Título: A NOVA GEOGRAFIA DO VOTO
Autor: GLÁUCIO ARY DILLON SOARES
Fonte: O Globo, 09/10/2006, Opinião, p. 7

Quatro hipóteses: 1. O mapa da votação presidencial por estado de 2002 não bate com o de 2006. Eu achava que a correlação era negativa, mas não é. Simplesmente, pouco ou nada a ver.

2. A superposição de um mapa que me enviou Pedro Neiva sobre o referendo do desarmamento mostra que Lula foi mais forte onde o SIM também foi mais forte, acima da média nacional. Dos 27 estados, 22 confirmam a hipótese e apenas cinco não. Um deles, São Paulo, porque Alckmin o governou.

3. Lula, desta vez, foi mais forte nos estados mais pobres. Arrasou em vários estados mais pobres.

4. Minha quarta e última hipótese veio a reboque da terceira: se Lula foi mais forte nos estados mais pobres, então venceu onde os partidos tradicionais de antigamente dominavam. Comparando a votação de Lula, nestas eleições, com a da Arena e do PDS durante o regime militar, vemos que há muita coincidência.

Porém, podemos fazer mais usando recursos estatísticos. Tim Power, da Universidade de Oxford, acaba de me enviar regressões que agregam conhecimento novo. Há fortes correlações negativas entre a mudança na votação de Lula (votos em 2006 menos votos em 2002), por um lado, e a renda per capita e o Índice de Desenvolvimento Humano, pelo outro. A relação é forte! O IDH explica metade da variância na mudança da votação por Lula. Power usou um conceito de Vanhanen, um cientista político finlandês, e verificou que Lula era mais forte nos estados com menor competitividade democrática (aqueles com menor participação eleitoral e a disputa para governador menos renhida). A competitividade democrática explica quase 40% da variância na votação de Lula. Na média, Lula é mais forte onde a pobreza é maior, e a qualidade de vida, a participação eleitoral e a competitividade entre partidos são menores.

5. Como em eleições anteriores, há muita diferença entre os votos para governador e para presidente. Em Minas Alckmin recebeu três milhões e trezentos mil votos a menos do que Aécio.

6. Nas eleições proporcionais os partidos contam muito mais do que nas majoritárias.

7. Nas presidenciais os partidos contam menos: há tempos, PMDB e PFL não têm um candidato forte à presidência. Lula foi o candidato mais votado, mas o PT elegeu apenas um senador de vinte e sete.

Lula venceu nas áreas que eram chamadas de ¿grotões¿ pela esquerda, porque votavam em candidatos e partidos tradicionais. A nova geografia do voto, finalmente, se encaixa na velha teoria: o candidato populista recebeu mais votos e cresceu mais nos estados mais pobres.

GLÁUCIO ARY DILLON SOARES é pesquisador do Iuperj.