Título: LULA REABRIU A LUTA INTERNA NO PT E ALCKMIN IMPLODIU A SUA BASE NO RIO
Autor: José Casado
Fonte: O Globo, 08/10/2006, O País, p. 4

Candidatos passam semana numa controvertida maratona por alianças

Depois da surpresa do resultado do primeiro turno, as primeiras horas foram atordoantes, descrevem assessores. As seguintes, acrimoniosas: relutante com os próprios erros, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva dedicou-se às falhas alheias, e reacendeu a luta interna no PT.

Passadas 72 horas, na quarta-feira, mostrou-se refeito, já empenhado numa curta maratona de caça a novos aliados. Começou pelo PMDB do Rio de Janeiro, estado onde mais de 2,1 milhões de eleitores não votaram nele nem no seu principal adversário.

De manhã, no Palácio da Alvorada, recebeu com abraços efusivos o candidato ao governo fluminense pelo PMDB, Sérgio Cabral. À noite, no Rio, posaram para fotos, entremeadas por promessas de fidelidade.

Cabral jantou com PSDB e PFL, antes de encontrar Lula

Se soube, Lula fingiu ignorância: na madrugada, em Brasília, o candidato do PMDB participara de um longo jantar com líderes nacionais do PSDB e do PFL. Foram três os pratos à mesa: Cesar Maia, prefeito do Rio, Denise Frossard, adversária de Cabral, e os candidatos presidenciais ¿ principalmente Lula.

Àquela altura, seu adversário Geraldo Alckmin considerava controlada a crise que ele mesmo provocara entre aliados no Rio, ao se aliar à família Garotinho. Todos sabiam do encontro na véspera. Porém, Cesar Maia reagiu duramente ao ¿beijo da morte¿, como definiu. Garotinho, aliado de Cabral, só quer manter seu espaço no Estado do Rio.

Para conter o prefeito, e preservar o abraço de Garotinho, Alckmin pediu ajuda da cúpula do PSDB e do PFL, mais os governadores eleitos de São Paulo, José Serra, e de Minas Gerais, Aécio Neves. Foram jornadas nas quais ficou exposta a eqüidistância entre Alckmin e seus companheiros.

O candidato é dono de uma personalidade complexa, habituado a iniciativas solitárias e ao trato formal e indistinto com todos os aliados, sempre incertos sobre o que ele pensa. A comunicação entre eles é rarefeita.

Mais complicado, porém, foi lidar com a impetuosidade da candidata Frossard, que rompera e anunciara ¿voto nulo¿. Ela só mudou o tom das críticas depois de uma conversa com o presidente do seu PPS, Roberto Freire. Ele argumentou com Frossard sobre a incompatibilidade entre o anunciado voto nulo e o programa partidário. Advertiu sobre conseqüências prováveis, uma delas o eventual recurso do próprio PPS à Justiça Eleitoral contra a candidata.

Enquanto isso, nos comitês de Lula em São Paulo e em Brasília, tentava-se uma missão impossível ¿ o exercício da autocrítica no PT. As análises estancaram em um ponto: o maior erro fora cometido pelo próprio Lula, ao não ir a debates.

Com base em pesquisas internas, o partido e o governo constataram que a chance de vitória se esvaiu na medida em que prosperou a imagem do presidente-candidato fugindo ao confronto, numa circunstância de dúvidas sobre a compra de dossiê contra candidatos do PSDB. Desde então, Lula passou a repetir, diariamente, a disposição de comparecer a todos os debates.

Lula e a dificuldade de lidar com erros

Com notórias dificuldades para lidar com erros, sejam próprios ou alheios, Lula estimulou o PT a uma outra discussão, sobre a responsabilidade na derrota dos envolvidos no caso do dossiê. Assim, reacendeu a luta interna no partido ¿ entre alas sob influência do ex-deputado cassado José Dirceu, da ex-prefeita Marta Suplicy, do candidato derrotado ao governo paulista Aloizio Mercadante e da esquerda petista. Por 15 dias, Lula deixou agonizante Ricardo Berzoini, presidente do partido, ex-ministro e deputado reeleito. Na sexta-feira, ele se retirou da presidência do PT, em licença por tempo indeterminado.

Foi uma semana em que Lula, Alckmin, Maia, Frossard, Dirceu, Marta, Mercadante e Berzoini confundiram aparências com realidade, não necessariamente nessa ordem. Fizeram políticos experientes lembrar de uma regra não-escrita do jogo do poder, que Tancredo Neves, avô de Aécio, assim resumia em conversas na mesa do café da manhã: ¿Política ilude mais que o amor¿.