Título: ATO DO GOVERNO TEM TOM ELEITORAL NOS DISCURSOS
Autor: Flávio Freire
Fonte: O Globo, 14/10/2006, O País, p. 8

Lula diz que Banco do Brasil não estava acostumado a emprestar dinheiro aos pobres

BRASÍLIA. A cerimônia de assinatura de decretos de desapropriação de terras no complexo da Usina Catende, na Zona da Mata, em Pernambuco, ontem no Palácio do Planalto, ganhou contornos eleitorais não só pela presença do candidato do PSB ao governo pernambucano, Eduardo Campos, mas pelo apoio que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu de pessoas beneficiadas que discursaram na solenidade.

O discurso do presidente Lula foi em tom de campanha ao criticar a gestão dos bancos públicos, em especial do Banco do Brasil, nos governos anteriores.

¿A prioridade era para quem não pagava o empréstimo¿

Lula disse que nos governos passados o Banco do Brasil não estava acostumado a emprestar dinheiro aos pobres. Os decretos desapropriam 24 imóveis rurais, num total de 23 mil hectares, que agora serão dos ex-trabalhadores rurais da Catende, usina cuja falência foi decretada em 1995.

¿ Em outubro de 2003, descobrimos que muita gente no Banco do Brasil tinha perdido o hábito de emprestar dinheiro para o pequeno. E não era maldade do gerente não, não era má-vontade do superintendente, era que a cultura política estabelecida no país era não ter prioridade para os pequenos. A prioridade era apenas para aqueles que habitualmente costumavam contrair empréstimo e depois não pagavam. E depois corriam, sobretudo em época eleitoral, para o governo, e faziam o governo fazer um novo plano de refinanciamento por 15, 20, 30 anos. Essa história perdurou 30, 40 anos no Brasil. Definitivamente, vamos ter que mudar essa situação ¿ disse.

Lula afirmou que esteve na Usina do Catende em 1999 e que a empresa contraiu empréstimo no Banco do Brasil de cerca de R$400 milhões, valor oito vezes superior ao seu valor patrimonial, que era de R$60 milhões.

¿ A coisa que mais me assustou foi a megalomania de pessoas que conseguem pegar dinheiro com facilidade nos bancos públicos, coisa que o trabalhador não pegava naquela época, e aplicar em coisas que não eram prioritárias. Na verdade, o que vi lá foram algumas mansões (...) e o dinheiro para resolver o problema não era aplicado. Como é que uma empresa que tem uma avaliação do seu patrimônio líquido de apenas R$60 milhões consegue do BB empréstimos oito vezes superior ao valor da empresa?

¿O Brasil era assim. Nós mudamos com o senhor¿

O presidente estimulou os presentes a discursarem.

¿ O Brasil era assim. Nós mudamos com o senhor. Vem mudando na mão do senhor e, ao que tudo indica, continuará mudando ainda. E também teremos um governador ajudando a gente também, né, Eduardo (candidato ao governo de Pernambuco)? ¿ disse Bruno Ramos, o advogado dos trabalhadores, fazendo mais pedidos para um ¿próximo governo do senhor¿.

O presidente ainda tentou explicar que aquele não era um evento eleitoral e sim um ato de justiça aos trabalhadores da Catende. O candidato Eduardo Campos negou o caráter eleitoral. A Usina Catende teve falência decretada em 1995, e os trabalhadores conseguiram, por meio de ação judicial, assumir o controle da empresa e agora estão tendo direito sobre a terra. Segundo o governo, os decretos beneficiam 3.600 famílias.