Título: METRÓPOLES MAIS POBRES
Autor: Cássia Almeida e Bruno Rosa
Fonte: O Globo, 18/10/2006, Economia, p. 35
Indigência nos grandes centros está maior que há dez anos, apesar de queda recente
Dois anos consecutivos de queda da pobreza e da indigência nos grandes centros não foram suficientes para deixar as metrópoles brasileiras melhores que há dez anos. Estudo do economista André Urani, diretor-executivo do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade (Iets), constatou que, enquanto no Brasil como um todo a parcela da população que vive na indigência baixou de 14,5% em 1995 para 10,8% em 2005, no Brasil metropolitano ela cresceu de 7,2% para 7,9%. Nos indicadores de pobreza, a mesma situação. No Brasil, caiu de 33,8% para 29,1%. No mesmo período, nas metrópoles subiu de 21,9% para 23,6%.
¿ O modelo de desenvolvimento adotado nas grandes cidades brasileiras, baseado na substituição das exportações, esgotou-se. É preciso repensar as cidades, aceitar que há crise nas metrópoles. É como se as metrópoles fossem um freio para a redução da pobreza e da indigência ¿ afirma Urani.
O economista e chefe da representação do BNDES em Brasília, Antonio Prado, acredita que o mercado de trabalho explica essa situação nas metrópoles.
¿ Na década de 90, o desemprego aumentou muito nas grandes cidades, com queda enorme de renda. Somente em 2005 houve recuperação, depois de retração contínua desde 1997 ¿ diz Prado.
Ele cita ainda o avanço da informalidade, refletindo diretamente na qualidade da ocupação, como outro fator a intensificar a pobreza nessas regiões:
¿ Além disso, houve uma recuperação no Brasil não metropolitano, ancorado na agricultura.
Na avaliação do economista, o quadro deve continuar melhorando nos próximos anos, diante da recuperação recente no mercado de trabalho, com a expansão do emprego com carteira assinada.
Índices melhoraram nos últimos 2 anos
Em 2004 e 2005, a pobreza e a indigência caíram também nas metrópoles. A parcela de indigentes nas grandes cidades era de 11,2% em 2003 e a de pobres, de 28,7%. Essas reduções já indicam uma tendência, na opinião do secretário de Avaliação e Gestão de Informações do Ministério de Desenvolvimento Social, Rômulo Paes. Para ele, a miséria ter caído menos nas cidades reflete a redistribuição das unidades produtivas para o interior dos estados e para o Nordeste. Um certo esvaziamento econômico associado à pulverização da rede de serviços públicos de saúde, educação e assistência social para o interior.
¿ Antes, procurava-se as cidades em busca dos serviços públicos e das oportunidades de trabalho. Agora, isso está mais espalhado. Além disso, as cidades pioraram, com a violência urbana e os problemas ambientais, intensificando a pobreza ¿ diz Paes.
Para ele, a solução está em integrar mais os serviços públicos, de forma sistêmica, para acelerar a queda da pobreza nas grandes cidades:
¿ É um desafio fazer essa integração, mas os dados não indicam qualquer inversão na tendência de queda desses indicadores.
Na linha de miséria do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), a situação é semelhante: em 1995, os miseráveis representavam 15,07% da população e, em 2005, a parcela subiu para 16,22%.
¿ As metrópoles são voláteis e sofrem mais com as crises externas como as que assolaram o país na década de 90. Assim como sentem também primeiro os benefícios ¿ diz o chefe do Centro, Marcelo Neri.
Essa oscilação alcançou Maria Edenéa de Souza, de 54 anos, Ela vende peças íntimas em uma feira na Tijuca, desde que perdeu o emprego, com carteira assinada, há quatro anos.
¿ Só aqui na rua, eram seis barracas. Hoje, são mais de 20. Vendo calcinhas de segunda a sexta-feira e, mesmo assim, não consigo o suficiente para pagar minhas contas. Sou obrigada a fazer trabalhos extras. A situação está muito difícil. Moro longe e venho de ônibus. São muitas as despesas ¿ lamenta Maria.
Urani diz que a desigualdade caiu, no Grande Rio e no Brasil metropolitano, pela perda dos mais ricos:
¿ Os pobres nada ganharam no Rio e perderam no Brasil. A queda da pobreza não é visível nas cidades. Por mais consciência que tenham as elites, fica difícil aceitar perdas constantes no rendimento diante da situação do Rio, por exemplo.