Título: Baile de Máscaras
Autor:
Fonte: O Globo, 01/10/2006, O País, p. 24

CARISMA 01/10/2006 Não é à toa que o último programa do PSDB na televisão ainda tenha se preocupado em apresentar Alckmin. Depois de 45 dias como Geraldo, o candidato precisa ensinar o eleitor a ligar o nome à pessoa.

Frankstein

Se o slogan pedia só a força, por que Lula agora quer também as pernas, os braços, o coração, a cabeça e o sangue do povo? Como as pesquisas comprovam, o candidato passa bem. E o povo, amputado desta forma, resistirá até quando?

Sebastianismo

Se for verdade que um mito só acaba quando é substituído por outro, não deve ser por acaso que as atenções do poder começam a se concentrar em Aécio Neves. Com 83% dos votos válidos, o governador de Minas é forte figura para tomar o lugar de Lula no imaginário popular. O marketing não vê a hora de criar o personagem convocado a concluir a obra cívica do avô, aquele que, eleito, só subiu a rampa depois de morto. Serra que se cuide.

Brasil Novo

Novo companheiro de Lula, Jader Barbalho brigará pela presidência do PMDB, que, segundo Newtão, terá seis ministérios no governo. Roberto Jefferson, para quem Lula assinava até cheque em branco, já reassumiu a direção do PTB.

Nova base

O Collor que parece na iminência de voltar a Brasília vem sem PC Farias, o irmão e a mãe, que morreram no pós-impeachment; sem Rosane, de quem se separou; e sem a força do empresário e amigo Luiz Estevão, cuja carreira política acabou no escândalo do TRT de SP. Mas vai encontrar no Senado o conterrâneo e ex- líder Renan Calheiros, que hoje está com Lula ¿ assim como elle.

Zumbi

Em seu livro, um dos cinco sobre o governo Lula que saíram durante a campanha, Genoino compara o PT a um ser humano que tem infância, adolescência, maturidade, envelhece um pouco e rejuvenesce. ¿É um processo contraditório, dialético¿, diz o ex-presidente do partido, sem explicar que ser humano especial é este que nunca morre.

Eu me amo

Único a citar Lenin na campanha do Rio, o dogmaticamente disciplinado Vladimir Palmeira aderiu sem medo à fase ¿modéstia às favas¿ do PT. Em seus últimos programas na TV, apresentou-se como o maior líder estudantil da história do país. Antes dele, nunca se vira outro igual.

Limpeza

A fábrica de chuveiros Lorenzetti avisa que não há vínculos de parentesco familiar, pessoal ou profissional entre o chefe dos arapongas petistas e os acionistas da empresa. ¿A Lorenzetti construiu uma imagem de ética, por meio da qualidade de seus produtos e pelo respeito aos consumidores¿.

Retardatários

E o primeiro colocado, quem diria, acabou junto com os últimos: Lula, Ruy da Costa Pimenta ( PCO) e Ana Maria Rangel (PTR), chegam ao dia da eleição sub judice no TSE.

Alô, aloprados

Se houver segundo turno, e ele se transformar no Fla-Flu da corrupção que se esperava para o primeiro, o PT terá de encontrar algo muito forte contra Alckmin. Enfrentá-lo só com acusações do passado ¿ mais ligadas ao PSDB e ao governo FH do que ao candidato ¿ não garante o futuro.

Faltava essa

Quer dizer que o PT agora também tenta censurar a publicação de fotos pela imprensa?

Baile de máscaras

Acampanha eleitoral que chega hoje ao fim, em seu primeiro turno, tem tudo para ser inscrita na História do país como aquela em que os políticos fizeram o máximo para não ficar parecidos com... políticos. Nunca antes a figura do homem público, em especial do que depende do voto para existir, esteve tão desmoralizada. Quando a propaganda na TV teve início, em 15 de agosto, quase 20% do Congresso corria o risco de perder o mandato, por envolvimento com a máfia dos sanguessugas. Esperava-se que boa parte deles, assim como os ligados um ano antes ao escândalo do mensalão, fosse proibida de disputar novamente. Hoje, 45 dias depois, com as fotos da montanha de dinheiro petista fazendo sombra às urnas, o quadro é ainda pior: além dos 91 sanguessugas e mensaleiros, dos quais 63 tentam a reeleição ou outros cargos eletivos, o Ministério Público denunciou mais 33 pessoas, entra elas um ex-ministro candidato a governador, acusadas de pertencer a outra máfia, a dos vampiros. Apesar de tantas crises de corrupção conjugadas, capazes de ameaçar as bases de qualquer democracia, o que menos se viu durante a campanha de 2006 foi a discussão verdadeira sobre como estancar a sangria dos cofres públicos e fazer a reforma do apodrecido sistema político.

