Título: AGRONEGÓCIO TENTA COLHER VOTOS PARA ALCKMIN
Autor: Adauri Antunes Barbosa
Fonte: O Globo, 15/10/2006, O País, p. 8

Tucano venceu em estados onde é mais forte o setor, que está insatisfeito com políticas de Lula para agricultura

SÃO PAULO. O agronegócio está em pé de guerra. Os motivos são os juros altos, o dólar baixo e a redução significativa de incentivos que o setor tinha. A guerra, no campo político, é contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem os ruralistas acusam de ser o responsável pelo que chamam de ¿a maior crise da História¿ dos negócios dos grandes agricultores do país.

No primeiro turno da eleição presidencial, os ruralistas mostraram sua força. Nos seis principais estados produtores agrícolas do país, Lula foi derrotado. O candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, ganhou com folga em São Paulo, no Paraná, em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul, em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Neste segundo turno, a guerra continua.

¿ No segundo turno, a votação (em Alckmin) deve se repetir. Não acredito que diminua ¿ diz o presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), João de Almeida Sampaio Filho.

Nos estados onde os ruralistas comandam o agronegócio, o presidente da SRB não acredita que haja algum tipo de surpresa nas urnas.

¿ De todos os estados onde o agronegócio é importante, o Alckmin só não ganhou em Minas Gerais e Tocantins. Ganhou com uma margem considerável nos demais. E essa situação deve se repetir ¿ prevê.

João Bosco Leal, presidente do Movimento Nacional dos Produtores (MNP), com sede em Campo Grande, diz que nunca viu os produtores rurais se empenharem tanto numa campanha como no primeiro turno deste ano.

¿ Os produtores se envolveram de corpo e alma, pedindo votos e até com contribuições para a campanha, para impedir que Lula ganhasse ¿ afirma.

De acordo com João Leal, os produtores estão mobilizados para ampliar a vantagem de Alckmin, não só em Mato Grosso do Sul, como também para diminuir a diferença pró-Lula em Minas Gerais. O MNP está organizando um grande evento em Uberaba, no Triângulo Mineiro, para fortalecer a campanha do tucano em Minas.

Nos estados do Sul, onde Lula vencera a eleição em 2002, a crise no campo acertou em cheio as economias estaduais, provocando uma campanha antipetista nos estados agrícolas. No Rio Grande do Sul, o presidente da Federação da Agricultura (Farsul), Carlos Sperotto, acusa o governo Lula de ser o responsável pelo ¿desmonte¿ do agronegócio:

¿ Está havendo desmonte da agricultura empresarial no Rio Grande do Sul, uma desestruturação feita profissionalmente, com uma postura claramente contrária ao setor.

A queixa dos gaúchos é igual a de outros estados:

¿ Na penúltima safra, plantamos com o dólar a R$3,20 e vendemos com ele a R$2,60. Na última, plantamos a R$2,60 e estamos vendendo com o dólar a R$2,16. Ou seja, plantamos com custos altos e vendemos com preços baixos ¿ reclama Sperotto.

A lista dos descontentamentos que motivam a virada política do Sul continua em Santa Catarina.

¿ Enfrentamos três anos consecutivos de estiagem e três anos de promessas de liberação de recursos que não chegam ao produtor ¿ reclama o vice-presidente da Federação da Agricultura de Santa Catarina (Faesc), Enori Barbieri.

Ainda no Sul, o presidente da Sociedade Rural do Paraná (SRP), Alexandre Lopes Kireeff, afirma que a condução da política agrícola no país foi infeliz, levando a entidade, que reúne 30 associações e cooperativas de produtores, a participar das mais exaltadas manifestações do setor no estado, com bloqueios de rodovias. Toda a revolta, segundo Kireeff, é porque o governo Lula provocou o decréscimo da produção agrícola.

¿ A primeira grande safra dele (governo Lula) foi a plantada no governo anterior e dentro de um contexto diferente, e, assim, tivemos um recorde. Hoje perdemos cerca de 20% da produção em relação ao começo do governo Lula ¿ diz ele, sinalizando que as perdas devem continuar. ¿ A previsão para a próxima safra de trigo é de queda de 40%.

Além de se juntarem aos ruralistas nas reclamações contra o câmbio, a precariedade das estradas e as altas taxas de juros, os produtores de Mato Grosso criticam o atraso do Banco do Brasil para liberar recursos para o custeio da safra de soja que começa.

¿ Em outras épocas, no mês de outubro todo mundo já estava plantando. Agora ninguém sabe se vai conseguir financiamento ¿ reclama o presidente em exercício da Federação da Agricultura de Mato Grosso (Famato), Normando Corral.

Segundo o Banco do Brasil, a queda na liberação de recursos este ano é de 70% em relação ao mesmo período do ano passado. O atraso na aprovação dos créditos se deve às pendências relativas à safra passada, que ainda não foram sanadas. A Famato acredita que a dívida dos agricultores com bancos e com as tradings que financiam o setor chegue hoje a R$6 bilhões em Mato Grosso. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que a queda na área plantada de soja nesta safra seja de 12%. Para a Aprosoja, associação que reúne os produtores da oleaginosa, a redução pode chegar a 20%.

Esses números não passam de mero chute. Eu também poderia chutar ¿ critica Normando Corral. ¿ Com tanta indefinição, é impossível fazer qualquer prognóstico porque há muitos produtores que, sem resposta do Banco do Brasil, ainda não sabem se conseguirão plantar este ano.

COLABORARAM: Carlito Costa (Florianópolis), Ana Paula de Carvalho (Curitiba), Chico Oliveira (Porto Alegre), Anselmo Carvalho Pinto (Cuiabá) e Paulo Yafusso (Campo Grande)