Título: Apareceu o dinheiro
Autor: Tatiana Farah
Fonte: O Globo, 30/09/2006, O País, p. 3

Imagens do R$1,7 milhão apreendido com petistas provocam guerra entre governo e oposição

Duas semanas depois da apreensão de R$1,7 milhão em reais e dólares com petistas num hotel de São Paulo, apareceram as fotos das células, cuja divulgação fora proibida pelo comando da Polícia Federal e pelo Ministério da Justiça. O dinheiro seria usado por integrantes da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do também petista Aloizio Mercadante, que disputa o governo de São Paulo, para comprar um dossiê contra tucanos. O superintendente da PF em São Paulo, Geraldo José de Araújo, confirmou a autenticidade das fotos. As imagens foram feitas anteontem durante perícia e estão num CD.

A Polícia Federal abriu sindicância e um inquérito policial para apurar quem da própria PF distribuiu as imagens, já que o inquérito corre em segredo de Justiça. A suspeita recaiu sobre o delegado Edmilson Bruno, que acompanhou a perícia apesar de não fazer mais parte das investigações sobre o dossiê que o chefe da máfia dos sanguessugas, Luiz Antonio Vedoin, ia vender a petistas.

PT tentou censurar divulgação de fotos

O vazamento das imagens do dinheiro deixou ainda mais tensa a campanha eleitoral, a dois dias das eleições. O presidente do PT e ex-coordenador da campanha de Lula, Ricardo Berzoini, afastado justamente por envolvimento com o dossiegate, tentou impedir a imprensa de divulgar as fotos, recorrendo ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O pedido dele, porém, foi negado. Apesar de as fotos terem sido vazadas na própria PF, ministros e petistas tentaram culpar a oposição e a imprensa.

Bruno foi afastado das investigações assim que prendeu Gedimar Passos e Valdebran Padilha no dia 15, no hotel Íbis, em São Paulo. Gedimar e Valdebran negociavam o dossiê em nome do PT e de Vedoin e estavam com R$1,7 milhão. O delegado, que ontem foi dispensado do trabalho no meio da tarde, nega que tenha distribuído as imagens à imprensa. Ele afirmou que um CD com as fotos foi furtado de sua sala, na sede da Polícia Federal.

- Participei da perícia e essas fotos sumiram do meu arquivo. O ministro (Marcio Thomaz Bastos, da Justiça) nem sabia das fotos tiradas ontem (anteontem) durante a perícia no Banco Central - disse.

O delegado Bruno se tornou o principal suspeito depois de conversar com jornalistas enquanto era realizado o depoimento de Hamilton Lacerda, ex-coordenador da campanha de Mercadante ao governo de São Paulo. Hamilton Lacerda é um dos acusados de envolvimento na compra do dossiê.

No total, 23 fotos do dinheiro apreendido

São 23 fotos que mostram o dinheiro depositado na Caixa Econômica Federal (R$1,16 milhão) e no Banco Central (US$248.800). Elas foram tiradas anteontem, para a perícia policial. Essa providência levou duas semanas para ser tomada.

Em 2002, a divulgação da foto de R$1,3 milhão fez com que a senadora Roseana Sarney (PFL-MA) desistisse da candidatura à Presidência da República. O dinheiro foi encontrado na empresa Lunus, de Jorge Murad, marido de Roseana. À época, a foto do dinheiro na empresa Lunus, de Jorge Murad, marido de Roseana, foi feita por uma fotógrafa do "Jornal do Tocantins", não pela PF. O dinheiro acabou sendo liberado pela Justiça.

Na gestão de Márcio Thomaz Bastos no Ministério da Justiça, a prática sempre foi divulgar as fotos de dinheiro apreendido, falso ou verdadeiro, em operações da polícia. No dossiegate, porém, Thomaz Bastos havia dito que só divulgaria as imagens após as eleições. A PF vinha sendo criticada por ter tratado o caso ligado ao PT de forma diferente do que faz normalmente em apreensões, ou seja, com a divulgação quase imediata dos lotes apreendidos.

Nas imagens divulgadas há pilhas de notas de R$10, R$20, R$50 e R$100. São montes de dinheiro. Todas com o selo da CEF, já que o dinheiro, depois de apreendido, foi depositado lá, sob custódia. Os dólares foram depositados no Banco Central e possuem o selo do BC. Segundo a PF, outras fotos já haviam sido tiradas e foram encaminhadas pelo Banco Central ao Tesouro americano e ao FBI para rastrear a origem dos dólares.

Pelo número de série das notas, a PF apurou que parte dos US$248.800 foi impressa em abril e chegou ao país num lote de R$15 milhões recebido pelo banco Sofisa, em São Paulo. O banco afirma que a operação foi legal. O caminho percorrido pelos dólares até chegar às mãos de Gedimar e Valdebran, entretanto, ainda não foi rastreado. A PF faz uma série de buscas em casas de câmbio e de doleiros e ontem concentrava as investigações em cinco delas, cujos carimbos puderam ser visualizados nos maços das notas de dólar.