O fato de a Justiça permitir a candidatura dos envolvidos nos escândalos teve dois efeitos imediatos: reforçou, entre os eleitores, a quase certeza de impunidade para os crimes de colarinho branco ¿ chamados na era do PT de ¿erros¿ ¿ e catapultou, entre os políticos, a crença de que as urnas não trazem somente vitória, mas sobretudo anistia: ampla, geral e irrestrita. Isso é particularmente visível entre os governistas. Favorito em primeiro ou segundo turnos, Lula não teria mais de prestar contas à sociedade sobre atos ilícitos flagrados em sua campanha, como o dossiê contra Serra, ainda sob investigação do Ministério Público e da Justiça Eleitoral. A fala de Tarso Genro não deixa dúvidas: ¿Se isso permanecer enquanto estivermos no jogo eleitoral é natural. Agora, se isso for levado a sério após a vitória do presidente, aí se torna o mais elementar golpismo de terceira categoria¿. Pelo raciocínio dos que estão no poder, na democracia tupiniquim só importam duas instâncias: o Executivo ¿ na figura de um super presidente ¿ e as urnas, que o ungem e o absolvem. Montesquieu, defensor do Congresso e do Judiciário como freio ao despotismo, seria o pai de todos os golpistas?

Lula agiu como se seu favoritismo fosse a prova de uma suposta e irreversível conscientização política dos mais pobres ¿ como se boa parte deste eleitorado já não tivesse votado duas vezes em FH e como se as ações de ambos os governos não se valessem do uso da máquina pública e da milionária publicidade. Por razões como esta, o candidato-presidente foi incapaz de dialogar com a opinião pública tradicional. Seu não comparecimento a debates foi a síntese desta estratégia. Na reta final, mirando em FH e na imprensa, reforçou um discurso estranhamente obscurantista para quem sempre contou com apoios na classe média. Nos palanques, dia sim, dia não, abusando da retórica simplista e infantilizada, vociferou contra os que estudam muito, pensam muito, falam muito, mas fazem pouco. Não exibiu na propaganda estudantes, mulheres, jovens e artistas. Quando o último grupo quis participar mais de perto, ao se reunir com o candidato na casa de Gilberto Gil, deu merda.

O resultado é que a sociedade brasileira e os problemas que tanto a afligem não tiveram vez nestas eleições. Ninguém quis também, é importante frisar, se aventurar para valer na discussão da segurança e da violência. Fragilizados pela natureza de sua profissão, os candidatos ao cargo máximo do país trocaram, com maior ou menor verossimilhança, as vestimentas e a liturgia do contaminado poder político pelo uniforme camuflado do marketing. Despido do vermelho e dos símbolos do PT, Lula exibiu-se com a barba branca dos profetas, como se, misticamente, fosse o único sobrevivente da catástrofe moral que se abatera sobre o país. Ao comparar-se a Cristo e Tiradentes, na última semana, levou ao extremo a imagem com que estreara na TV.

Com o governo de São Paulo refém das ações do crime organizado, Alckmin, evitando olhar também para o passado, por causa das acusações contra o PSDB e FH, virou Geraldo, um comportado e despolitizado tocador de obras. No debate da TV Globo, manteve o personagem, o mais comedido nas críticas e o menos ágil no raciocínio. Ex-governador do DF e ex-ministro da Educação, Cristovam contentou-se, a maior parte do tempo, com o simpático, porém inócuo, apelo da revolução da educação. Professor, economista, intelectual, representou de tudo um pouco ¿ menos o político tarimbado e inteligente que sempre foi, revelado tardiamente, para o grande público, a três dias da eleição. Brandindo ameaças socialistas inviáveis e impropérios sem fim contra ¿sua majestade barbuda¿, a senadora Heloísa Helena (PSOL) adocicou o radicalismo, mas seu discurso, muito acima do tom dos demais, não convenceu. Assim era a campanha, sem cenas de CPIs, e assim teria terminado se, a 15 dias do final, não tivesse estourado o escândalo do dossiê. Graças à munição oferecida pelo inimigo, a oposição, especialmente Alckmin, tentou fazer em duas semanas o que não quis em um mês. Conseguiu reduzir a vantagem de Lula, mas o segundo turno continua incerto.

