Título: 'Faltam 20 dias para a oncinha beber água outra vez'
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 11/10/2006, O País, p. 8

Lula faz caminhada em Guarulhos, parte para o ataque contra os tucanos e defende ações de seu governo

GUARULHOS. Embalado por uma pequena multidão no centro comercial de Guarulhos, ontem à tarde, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva descartou o figurino paz e amor e encarnou a fera política. Com voz rouca e gestos contundentes, Lula acusou os tucanos de esconderem a sujeira de seus governos, enumerou as falhas das gestões de Fernando Henrique Cardoso, na presidência, e de Geraldo Alckmin, no governo de São Paulo, e repetiu uma expressão que pode virar bordão de campanha:

- Faltam 20 dias para a oncinha beber água outra vez. E não adianta vir com calúnia e mentira porque já estou calejado - disse Lula.

O presidente usara a expressão em Sorocaba, no dia 24 de setembro, quando as pesquisas apontavam sua vitória no primeiro turno.

Cumprimentado, agarrado e beijado numa caminhada que reuniu cerca de 15 mil pessoas no centro de Guarulhos, segundo a Guarda Civil Municipal, Lula fez um discurso no qual procurou mostrar a diferença entre os projetos de governo petista e tucano. Ele enumerou pontos negativos da gestão de Fernando Henrique, como o apagão, as privatizações, falta de investimento em universidades federais, desemprego e baixos aumentos do salário mínimo, e fez o contraponto com as principais realizações de seu governo.

Segundo Lula, o segundo turno ajudará a população a ver as diferenças.

- O projeto deles a gente conhece há muito tempo, porque desde que Cabral colocou os pés aqui eles governam este país. Eles governaram desde as capitanias hereditárias até o Império e depois na República. Entra um, sai outro - disse ele.

Lula afirmou que seu governo combate a corrupção, ao contrário do que fizeram os tucanos.

- O nosso é um projeto que combate a corrupção e prende companheiros que se meteram com a corrupção. Nosso projeto não é de jogar a sujeira para debaixo do tapete- disse Lula.

E lembrou a infância pobre: - Morávamos em uma casinha pobre na Vila Carioca, no Ipiranga, e tinha só um sofá velho. Mas quando ia limpar a casa minha mãe fazia a gente levantar o sofá para varrer a sujeira. Eles, não. Vão empurrar a sujeira para debaixo do sofá.

Mercadante irrita assessores

Derrotado em Guarulhos, segundo maior colégio eleitoral de São Paulo, por 41% contra 47% de Alckmin, Lula disse que é contra a divisão do país entre ricos e pobres.

- Nosso projeto ajuda a todos. Não queremos a divisão do país entre ricos e pobres. Até porque não queremos ser pobres, queremos melhorar de vida. A divisão do mundo foram eles que criaram, não nós.

Lula estava acompanhado dos ministros Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência) e Luiz Marinho (Trabalho), além do senador reeleito Eduardo Suplicy, da coordenadora da campanha em São Paulo, Marta Suplicy, e do senador Aloízio Mercadante, candidato derrotado ao governo de São Paulo. A presença de Mercadante irritou assessores do presidente. A todo momento Mercadante, cujo ex-chefe da campanha é um dos responsáveis pelo escândalo do dossiê, entrava na frente de Lula e atrapalhava o trabalho dos fotógrafos e cinegrafistas.

- Além de vir aqui ele insiste em ficar na frente. Já tiramos três vezes, mas ele insiste em voltar - disse um assessor.

O presidente do PT, Marco Aurélio Garcia, divulgou nota na página do partido na internet negando divergências entre Lula e Mercadante.

A onça ficou com sede

A primeira vez que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou sede em ser reeleito foi a uma semana do primeiro turno, dia 24 de setembro passado, em comício em Sorocaba (SP):

- Dia 1º de outubro é dia de a onça beber água. Esta oncinha está com sede. Eles sabem que mais quatro anos meus eu vou desmoralizar muitos que governaram este país.

Antes, num tom entre o desabafo e a provocação aos adversários, havia afirmado ao público de 3.800 pessoas:

- Nunca falei que ia ganhar as eleições no primeiro turno por modéstia, por respeito. Mas quero dizer para vocês: vamos ganhar as eleições domingo (1º de outubro). Podem ficar certos. Se alguém achar que a campanha presidencial vai para o segundo turno, vai ter que esperar 2010.