Título: GUERRA NO IRAQUE, GUERRILHA NA CASA BRANCA
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Fonte: O Globo, 30/09/2006, O Mundo, p. 45

Livro de Bob Woodward revela intrigas no Gabinete de Bush e campanha por renúncia de Rumsfeld

WASHINGTON. Uma Casa Branca dividida em relação ao Iraque e num clima de tamanha desavença que chegou a fazer o presidente, George W. Bush, pedir ao secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, que atendesse os telefonemas da então conselheira de Segurança Nacional, Condoleezza Rice. Essa é uma das muitas revelações do novo livro do jornalista do "Washington Post" Bob Woodward, com o título "State of denial" (Estado de negação), que será lançado semana que vem nos Estados Unidos. Trechos do livro foram publicados no "Post", que esperava divulgar um material exclusivo. Não contava, no entanto, com o vazamento de um exemplar para o jornal "The New York Times", que também publicou uma reportagem com trechos inéditos da obra.

Em 537 páginas, Woodward mostra a negligência da Casa Branca ao pedido das Forças Armadas por mais tropas no início da invasão do Iraque, revela profundas divergências que a guerra provocou no alto escalão do governo e a impotência do Gabinete em reagir às conseqüências do conflito. Um dos trechos, segundo o "Post", descreve as tentativas do ex-chefe do Estado-Maior, Andrew Card, de convencer Bush a demitir Donald Rumsfeld. O presidente, segundo o autor, decidiu não seguir a sugestão depois que o vice-presidente Dick Cheney e o assessor político Karl Rove persuadiram-no de que a medida seria vista como uma expressão de dúvida sobre a direção da guerra e o exporia a críticas. Em algumas tentativas de derrubar Rumsfeld, Card teve apoio da primeira-dama Laura Bush, mas o presidente sempre se mostrou contrário.

Bush também precisou, segundo Woodward, intervir na relação entre Rumsfeld e Condoleezza que, em novembro de 2003, estavam em pé de guerra, o que podia, segundo o livro, enfraquecer ainda mais o Gabinete. Num trecho divulgado pelo"New York Times", Woodward mostra o descontentamento de Bush ao conversar com Rumsfeld sobre as desavenças:

"Não quero nada dentro do Gabinete que me lembre insurgência. Não acredito que já chegamos a esse ponto."

Rumsfeld, descrito no livro como pouco interessando no planejamento do Iraque no pós-guerra, também desagradava ao então secretário de Estado, Colin Powell, que via no secretário de Defesa um obstáculo.

"Se eu vou embora, Don (Rumsfeld) também deveria ir" teria dito o secretário de Estado, segundo o livro, no final de 2004, quando deixou o governo.

O vice-presidente Dick Cheney também é retratado como um dos grandes defensores de uma política agressiva em relação o Iraque. Segundo Woodward, ele era tão obcecado por encontrar armas de destruição em massa no país que um dia convocou, de madrugada, o chefe da espionagem, David Kay, para lhe passar todas as coordenadas, a partir de imagens de satélites, dos possíveis esconderijos das armas.

A Casa Branca reagiu às informações do livro e disse ontem que muitas delas não são verdadeiras.

- Não é verdade que o número de ataques iraquianos foi subestimado e que ignoramos pedidos para o envio de mais tropas - disse o porta-voz Tony Snow.

A única informação atestada pelo porta-voz como verdadeira é a de que Bush é aconselhado por Henry Kissinger, o polêmico conselheiro de Segurança Nacional durante a Guerra do Vietnã, em relação ao Iraque.