Título: ÍNDIOS INVADEM ÁREA DA VALE EM CARAJÁS, PARÁ
Autor: Ismael Machado
Fonte: O Globo, 19/10/2006, O País, p. 15

Acessos a mina de ferro estão bloqueados desde anteontem, quando indígenas fizeram três mil funcionários de reféns

BELÉM. O núcleo urbano da Companhia Vale do Rio Doce em Carajás, no Pará, está ocupado desde anteontem à noite por cerca de 200 índios da etnia xicrin, das aldeias Cateté e Djudjêkô, que mantêm bloqueados os principais acessos à mina de ferro de Carajás.

Armados com arcos e bordunas, os índios interromperam o carregamento de minério da unidade de moagem e filtragem da mina, paralisando a produção diária de cerca de 250 mil toneladas. O prejuízo pode chegar a US$7 milhões por dia.

Anteontem, três mil funcionários foram mantidos reféns por mais de três horas. Os índios ocuparam o restaurante, danificaram equipamentos e depois invadiram salas do núcleo. A Vale tem cerca de 15 mil funcionários em Carajás.

Ontem o juiz federal Carlos Henrique Haddad concedeu reintegração de posse à Vale. A Polícia Federal entregou a ordem judicial aos líderes indígenas, mas o local não foi desocupado. De manhã, mais de cinco mil empregados foram impedidos de entrar na área. Pintados para guerra e armados, os índios dançavam em frente à entrada do núcleo e impediam a passagem de pessoas e veículos. As atividades operacionais estão suspensas e devem permanecer assim até que todo a área seja desocupada.

A empresa divulgou nota afirmando não "compactuar com métodos ilegais e violentos" e informou que solicitou apoio da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Funai para a desocupação das instalações.

Vale afirma que cumpre acordos

Os índios encaminharam ontem pedido de reunião para amanhã com a seguinte pauta de reivindicações: reajuste com "reparação de perdas" do recurso mensal repassado; construção de 40 casas para a comunidade Cateté e de 20 casas para a Djudjêkô; e reforma e manutenção das estradas Cateté-PVK e Djudjêkô-Bekuare. A Vale informa que tem um acordo com os xicrin prevendo o repasse de R$9 milhões por ano aos índios e que vem cumprindo o acordo.

Com a intervenção da Polícia Federal, o cacique Karandre disse que ia se retirar da mina, mas continuar ocupando o núcleo urbano. Uma reunião deve ocorrer hoje de manhã.

- Não vamos negociar. Esperamos que a Funai negocie a saída - disse o diretor operacional da Vale, José Carlos Soares.

No ano passado, cerca de 280 xicrin, muitos deles armados, invadiram o núcleo para pressionar a empresa a atender pedidos de benefícios às aldeias.

Empresa repudia ataque

Vale divulga nota de esclarecimento

A Companhia Vale do Rio Doce divulgou ontem a seguinte nota de esclarecimento:

"1) Na tarde desta quarta-feira, 18/10, a Polícia Federal esteve em Carajás (PA) e entregou aos líderes da comunidade xicrin o mandado de reintegração de posse, concedido hoje pela Justiça Federal, que determina a desocupação da área invadida ontem; 2) As lideranças indígenas receberam o mandado mas não desocuparam a área. 3) Ontem, 17/10, cerca de 200 índios da Terra Indígena Xicrin, das aldeias Catete e Djudjêkô, invadiram, de forma violenta, as instalações da Companhia Vale do Rio Doce em Carajás, armados de arcos, flechas e bordunas; 4) Divididos em grupos, ocuparam a pêra ferroviária, locomotivas, sala de controle de pátio, entre outras instalações; 5) No momento da invasão, havia aproximadamente três mil empregados em Carajás. Os índios tomaram as chaves dos ônibus que levariam de volta para casa, no Núcleo Urbano, 600 pessoas, que foram mantidas reféns por cerca de duas horas; 6) Na manhã de hoje, mais de cinco mil empregados que iriam iniciar o turno de serviço foram impedidos de entrar na área industrial. As atividades operacionais ficaram suspensas. 7) A produção diária de Carajás é de 250 mil toneladas de minério de ferro; 8) A empresa vai entrar com uma representação criminal perante a Delegacia de Polícia Federal e o Ministério Público Federal, cobrando a apuração das condutas criminosas dos índios; 9) A CVRD desconhece o motivo da invasão. Há rumores de que a intenção era pressionar a empresa a aumentar os recursos financeiros destinados à comunidade indígena, devidamente pactuados com os xikrin e cujas liberações encontram-se rigorosamente em dia; 10) A CVRD não compactua com tais métodos ilegais, não cederá a chantagens de qualquer espécie - reiteradamente usadas pela comunidade xicrin - e destaca que as operações da empresa não estão em terras indígenas."