Título: MAU CHEIRO E SOFRIMENTO
Autor: Selma Schmidt
Fonte: O Globo, 01/10/2006, Rio, p. 36
Na emergência do Souza Aguiar, doente ocupa leito há quase 4 meses
Terça-feira, 26 de setembro, 10h30m, Hospital municipal Souza Aguiar: nas camas, macas e cadeiras da sala de emergência masculina, havia 32 pacientes, 25 deles entre 62 e 89 anos, muitos seminus e sujos. O mau cheiro era insuportável. A superlotação tornava difícil para médicos, enfermeiros, auxiliares e acompanhantes circularem entre os pacientes.
Morador do Morro Santo Amaro, no Catete, o aposentado Moacir Tito, de 67 anos, teve que passar a noite numa cadeira, por falta de maca. Ele procurou o Souza Aguiar, na segunda-feira, porque estava com problemas cardíacos e as pernas inchadas.
¿ O que posso fazer? Preciso ficar aqui me recuperando e não tinha cama para mim ¿ disse Moacir, que estava ao lado de dois outros idosos.
Piores eram as condições de Paulo Roberto Annnechini, de 63 anos. Vomitando sangue, ele chegara ao Souza Aguiar na véspera e fora instalado numa cadeira. Na terça-feira, levaram-no para fazer um exame. Na volta, a sua cadeira estava ocupada e Paulo não teve alternativa senão se sentar no chão.
Na sala vizinha, onde ficam as mulheres, as condições insalubres eram parecidas, embora a aglomeração fosse menor. Na emergência feminina, havia 25 mulheres, 15 entre 62 e 87 anos. Geralda Oliveira Souza usava apenas fralda. O prontuário informava que a paciente, de cerca de 70 anos, chegara ao hospital dia 8 de junho, com diabetes, erisipela e hipertensão. No dia 20 do mesmo mês, teve alta, mas ninguém apareceu para buscá-la e ela permaneceu na emergência.
¿ Como ficou no hospital, foi adquirindo outras doenças e o seu caso se complicou. Hoje, ela não interage com ninguém ¿ contou uma médica.
O prontuário, guardado embaixo do colchonete da maca, informa que Geralda mora na Lapa. Ela aluga um quarto num prédio da Rua Sílvio Romero, por R$240.
¿ O quarto está fechado. Ela mora sozinha. Tinha um filho, que vivia com ela numa hospedaria na Praça da Bandeira. Quando ele morreu, ela veio morar aqui ¿ disse Antônio Mendes, dono do imóvel.