Título: DIFERENÇAS SOCIAIS REVELAM RETRATO DAS URNAS
Autor: Elenilce Bottari, Fellipe Awi e Rogerio Daflon
Fonte: O Globo, 08/10/2006, O País, p. 16

Dados do TRE mostram dobradinha de Alckmin e Frossard nas regiões mais ricas e de Lula e Cabral nas mais pobres

Os resultados das eleições são um retrato social da cidade do Rio. Dados do Tribunal Regional Eleitoral mostram que a candidata ao governo do estado pelo PPS, Denise Frossard, só chegou ao segundo turno devido à votação expressiva na Zona Sul e nos quatro bairros de classe média da Zona Norte, a chamada Grande Tijuca (Vila Isabel, Grajaú, Maracanã e Tijuca), batendo o candidato do PMDB, Sérgio Cabral. Nessas regiões, Frossard fez dobradinha vitoriosa com Geraldo Alckmin, candidato à Presidência pelo PSDB. Na Zona Oeste, onde o petista Luiz Inácio Lula da Silva e Cabral lideraram com folga, a dobradinha ressurgiu na Barra da Tijuca, bairro de classes média e alta, onde Alckmin e Frossard bateram seus adversários.

¿ Esses bairros da Zona Norte e a Barra da Tijuca sempre tiveram votos semelhantes aos da Zona Sul ¿ disse o cientista político Antônio Carlos Alkmin, da PUC-Rio.

Heloísa Helena surpreende na Zona Norte

A geografia do voto no município do Rio, com 4.534.940 eleitores, surpreendeu especialistas. Não tanto pela vitória de Frossard e Lula na capital, mas pelo desempenho da candidata do PSOL, Heloísa Helena, na Zona Norte, onde obteve 360.367 votos. Para o cientista político Jairo Nicolau, do Iuperj, trata-se de um ¿fenômeno eleitoral¿:

¿ Sua razoável votação na Zona Sul ainda pode ser explicada. Lá, há uma juventude radical e pessoas desiludidas com o PT. Mas ela atingiu também as camadas mais populares.

A diferença de Heloísa Helena para Alckmin na Zona Norte foi de cem mil votos, mas, excluindo-se a região da Grande Tijuca, ela cai para 40 mil. Antônio Carlos Alkmin também se impressionou com a performance da candidata do PSOL na Zona Norte:

¿ Desde 1982, a tradição de voto na cidade justifica que Sérgio Cabral e Lula tenham votação popular. Mas o que se esperava é que Heloísa roubasse votos do PT na classe média menos conservadora, diferente daquela que se localiza na Zona Sul, na Tijuca, na Vila Isabel e no Maracanã.

Lagoa: Alckmin teve quase o triplo de votos de Lula

Para Maria Lúcia Werneck, da UFRJ, o voto da Zona Sul tem características muito próprias, mas nessas eleições apresentou leve mudança.

¿ A votação maior em Alckmin expressa um ceticismo em relação ao Lula, um abandono da postura lulista de fachada, de Lula-festa. Já na eleição estadual, há um voto ainda mais particularizado e sem muita consistência. A Zona Sul esquece que a eleição estadual abrange 92 municípios e só vota pensando na capital e na própria Zona Sul.

Antônio Carlos Alkmin lembrou o geógrafo Milton Santos para analisar a capital.

¿ A geografia expressa segmentações sociais. E isso se reflete no voto. Na Zona Sul, o IDH é próximo ao de Roma.

É exatamente na 17 ª Z.E., que corresponde ao Leblon e à parte da Lagoa, região de maior IDH do Rio, que Lula teve um dos piores desempenhos em relação a Alckmin. Recebeu apenas 8.466 votos, enquanto o tucano obteve 21.556. Para o governo do estado, Frossard somou 22.111 votos, mais que o triplo de Sérgio Cabral (6.230). Considerado um candidato popular, Crivella teve 2.241.

No outro extremo da cidade, na 175ª Z.E., em Acari, região de menor IDH da cidade, Lula recebeu 20.306 votos, enquanto seu maior adversário, 8.875. O mesmo aconteceu com Sérgio Cabral, que conseguiu 16.561, enquanto Denise ficou atrás até de Marcelo Crivella.