Título: ELE PARECIA UM DELEGADO DE PORTA DE CADEIA¿
Autor: Luiza Damé
Fonte: O Globo, 10/10/2006, O País, p. 3
Lula diz ter tido um dos dias mais tristes e Alckmin afirma ter dito o que `estava parado na garganta¿
Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou, durante encontro com cerca de 40 evangélicos, no Palácio da Alvorada, que ontem à tarde ainda não havia se recuperado dos ataques do adversário tucano, Geraldo Alckmin, no debate na Rede Bandeirantes. Lula disse que domingo foi um dos dias mais tristes de sua vida política, por causa do nível do debate, e chamou Alckmin de ¿delegado de porta de cadeia¿. Disse ainda que os tucanos são arrogantes e têm um discurso de ¿sanfona quebrada¿, porque insistem em discutir escândalos de seu governo.
Lula voltou a dizer que os adversários querem debater ética para não comparar os dados de seu governo com os oito anos de Fernando Henrique Cardoso. Afirmou ainda que é o único dos últimos governantes do país que tem autoridade para discutir ética.
¿ Confesso a vocês que ontem (domingo) foi um dos dias mais tristes de um político que eu vivi ¿ afirmou Lula, ressaltando já ter participado de vários debates, que tinham ¿um nível político assimilável¿. ¿ Ontem (domingo) eu pensei que não estava na frente de um candidato, pensei que estava na frente de um de delegado de porta de cadeia ¿ disse, trocando a expressão ¿advogado de porta de cadeia¿.
¿É a mesma sanfona, com a mesma arrogância¿
O presidente lembrou ter participado de debates com Ulysses Guimarães, Leonel Brizola, Mario Covas, Aureliano Chaves, Afif Domingos, Fernando Collor, Ciro Gomes, José Serra, Anthony Garotinho, Jânio Quadros e Franco Montoro. Para Lula, a população brasileira quer assistir a um debate sobre programa de governo, com medidas para melhorar a sua situação, e não a xingamentos entre os dois candidatos.
¿ Eles não querem discutir política social. Vocês que viram o debate perceberam que o cidadão é o samba de uma nota só. Ele pegou tudo que é matéria de jornal e resolveu transformar no programa de governo dele. Pensei que o debate fosse entrar na discussão da solução dos problemas brasileiros, que é o povo quer. O povo não quer um candidato xingando outro ¿ afirmou. ¿ Aquela velha sanfona quebrada, que só faz o mesmo som, é o que eles estão fazendo durante a campanha inteira. É o mesmo som, a mesma sanfona, com a mesma arrogância. E o povo brasileiro está descobrindo que eles não podem discutir política social, educacional, de desenvolvimento e muito menos política de investimento na pobreza deste país.
Lula afirmou que as denúncias de corrupção estão sendo apuradas e, no seu governo, a Polícia Federal foi reforçada, a Controladoria Geral da União fiscaliza a aplicação de dinheiro federal e o Ministério Público Federal tem autonomia.
¿ Eu, possivelmente, seja o único brasileiro que governou este país nos últimos anos que tem autoridade para falar em corrupção. Eles não tiveram, porque é fácil não sair corrupção no jornal, é só engavetá-la, é só colocá-la embaixo do tapete, embaixo do sofá. Tem gente que prefere não levantar o sofá e deixa a sujeira se acumulando. Só quando muda de casa vai ver o quanto de sujeira tem lá.
¿Espero que tenha muitos debates pela frente¿
Para Lula, o debate permitiu ao eleitor perceber dois projetos diferentes para o país. O dele, que na sua opinião, ¿representa os anseios da maioria da população brasileira¿. E o de Alckmin, que representa ¿o jogo de interesses dos grupos que tradicionalmente mandam no Brasil desde que Cabral aqui pôs os pés¿. Grupo que Lula classificou de arrogante, pedante e que reúne pessoas com ¿nariz em pé como se tivessem mais autoridade do que o restante do planeta¿:
¿ Espero que tenha muitos debates pela frente e as pessoas possam optar por um candidato em função do compromisso que ele esteja assumindo e não pelas bravatas e frases de efeito.
Lula rebateu avaliações de que quer dividir o país entre ricos e pobres e disse que os adversários tratam o povo pobre como coadjuvante.
¿ Não se meta a fazer política para pobres que aí você vai pagar o preço. Para eles, pobre tem de ficar batendo palmas, não pode subir no palanque, e nós ensinamos o pobre a subir no palanque ¿ disse Lula.
Durante o encontro com evangélicos, a maior parte cantores e compositores gospel, Lula participou de uma oração, comandada pelo senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), bispo da Igreja Universal. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que é seguidora da Assembléia de Deus, evocou a passagem bíblica em que Cristo oferece a outra face para o inimigo. Para a ministra, em política, também é preciso oferecer a outra face. Os deputados evangélicos Walter Pinheiro (PT-BA) e Gilmar Machado (PT-MG) também participaram da reunião, que teve a presença de cantores gospel como Mara Maravilha, Wanderley Cardoso, J. Neto e Robinson Monteiro.