Título: DE OLHO NO RISCO PARA 2007
Autor: Patricia Duarte e Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 19/10/2006, Economia, p. 25

BC reduz juro a 13,75%, mas analistas dizem que expansão no ano que vem já foi afetada

O Comitê de Política Monetária (Copom) reduziu ontem em 0,5 ponto percentual a taxa básica de juros Selic, para 13,75% ao ano, a quarta redução seguida nesta magnitude e reforçando o menor patamar da História. Também foi a 11ª queda consecutiva, recorde de baixas do Banco Central (BC), ultrapassando os dez cortes feitos em 1999. A decisão de ontem, segundo dia de reunião do comitê, foi unânime, tomada depois de apenas duas horas - em janeiro, por exemplo, o encontro durou quase cinco horas, o segundo mais longo desde 2003. Já esperado pelo mercado, o nível do corte foi criticado por economistas, empresários e sindicalistas, para quem a manutenção da Selic em patamares altos já compromete o crescimento da economia em 2007.

Reinaldo Gonçalves, economista e professor da UFRJ, afirmou que o BC demorou para dar velocidade à trajetória de queda da taxa.

- O BC poderia ter sido mais agressivo no passado. A queda de ontem não apaga os erros macroeconômicos. A demora em baixar os juros está aí: o país terá em 2007 mais um ano de crescimento medíocre. É a velha história do vôo da galinha: o Brasil não só não decola, como anda, efetivamente, para trás - criticou.

O economista lembrou que o Fundo Monetário Internacional (FMI) estima que o Brasil cresça 3,5% em 2006 e 2007, ante uma expansão de 4,9% para este ano e 4,7% para o ano que vem na América Latina.

De acordo com o economista Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management, mesmo com as quedas seguidas de juros, o Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto das riquezas produzidas) do país não deve crescer mais que 4% no ano que vem.

- O efeito do juro mais baixo sobre a demanda é claro: aumenta o consumo. Já seus impactos sobre a oferta são menos óbvios, porque carga tributária elevada, pesado custo trabalhista e falta de infra-estrutura continuam limitando a disposição dos empresários em investir. Não bastam os juros baixos - disse Póvoa, que espera um corte de 0,25 ponto percentual na próxima reunião.

Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, a manutenção de juros elevados depreciou o crescimento do PIB nos dois últimos anos, desperdiçando um cenário internacional positivo. Agora, disse, o Brasil pode enfrentar maiores dificuldades.

- No contexto de uma economia mundial que não deverá repetir performance tão vigorosa, seria imprescindível preparar o ambiente interno para viabilizar maior expansão do PIB - afirmou Skaf. - Faltando apenas dois meses e meio para terminar o ano, quem arriscará planejar investimentos para os primeiros meses de 2007?

O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, disse que a atual política monetária só serviria aos especuladores:

- Defendo um corte drástico na taxa de juro para criar condições para o crescimento econômico.

Taxa real é de 9,3%, a maior do mundo

No comunicado, a diretoria do BC informou apenas que a autoridade monetária continua "avaliando o cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação". Foi exatamente o mesmo comunicado da reunião anterior, de agosto.

- A inflação é um dos principais fatores que seguram uma queda maior nos juros reais. Isso acaba levando a uma recuperação mais lenta da economia - avaliou o economista-chefe do BNP Paribas, Alexandre Lintz.

O mercado, segundo relatório do BC, projeta hoje IPCA de 4,05% em 12 meses, abaixo dos cerca de 4,5% que esperava no início do ano. A meta de inflação do governo para 2006 e 2007 é de 4,5%, com margem de dois pontos percentuais para mais ou para menos. Os analistas esperam que o PIB cresça apenas 3% neste ano, abaixo dos cálculos do BC, de 3,5%, e do governo, que fala em 4%.

Mesmo flexibilizando a política monetária continuamente, os juros reais - indicador que realmente conta para a decisão de investimentos das empresas, uma vez que significa o custo financeiro real da tomada de empréstimos - continuam muito elevados: 9,3% ao ano, segundo cálculos da Uptrend Consultoria Econômica, os maiores do mundo.

Para a economista-chefe do ABN Amro, Zeina Latif, a manutenção do mesmo texto do comunicado deixa o BC numa posição mais confortável:

- Para a próxima reunião do Copom (em novembro, a última do ano), a tendência é que as expectativas migrem para mais um corte de 0,5 ponto percentual.

COLABOROU: Aguinaldo Novo

INCLUI QUADRO: A EVOLUÇÃO DA SELIC ( AO ANO) / O RANKING MUNDIAL (AO ANO