Título: FEBRE AFTOSA VIRA ARMA DE PROTECIONISMO DA UE
Autor: Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 01/10/2006, Economia, p. 45

Governo e empresários dizem que Rússia e União Européia mantêm embargo para barrar venda de carne brasileira

BRASÍLIA. Após um ano de negociações e investimentos desde a descoberta da existência de febre aftosa em rebanhos de Mato Grosso do Sul e do Paraná, governo federal e setor privado garantem que mercados como a União Européia e a Rússia estão usando o episódio como barreira protecionista. Antigos clientes, que desde o fim do ano passado embargam as compras, usam a questão sanitária como desculpa para dificultar o ingresso do produto brasileiro e evitar a concorrência.

Segundo o ministro da Agricultura, Luiz Carlos Guedes Pinto, a UE faz exigências maiores do que as estabelecidas pela própria Organização Mundial de Saúde Animal (OIE na sigla em francês, mantida desde sua criação). Já a Rússia mantém um embargo amplo porque estaria preocupada em atender a seus produtores de suínos, que reclamam do baixo preço da carne brasileira.

¿ A própria OIE reconhece que o Brasil atende às exigências fitossanitárias. Mas há países, como os da União Européia, que vão muito além dos rigores ¿ disse o ministro.

No caso da Rússia, inicialmente o embargo foi em decorrência da febre aftosa, mas o país liberou posteriormente as importações de outros estados brasileiros e manteve a restrição a Mato Grosso, São Paulo e Paraná. No entanto, a Rússia se recusa a comprar carne suína de Santa Catarina, estado livre da doença, que, além de tudo, não atinge porcos. O prejuízo pode ser significativo, uma vez que os russos absorviam dois terços das vendas de carne suína do Brasil para o exterior.

¿ O que tenho ouvido de algumas autoridades da Rússia é que a carne suína brasileira estava chegando ao mercado russo a preços muito baixos, e isso estava afetando a produção doméstica ¿ disse Guedes.

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carnes (Abiec), Marcus Vinícius Pratini de Moraes, está claro o uso abusivo de normas sanitárias. Pratini acredita que, com a paralisação das negociações da Rodada de Doha, na Organização Mundial do Comércio (OMC), não há perspectivas de mudança a curto prazo.

Apesar do embargo, as exportações brasileiras de carnes continuam batendo recordes. Em agosto, o total vendido no exterior foi de US$403 milhões, contra US$355 milhões de julho. O setor espera atingir, no ano, US$4 bilhões, o mais alto valor da história. Isso porque o Brasil está driblando o protecionismo e direcionando suas exportações a países emergentes, como Egito, Bulgária, Filipinas e Argélia.

¿ Isso compensa parcialmente o embargo, que nos custou, em 2005, cerca de US$400 milhões ¿ disse Pratini.

A contrário do que ocorreu em 2005, quando houve atrasos na liberação de verbas, o ministro da Agricultura garante que os recursos para combate a doenças este ano são suficientes. A área de defesa sanitária conta com, pelo menos, R$160 milhões. Ele lembrou, no entanto, que o governo federal repassa os recursos para os estados, que são responsáveis pela execução dos programas e nem sempre dão a devida importância à defesa sanitária. Este ano, oito estados não fizeram convênio com o ministério. Além disso, alguns produtores com terras nas fronteiras atravessam animais de países vizinhos.