Título: ONU: IMPASSE LATINO-AMERICANO
Autor: Helena Celestino
Fonte: O Globo, 17/10/2006, O Mundo, p. 25

Venezuela e Guatemala brigam por vaga no Conselho de Segurança

NOVA YORK. Foram realizadas dez rodadas de votação, mas o impasse se manteve depois de quase sete horas de sucessivos escrutínios na Assembléia Geral. Nem Guatemala nem Venezuela conseguiram ontem o número de votos necessários para ocupar a vaga rotativa de representante da América Latina no Conselho de Segurança da ONU. Por isso, hoje começa tudo de novo e há possibilidade de um terceiro candidato ser indicado, embora embaixadores dos dois países tenham dito que não vão desistir.

Para conquistar a vaga rotativa no mais importante fórum político da ONU é preciso obter dois terços dos votos dos 192 países representados na Assembléia Geral.

Contrariando as expectativas, a Guatemala teve uma expressiva votação de manhã e, na terceira rodada, parecia que estava para ser eleita. Nos corredores, já se comentava que seria uma constrangedora derrota para o presidente Hugo Chávez e, dentro do plenário, os venezuelanos agradeciam aos eleitores, parecendo se despedir.

Mas, em mais uma surpresa, a Venezuela foi ganhando terreno até os dois países chegarem a um inusitado empate (93 a 93) na sexta rodada, o melhor resultado conseguido pelos venezuelanos que, a partir daí, foram perdendo votos para a Guatemala, até a votação ser suspensa às 18h30m (hora local).

Na busca de votos, Venezuela distribuiu chocolates no plenário

A votação vem mobilizando fortemente a ONU há vários meses e ontem a campanha eleitoral correu solta o tempo todo. O embaixador americano, John Bolton, foi orientado a faltar a uma reunião em Washington e durante as rodadas de votação, ia de mesa em mesa no plenário, tentando arrancar votos para a Guatemala entre os indecisos. A Venezuela distribuía chocolate aos delegados e a Guatemala dava aos delegados uma pulseirinha da sorte, parecida com as fitinhas do Senhor do Bonfim.

¿ Não vamos nos retirar. Estamos concorrendo, não contra um país irmão, mas contra a mais poderosa potência do planeta, os donos do Universo ¿ disse o embaixador venezuelano na ONU, Francisco Arias Cardenas

O Brasil, assim como todos os países do Mercosul, votaram na Venezuela, obedecendo a uma diretriz acordada pelos presidentes dos cinco países numa reunião de cúpula em Córdoba, há dois meses. Mas a América Latina se dividiu. O Chile declarou abstenção e sabe-se que Peru e Equador também ficaram em cima do muro. México e Colômbia votaram na Guatemala.

¿ Não entramos no mérito das candidaturas, respeitamos os dois candidatos, mas votamos na Venezuela como um membro pleno do Mercosul ¿ disse o embaixador brasileiro, Ronaldo Sardenberg.

Muitos não contaram em quem votaram. A Europa apostou na Guatemala; Ásia e a África se dividiram, o que explicaria essa votação abaixo do esperado para a Venezuela.

Por trás dessa intensidade de emoções entre os habitualmente frios diplomatas, pairava a figura de Hugo Chávez na abertura da Assembléia Geral da ONU, no dia 20 de setembro, dizendo que o presidente George W. Bush era ¿o diabo¿.

¿ Votei na Guatemala porque achei de mau gosto os comentários no plenário da ONU. Mas a campanha aberta dos Estados Unidos pela Guatemala também pode ter tirado votos deles ¿ disse o embaixador da Tanzânia na ONU, Augustine Mahiga.