Título: O tom da largada
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 13/10/2006, O GLOBO, p. 2

Fechadas as alianças possíveis, começou ontem a segunda fase da campanha presidencial em segundo turno, com os candidatos Lula e Alckmin fazendo ajustes em seus discursos depois do debate renhido de domingo passado na TV Bandeirantes. Para recomeçar, ambos adotaram um tom mais moderado, que tende a subir de novo com a dinâmica da campanha.

A pesquisa Ibope divulgada ontem confirmou para os tucanos o que já havia sido detectado: Alckmin cometeu um erro de dosagem no debate, desrespeitou a liturgia mínima que se deve ter para com um presidente, se não em respeito a ele, aos que o elegeram. A virulência, que ele depois, mas só depois, justificou como fruto de sua indignação, fez com que parecesse arrogante e insolente. E autoritário, detectou pesquisa Datafolha. Em Lula, o debate reforçou a percepção da corrupção no governo. Mas seu eleitorado já assimilou, mesmo tapando o nariz, as estripulias petistas, seja pela forte identidade com o presidente, seja pela avaliação positiva de seu governo.

Confirmando a tendência apontada pelo Datafolha, o Ibope trouxe Alckmin com 40%, quase igual ao primeiro turno, e Lula maior, com 52%. Em votos válidos, uma diferença a favor do presidente de 14 pontos: 57% a 43%.

No programa eleitoral, Alckmin voltou a investir na imagem de gestor moderno e dinâmico, mostrou realizações em São Paulo e manteve o ataque na questão ética, mas sem passar do ponto. Reapresentou apenas um dos seus duros ataques a Lula no debate, a passagem em que lhe cobra ¿a origem do dinheiro sujo para comprar o dossiê fajuto¿.

Contra o tucano, deve estar funcionando também a campanha negativa do PT, que o acusa de planejar novas privatizações e um arrocho fiscal que levaria a demissões e cortes nos gastos sociais. Na entrevista ao GLOBO, Lula negou que essa conduta caracterize terrorismo eleitoral, pois teria como base a experiência dos governos tucanos. A campanha de Alckmin deve pôr no ar desmentidos veementes. Já ontem ele prometeu ampliar e melhorar o Bolsa Família.

O programa de Lula, por outras razões, fez uso de várias passagens que o favoreceram no debate, relacionadas com diferentes questões, inclusive o caso do dossiê. O conjunto de trechos editados serviu nitidamente para passar a idéia de que não fugiu nem fugirá do debate, contentando assim os eleitores que perdeu no primeiro turno por não ter ido ao debate da TV Globo. À noite, desculpou-se por ter faltado. Ele irá ao próximo, mas, segundo auxiliares, não permitirá que Alckmin faça prevalecer apenas a agenda da corrupção. Tal como em seus programas, insistirá na comparação de governos e propostas.

Esse tom inicial quase ameno, embora mais áspero que o dos programas de primeiro turno, não deve prevalecer. No primeiro turno, com o discurso propositivo e a imagem de bom gerente, Alckmin conseguiu tornar-se mais conhecido nacionalmente. Mas foi batendo (não em doses cavalares, como no debate) que cresceu na reta final, com a ajuda dos aloprados do PT que fizeram a operação dossiê e o auxílio do delegado Bruno, que divulgou as imagens do dinheiro apreendido. Seu desafio agora é pôr em prática uma frase que gosta de dizer a respeito de juros: ¿A diferença entre remédio e veneno é a dose¿.

Há quem subestime a importância do horário eleitoral na definição do voto. Para o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, varia de 4% a 5% o contingente de eleitores que se decide em função dos programas. Mas deve ser diferente num segundo turno como este, envolvendo o presidente de um governo bem avaliado, embora varejado por denúncias de corrupção, e um adversário tenaz, que saiu de menos de 20%, venceu o ceticismo dos aliados e chegou ao segundo turno com 40%.