O sentimento de que o país foi contaminado pela velha ¿lei de Gérson¿, de levar vantagem em tudo, longe de ser afastado na campanha, ganhou status oficial. Até quando iremos conviver com isso, o eleitor começa a decidir hoje nas urnas.

frases

"Hoje, Serra é o mais preparado para governar o Brasil"

fh, em declaração censurada no site do PSDB

"O partido não precisa desse tipo de auto-afirmação adolescente"

ricardo berzoini antes da queda, sobre Lula ter escondido o PT na TV

"O deputado Carlos Nader é uma das gratas revelações das gerações mais jovens de deputados"

aldo rebelo presidente da Câmara, elogiando na TV um acusado de envolvimento com sanguessugas

"Não estou preocupado com ética do PT ou com qualquer tipo de ética"

wagner tiso compositor, após encontro com Lula

"Política não existe sem mãos sujas. Não dá para fazer sem botar a mão na merda"

paulo betti ator, no mesmo encontro, defendendo Lula

"Não é um simples comício, é uma aula de pós-graduação de sociologia política"

lula em comício em que beijou a mão de Jader Barbalho

"................."

lula em entrevista ao GLOBO

"Vou votar no presidente Lula porque ele é um nordestino"

fernando collor ex-presidente

"Se a gente não cumprir, é porque houve fatores extraterrestres que não permitiram que cumpríssemos"

lula renovando promessas para um segundo mandato

¿Sou fofinha, cheirosinha, limpinha, para matar de inveja quem acha que não"

heloísa helena no GLOBO

"Não estou acostumado. E ainda botei sal em vez de açúcar¿

alckmin pouco à vontade com o cafezinho do Amarelinho

"Tem de bater. Tem de bater. Tem que pôr fogo no palheiro. Senão o pessoal não sente energia. O povo quer mais sangue, né?"

fh, com saudades de Lacerda

"Essas coisas acontecem. A democracia não é só coisa limpa"

lula em comício com Humberto Costa, seu ex-ministro da Saúde, indiciado por corrupção

"Por isso não voto em Lula. Detesto me sentir um imbecil"

caetano veloso

"Depois de mim, o Congresso nunca mais será o mesmo"

clodovil, costureiro candidato a deputado

"Se Newton Cardoso se alia com o lado bom do PT, imagine as alianças do lado mau. O problema será distinguir os detalhes quando eles se reunirem no mesmo banho de sol"

fernando gabeira deputado (PV-RJ)

"Sabe por que você olha para o Alckmin e não sente nada? Porque ele é anestesista"

piada

"Meu nome é Katielle. Meu número é 25024. 25 porque sou do PFL e 24 porque sou gay, mas não sou ladrão"

nedson lanzini, o katielle candidato a deputado em SC

"Mexer com bandido não dá certo"

lula sobre o escândalo do dossiê contra tucanos

"É o maior tiro no pé já dado por um partido ou por um governo"

aécio neves governador de MG, sobre o dossiê

¿Minha única frustração é que os ricos não estejam votando em mim. Porque eles ganharam dinheiro como ninguém no meu governo"

lula

"De repente, as pessoas acharam que eram espertas e que podiam descobrir a mina de Colombo" Lula, sobre os aloprados do seu comitê

"O meio sindical não usa luvas. Tucanos e banqueiros são mais educados porque são mais bem criados e tiveram mais instrução" Francisco de Oliveira, economista e cientista social

"O presidente Lula está parecendo um imã de traições"

Cristovam

¿Estamos cuspindo na rotativa em que comemos¿

paulo delgado, deputado (pt-mg), sobre as críticas de lula à imprensa