Título: O JOGO DUPLO DE CABRAL E GAROTINHO
Autor: Maia Menezes, Paula Autran e Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 06/10/2006, O País, p. 3

Antigo grupo do ex-governador, inclusive Picciani, marcha com senador para Lula

Reunião no Palácio da Alvorada, em Brasília, de manhã; ato com o candidato derrotado do PT a governador, Vladimir Palmeira, no Rio; almoço com prefeitos; evento com a presença do presidente Lula, candidato à reeleição, no Instituto Bennett, à noite. A série de eventos patrocinada pela candidatura de Sérgio Cabral (PMDB) ao governo do Rio para selar a aliança com Lula acabou revelando ontem a estratégia dele e do ex-governador Anthony Garotinho, que declarou apoio ao tucano Geraldo Alckmin mas está com o senador na sucessão estadual. Com Cabral, no apoio a Lula, marchou o grupo original de Garotinho, entre eles o presidente da Assembléia, Jorge Picciani (PMDB), e o líder do PMDB na Alerj, Paulo Melo. Cabral reuniu prefeitos numa churrascaria em apoio a Lula, enquanto Garotinho reunia prefeitos em outro lugar para pedir votos a Alckmin. Garotinho e Cabral, porém, estão juntos na disputa pela sucessão da governadora Rosinha.

Picciani participou do encontro com Cabral e o senador eleito pelo PP, Francisco Dornelles, à tarde, na sede do PT no Rio, com Vladimir. O presidente da Alerj, que já foi investigado pela Polícia Federal por suspeita de lavagem de dinheiro, confirmou que apoiará Lula e disse que segue religiosamente a orientação de Cabral. Na eleição de 2002, no segundo turno, ele já apoiara Lula quando o então candidato derrotado do PSB, Garotinho, aderiu ao petista. Sobre o fato de ter sido investigado, Picciani disse:

¿ Não tenho nada a temer. Sou homem público corajoso. Já respondi por esses fatos. Um procurador federal fez ofício a PF para me investigar sobre suposto crime de lavagem de dinheiro. Eu não respondo mais a nenhuma ação.

Lula diz que Alckmin quer demitir funcionários

À noite, num palanque inusitado, que uniu da vereadora funkeira Veronica Costa a deputados federais do PT, como Jorge Bittar e Luiz Sergio, e peemedebistas como o prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis, Lula criticou Alckmin, o prefeito Cesar Maia (PFL) e até a governadora Rosinha. Cerca de mil pessoas lotaram o auditório do Bennett, no Flamengo, para assistir à oficialização da união entre Cabral e Lula.

O presidente carregava uma canga com a bandeira do Brasil e acusou seu adversário de estar escondendo suas reais intenções, caso seja eleito presidente.

¿ Prestem atenção: quando meu adversário fala em cortar despesas e gastos correntes, ele está falando em demitir funcionários.

Lula criticou a administração Rosinha ao afirmar que o governo do estado impediu que o número de beneficiados pelo Bolsa Família fosse maior do que os atuais 420 mil:

¿ Poderíamos ter mais beneficiados se houvesse integração com o governo do estado.

Ele foi irônico ao se referir a Cesar Maia:

¿ O prefeito que parece estar apoiando o outro lado sempre diz que os presidentes do Brasil nos últimos 20 anos não fizeram o que fiz em favor do Rio.

¿A gente olha e tem uma liga¿, diz sobre Cabral

No discurso, o presidente comparou a relação com Cabral a uma paixão. Segundo ele, a escolha do peemedebista é como quando escolhemos alguém para se casar depois de namorar muito:

¿ A gente olha e tem uma liga.

De manhã, no Palácio da Alvorada, o presidente Lula recebeu Cabral, o candidato derrotado do PRB a governador, Marcelo Crivella, o senador eleito Francisco Dornelles, o candidato a vice na chapa do PMDB, Luiz Fernando Pezão, e o atual vice-governador, Luiz Paulo Conde.

Com o apoio de Cabral, Lula espera melhorar sua votação no estado.

¿ Não existe eleição fácil. Toda eleição tem suas complicações. Mas no Rio será mais tranqüila porque temos o melhor candidato a governador, a melhor aliança política e o apoio da maioria da população ¿ disse Lula.

Para não enfrentar problemas políticos com aliados, Lula recebeu na véspera a deputada Jandira Feghali (PCdoB), derrotada na disputa ao Senado. Depois do susto de a eleição não ter se decidido domingo, Lula iniciou o discurso dizendo que era a favor de eleições em dois turnos.

¿ Fui um dos batalhadores para que a gente tivesse dois turnos no Brasil. Eu achava e me espelhava muito no que aconteceu no Chile, com o Allende. Achava que alguém, ao ser eleito presidente com 33% dos votos, teria muito mais dificuldade de construir uma hegemonia para governar do que se fosse eleito no segundo teste, em que a população pudesse, por maioria, se manifestar ¿ disse.

O ato, acompanhado pelo vice-presidente José Alencar, pelos ministros das Cidades, Márcio Fortes, e das Relações Institucionais, Tarso Genro, pelo secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, pelo deputado eleito Ciro Gomes, pela ex-senadora Benedita da Silva e pelo coordenador da campanha à reeleição, Marco Aurélio Garcia, durou menos de uma hora e foi encerrado com um aperto de mão coletivo entre Lula, Cabral, Crivella, Dornelles e Conde.

O presidente afirmou que vai ser um aliado do Rio e disse que o governo federal está investindo R$385 milhões em segurança pública na capital para viabilizar a realização dos jogos Pan-Americanos em 2007.

Cabral disse que está otimista com o futuro do Rio e lembrou os projetos de investimentos feitos pelo governo federal no estado: o pólo petroquímico, a refinaria de Itaboraí, o pólo siderúrgico de Santa Cruz e a siderúrgica do Atlântico. Cabral também citou a parceria do governo estadual com o federal na segurança pública e disse que esse trabalho conjunto ainda será um modelo de integração entre as Forças Armadas, a Polícia Federal e a Secretaria de Segurança. Cabral pediu mais Bolsas Família para o estado:

¿ O Rio precisa de todas essas parcerias e de aumentar o Bolsa Família. É com satisfação que estou apoiando a reeleição do presidente Lula para o bem do Brasil e do Rio.

Petista não comenta ação de Garotinho

Na saída, Lula, Cabral e Alencar comentaram o apoio de Garotinho ao candidato do PSDB Geraldo Alckmin. O presidente disse que não faria comentário pois já tinha suas próprias alianças e apoios para administrar:

¿ Não julgo o apoio das outras candidaturas. Já tenho muito trabalho para conseguir os meus ¿ disse Lula.

Sobre esse assunto, Cabral disse que o PMDB liberou seus filiados nas eleições presidenciais e que ele se manteve neutro no primeiro turno, enquanto Garotinho apoiou a candidatura da senadora Heloísa Helena, do PSOL. E que, portanto, era natural que agora Garotinho estivesse com Alckmin e ele com Lula. Mas ele deixou claro que não se preocupa com eventuais prejuízos que o apoio de Garotinho possa trazer à sua candidatura.

¿ Como dizia o Brizola, o importante é quem está dirigindo o caminhão, quem comanda o processo ¿ afirmou Cabral.