Título: Lula contra a reeleição
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 17/10/2006, O GLOBO, p. 2

Quando se preparava ontem para gravar a entrevista ao programa ¿Roda viva¿, da TV Cultura, queixando-se do fardo de ser ao mesmo tempo governante e candidato, o presidente Lula voltou a criticar o sistema de reeleição, pregando seu fim e a volta ao mandato de cinco anos. Como voltou a prometer empenho pela reforma política, terá sua chance de propor a mudança, embora não se tenha comprometido.

Como o candidato tucano, Geraldo Alckmin, também está pregando o fim da reeleição, os dois mais influentes partidos poderão se entender pelo menos quanto a isso, fazendo desta a última campanha presidencial com o presidente disputando a reeleição no cargo. Se estivesse em questão apenas a Presidência seria mais fácil, mas, como governadores e prefeitos também seriam afetados, era previsível que tal iniciativa produzisse resistências colossais. E haverá, sempre, o argumento de que é muito cedo para se descartar um sistema que propicia a continuidade administrativa e a oportunidade para que governos bem-sucedidos desfrutem de mais tempo para implantar seus projetos. Se a regulamentação é falha, como disse Lula, pode-se, a qualquer tempo, aperfeiçoá-la.

¿ É muito ruim. Agora tornei-me ainda mais contrário a esta reeleição. Tenho dito que nunca sei quando sou presidente e candidato, e isso não ocorre só comigo. Agora mesmo, se acontecer algo grave no país, tenho que sair para tomar providências.

Lula foi lembrado de que, mesmo existindo a regra, não era obrigado a concorrer. Ele concordou, mas alegou que na política joga-se segundo as regras em vigor. Reclamou de estar sendo criticado até por fazer reuniões ou dar entrevistas no Alvorada, práticas admitidas pelas regras fixadas. Nem acha que a reeleição com desincompatibilização seja melhor.

¿ É ruim do mesmo jeito. O mais adequado é o mandato de cinco anos. Com a alternância no poder, esta saudável prática democrática, o sujeito que fizer um bom governo pode voltar a se candidatar mais adiante, se quiser.

Ao falar dos pontos da reforma política que defende (listas fechadas e financiamento público de campanhas, com simpatias pelo voto distrital misto), não se comprometeu a propor o fim da reeleição. Mas se nem a regulamentação for revista, a cada eleição teremos o presidente desfrutando das vantagens do cargo e a oposição dizendo que ele abusa.

Na entrevista, Lula deu respostas quase invariáveis sobre questões que foram abordadas na entrevista ao GLOBO na semana passada. Voltou a dizer que já fez o que podia no caso do dossiê, afastando os envolvidos. E deixou mal o ex-presidente do PT, Ricardo Berzoini, ao dizer que lhe cobrou explicações para a ¿sandice¿ e, como elas não vieram, afastou-o de sua campanha.

Lula falou ainda do caso de seu filho Lulinha, cuja empresa, a Gamecorp, recebeu aporte financeiro da Telemar. Alegou que a empresa é privada, e ao argumento de que os fundos também são seus acionistas, rebateu que não participam da gestão. ¿Se encontrarem algo errado, o que não encontraram até agora, meu filho estará tão sujeito à lei como qualquer outro brasileiro¿.

Voltou a negar que esteja fazendo ¿terrorismo¿ quando afirma que Alckmin, se eleito, fará novas privatizações e um duro ajuste fiscal. São afirmações baseadas nas práticas tucanas. ¿Ele que diga que não vai fazer isso¿. Voltou a negar a necessidade de um ajuste fiscal, mas defendeu mudanças na Previdência, que buscaria fazer através de ampla negociação. Na área política, defendeu as reformas já mencionadas e a revisão do modo de fazer o Orçamento, tornando obrigatória e transparente a execução de emendas individuais, para evitar intermediários e a ação de quadrilhas como a de Vedoin. No fim, uma pergunta que Alckmin também responderá domingo, no mesmo programa: o que fará se não for eleito? Lula diz que voltará para São Bernardo, de onde pode ver pela janela a fábrica e o sindicato que o projetaram na política.