Título: UMA MÁQUINA DE R$100 BI
Autor: Henrique Gomes Batista
Fonte: O Globo, 15/10/2006, O País, p. 3

Próximo presidente terá um funcionalismo que custa 12 vezes o gasto do Bolsa Família

Opresidente a ser eleito em duas semanas tem um desafio que, em reais, é maior que programas sociais, obras ou investimentos: administrar a máquina do governo, que gastou no ano passado R$100,3 bilhões em salários e benefícios de 1,96 milhão de servidores da ativa e aposentados. O valor da folha do funcionalismo representa 12 vezes o que se gasta com repasses a 11 milhões de famílias beneficiárias do Bolsa Família (R$8,4 bilhões). Para fazer frente à folha, foram consumidos 26,9% do arrecadado com impostos federais no ano passado.

Segundo especialistas, a diminuição do peso do Estado é uma das saídas para obtenção de mais recursos para investimentos, para reduzir juros ¿ diminuindo a necessidade de financiamento do Estado ¿ e para estimular o crescimento econômico. A redução de gastos públicos ganhou força no segundo turno da disputa rumo ao Planalto, mas os dois candidatos, o petista Luiz Inácio Lula da Silva e o tucano Geraldo Alckmin, não detalham em seus programas de governo como fazer isso.

A estrutura chefiada hoje pelo presidente da República envolve 33 ministros, 219 secretários e 911 diretores apenas na administração direta no Poder Executivo federal. A população que paga os impostos que sustentam a máquina em geral não é atendida de forma satisfatória pelo serviço público e é vítima da burocracia. Grande parte das despesas do governo é permanente e só tende a crescer.

A radiografia de gastos mostra três principais problemas: a folha de pagamento do Executivo tem peso enorme nas contas públicas ¿ R$76,9 bilhões, ou 20,6% do total arrecadado pelo governo federal em 2005. As despesas com pessoal no Legislativo e no Judiciário crescem em ritmo mais acelerado do que no Executivo. Outro dado que chama a atenção: 42,4% desses recursos, ou R$42,5 bilhões, são destinados a pagamento de inativos. O montante equivale ao déficit da Previdência que, este ano, deverá ser de R$42 bilhões, segundo o Ministério do Planejamento.

¿ A máquina pública não pode crescer mais, e só reduzindo seu tamanho será possível diminuir os impostos. Como é difícil cortar gastos, é preciso um esforço em quase todos os setores, principalmente o de pessoal, que só perde para os benefícios do INSS em termos de gasto ¿ diz Raul Velloso, economista especialista em finanças públicas.

Pressão por mais pessoal piora situação das contas

A situação das contas públicas tende a piorar pois, além do impacto permanente com a contratação de funcionários por meio de concursos públicos, pressões por mais pessoal devem aumentar o tamanho da máquina. O governo fechou acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU) para substituir 33 mil trabalhadores terceirizados por concursados. Judiciário e Legislativo, que lideram o ranking do crescimento de gastos com pessoal, mobilizam-se para concursos em 2007.

¿ O problema não é o tamanho do gasto do governo, mas o tipo do gasto e a tendência de crescimento. Se o aumento das despesas fosse usado para investimentos, seria positivo. O ruim é que o governo destina cada vez mais dinheiro para a manutenção da estrutura burocrática, o que cria a necessidade de maior arrecadação, não melhora os serviços, aperta as contas públicas e afasta investimentos privados ¿ diz o economista-chefe do Banco Pátria de Negócios, Luiz Fernando Lopes.

Gerenciar o alto valor gasto com pessoal no governo federal causa polêmica. Para o economista Paulo Nogueira Batista Júnior, da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, a defesa do enxugamento da folha pode ser perigosa:

¿ Em muitas áreas do serviço público, o que se constata é a escassez de pessoal, como na segurança pública e nos órgãos de fiscalização dos gastos. Não há pessoal qualificado suficiente. Em outras áreas, há desperdício e excesso de gente. O que se precisa é passar um pente fino para verificar o que é possível fazer: cortar ou remanejar.

Outra frente citada como forma de reduzir despesas e inibir corrupção e tráfico de influência é a redução dos cargos de confiança ¿ funcionários escolhidos por políticos e gestores de órgãos públicos. O ano passado terminou com 19.925 pessoas em cargos de confiança, ganhando, em média, salário de R$4.900 por mês. Mas alguns recebem até R$11.100 por mês, podendo acumular outros rendimentos.

* Da CBN, especial para O GLOBO

www.oglobo.com.br/pais/eleicoes2006