Título: Reforma ameaçada
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 11/10/2006, O GLOBO, p. 2

Desde a eclosão da crise política no governo Lula, em 2005, a reforma política entrou na agenda de prioridades dos partidos. Apesar de todos estarem de acordo que é preciso mudar a legislação eleitoral, começa a ficar claro que há muita dificuldade para aprovar qualquer tipo de mudança. O problema é que não há consenso sobre o que deve ser feito nem se formou uma hegemonia.

Os líderes e deputados que há mais de um ano debatem na Câmara o projeto de reforma política estão pessimistas. O deputado Alexandre Cardoso (PSB-RJ) avalia que só tem chance de serem aprovadas propostas que dependam de lei ordinária, como a instituição do financiamento público das campanhas ou a lista fechada ou mista de candidatos. Aquilo que depende de maioria constitucional, como voto distrital e redução da cláusula de desempenho, não tem condições políticas de ser aprovado. O líder do PFL, Rodrigo Maia (RJ), considera que o projeto de reforma que está na Casa, relatado pelo deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO), não tem mais viabilidade, sobretudo depois que o PSDB, o PFL e parte do PMDB passaram a defender o voto distrital puro ou misto.

A existência de 21 partidos na Câmara, a falta de unidade sobre o tema nos blocos parlamentares liderados pelo PT e pelo PSDB e a inexistência de uma força hegemônica no Congresso são obstáculos consideráveis a qualquer mudança. Após o segundo turno, entre os dias 15 e 30 de novembro, os líderes pretendem colocar o projeto Caiado na ordem do dia na Câmara. Essa tentativa enfrentará uma nova dificuldade: o bloco derrotado nas eleições presidenciais resistirá a aprovar mudanças que serão pautadas pelo vencedor. O impasse, longe de colocar a reforma política num plano secundário, somente reforça a necessidade de sua realização. Nestes dois dias, o grande assunto entre os deputados, eleitos e não eleitos, foi o caixa dois. Não foram feitas denúncias públicas porque eles estão, por enquanto, reclamando de "gastos não contabilizados" feitos por companheiros de partido. Como o caixa dois continua sendo uma realidade nas campanhas de todos os partidos, é só uma questão de tempo para começarem as denúncias públicas contra os adversários políticos. E nisso todos os partidos se assemelham: eles têm muito vigor para denunciar e uma falta de vontade política imensa quando se trata de mudar as regras do jogo.