Título: É preciso desprofissionalizar o PT¿
Autor: Helena Celestino
Fonte: O Globo, 01/10/2006, O País, p. 14

Secretário nacional de Economia Solidária, o economista Paul Singer é um dos nomes mais respeitados no PT e no governo Lula. Singer admite que o partido pode perder espaço em um eventual segundo mandato e defende o início de um processo de refundação do partido logo depois das eleições.

O senhor faz parte do grupo que defendia a refundação do PT após o escândalo do mensalão. Isso continua em pauta no PT?

PAUL SINGER: Considero mais necessária do que nunca a refundação do PT, por causa das mudanças que sofreu nos últimos anos e que o desviaram de sua missão histórica. É preciso desprofissionalizar o partido, entregar a maior parte da direção a militantes não profissionais, que representem as classes trabalhadoras e os movimentos sociais que lutam pela transformação da sociedade. As finanças partidárias têm que ser administradas de forma transparente e submetidas a um processo de orçamento participativo. Acredito que isso acontecerá tão logo o processo eleitoral se encerrar.

O PT pode perder espaço em um eventual segundo governo Lula?

SINGER: Sim, mas vai depender do resultado das eleições, principalmente para Câmara e Senado. Os efeitos da cláusula da barreira poderão desencadear um processo de reestruturação. A hipótese de cenário turbulento não pode ser descartada, mas o novo quadro partidário terá influência decisiva sobre a divisão de espaço no futuro governo.

É correto dizer que, para o eleitorado, Lula se descolou do PT?

SINGER: Saberemos se o PT de fato encolheu ou não semana que vem. Seja como for, Lula tem recebido muito mais votos para presidente que o PT para o Congresso, todas as vezes em que concorreu. Se isso significa que Lula se descolou do PT, o fato já vem de 1989.

É possível a aproximação de PT e PSDB?

SINGER: Possível, desde que as transformações que PT e PSDB irão sofrer levem à cogitada aproximação. No momento parece impossível. Mas conheço gente num e noutro partido que já partilhou importantes lutas e poderia voltar a fazê-lo. Outros evoluíram em sentidos opostos e se encontram em posições muito distantes no espectro político. Tudo depende de quem vai prevalecer num e noutro partido.

O que precisa mudar na reforma política?

SINGER: Precisamos blindar o sistema eleitoral da influência avassaladora do dinheiro, que falseia o sistema democrático de representação. Para isso, o financiamento público das campanhas pode ser um primeiro passo. A reforma política não pode ser formulada apenas pelas elites políticas, porque a autenticidade da representação dependerá da participação contínua da cidadania não profissional. Ou por dentro dos partidos ou de movimentos políticos suprapartidários, empenhados no combate a todas as formas de corrupção política.

Existe o risco de que a reforma seja usada para privilegiar grupos políticos?

SINGER: É claro que sim. Se a reforma política for decidida apenas pelos grupos políticos, é isso que vai acontecer. Mas os avanços da participação popular nas decisões políticas no Brasil são inegáveis, desde 1988 pelo menos, e neste mandato de Lula eles se aceleraram muito. O que nos dá esperanças de que este risco pode ser evitado.