Título: A UM PASSO DA ESCUTA OFICIAL
Autor:
Fonte: O Globo, 30/09/2006, O Mundo, p. 45

Câmara dos EUA aprova projeto que libera grampo sem autorização da Justiça

Poucas horas depois de o Senado dos EUA aprovar leis que limitam a defesa de estrangeiros acusados de terrorismo, a Câmara dos Representantes aprovou no fim da noite de quinta-feira o sistema de escuta telefônica e eletrônica de americanos sem autorização judicial. A medida ainda terá que passar pelo Senado para se tornar lei. As duas ações alimentam a polêmica sobre a pressão que a Casa Branca está exercendo sobre o Congresso e podem provocar novas batalhas judiciais.

O projeto de espionagem telefônica foi aprovado por 232 a 191. Ele concede ao presidente dos EUA o direito de solicitar o grampo de telefonemas e mensagens de e-mail de americanos sem necessidade de autorização judicial. Para isso, basta que ele considere que haja uma "ameaça iminente" de ataque e que informe às comissões de inteligência do Congresso a organização que estaria por trás da ameaça. A fiscalização ocorreria por até 90 dias, com possibilidade de renovação a pedido do presidente.

A resistência da maioria dos deputados do Partido Democrata, que considerada a medida uma severa limitação das liberdades individuais, foi criticada pelos republicanos.

- A oposição irracional dos democratas às fortes políticas de segurança nacional que ajudam a manter seguro o nosso país deveria ser uma grande preocupação do povo americano - afirmou o deputado republicano John Boehner.

Um destaque, redigido por alguns deputados democratas e republicanos, tentou diminuir o período de grampo sem supervisão da Justiça de 90 para sete dias, mas foi derrotado por 221 a 201.

A medida ainda deve ser aprovada pelo Senado, o que dificilmente será feito antes das eleições parlamentares de 7 de novembro.

A Câmara se apressou para aprovar o projeto de lei do grampo devido a uma ordem judicial. A juíza Anna Diggs Taylor exigiu que fosse feita uma lei sobre o assunto ou tornaria obrigatória o fim das escutas. Taylor deu uma semana para que o governo cumprisse a ordem.

Ano passado a juíza decidiu que o grampo é ilegal, mas o governo apelou, alegando que a interrupção do trabalho colocaria o país em risco. Taylor, então, concedeu um tempo para que fosse regulamentada uma lei, período que foi ignorado pelo governo.

A nova controvérsia se junta à aprovação, pelo Congresso, de tribunais militares de exceção para pessoas que sejam consideradas "combatentes inimigos", na tarde de quinta-feira. Congressistas disseram ontem que as duas medidas poderiam provocar uma batalha judicial, uma vez que muitos as consideram não condizentes com a Constituição dos EUA.

Ontem a Anistia Internacional afirmou que defenderá que as medidas sejam levadas aos tribunais por serem inconstitucionais. "O Congresso americano deu um selo de aprovação a violações dos direitos humanos cometidos pelos EUA na 'guerra ao terror'. A lei coloca os EUA no lado errado da lei internacional, e transformou políticas de governo ruins em leis internas ruins."

Senado aprova US$70 bilhões para guerras

Vários advogados concordam com a Anistia. O professor de lei constitucional da Universidade do Texas Sanford Levinson disse que a legislação é digna de uma "república de bananas."

- A imagem do Congresso correndo para retirar a jurisdição de tribunais como resposta a uma emergência politicamente criada é chocante. Não sei se os congressistas entenderam o que fizeram - disse Harold Koh, professor de Yale.

Ontem, o Senado americano aprovou por unanimidade mais US$70 bilhões (R$153 bilhões) para operações militares em Iraque e Afeganistão. Ao todo, os cem senadores dos EUA aprovaram um orçamento de US$448 bilhões (R$977 bilhões) para o Pentágono para 2007.

O projeto de lei, ponto a ponto

De acordo com o projeto de lei aprovado pela Câmara, o presidente dos EUA terá facilidade para solicitar o controle de telefonemas e trocas de mensagens eletrônicas de americanos com estrangeiros. Para colocar em ação este sistema de espionagem, o presidente americano deve:

1 - Notificar as comissões de Inteligência do Senado e da Câmara dos Representantes, assim como os líderes das bancadas da maioria e da minoria do Congresso americano.

2 - Acreditar que um ataque é iminente e explicar para as pessoas definidas no ponto anterior a razão do pedido de escuta, os nomes dos envolvidos e as organizações extremistas suspeitas.

3 - Deve renovar a solicitação de escuta telefônica e eletrônica do cidadão americano suspeito num prazo máximo de 90 dias.

www.oglobo.com.br/mundo