da oposição no Senado, que teme ingerência externa no país. Segundo denunciou o movimento Poder Democrático e Social (Podemos), liderado pelo ex-presidente Jorge Quiroga, o entendimento representa um perigo para a segurança nacional da Bolívia.
De acordo com o texto entregue aos senadores bolivianos, o ingresso de forças venezuelanas na Bolívia para "gestão de crises" e "controle de armamento e desarmamento" seria permitido, e os dois países atuariam juntos no "controle democrático das forças" e na "organização das Forças Armadas." Os 13 senadores do Podemos, a maior bancada do Senado, bloquearam a medida, exigindo esclarecimentos.
- Queremos uma explicação detalhada, faltam especificações. Um acordo como este não seria aprovado em nenhum lugar do mundo - disse o senador opositor Carlos Borth.
O Movimento ao Socialismo (MAS), fundado pelo presidente Morales, tem 12 senadores, número insuficiente para derrotar a oposição, que ontem bloqueou também um acordo de cooperação econômica entre os dois países.
- A bancada do Podemos está atuando de forma irracional porque não quer permitir as mudanças necessárias no país - assegurou o senador do MAS, Antonio Peredo.
A oposição também questiona a construção de um forte em Riberalta, a 90 quilômetros da fronteira com o Brasil, e do porto militar de Quijarro, no Rio Paraguai. O governo Chávez dará US$47 milhões para a construção das bases.
Governo paraguaio busca explicações sobre bases
No caso de Quijarro, o projeto também provocou preocupação no Paraguai, já que a base ficará a 200 quilômetros da fronteira com o Paraguai. O assunto foi discutido pelos presidentes Morales e Nicanor Duarte em reunião durante a Assembléia Geral da ONU, em Nova York. Na época, o presidente paraguaio admitiu ter decidido viajar para conversar com Morales sobre a base militar e "afastar os temores existentes."
Esta semana, o ministro da Defesa boliviano, Walker San Miguel, realizou uma visita à Assunção para explicar detalhes do projeto de Quijarro. Ontem, ele descartou enfaticamente a possibilidade de um conflito entre os países.
Segundo analistas ouvidos pelo GLOBO, o acordo de cooperação militar entre a Bolívia e a Venezuela representa um risco para o país.
- O entendimento é genérico, falta uma explicação mais detalhada do que representaria a aplicação do acordo - disse Carlos Cordero, da Universidade Maior de San Andrés. - Um país pequeno como a Bolívia não tem por que ceder tanto espaço a militares estrangeiros. O acordo deve estabelecer limites, do contrário não teremos como controlar os militares venezuelanos.
Para o analista Carlos Toranzo, "a presença da Venezuela na Bolívia é excessiva".
- O relacionamento entre Morales e Chávez está prejudicando a imagem de nosso país - declarou Toranzo. - As constantes interferências da Venezuela violam a soberania boliviana.