Título: TRANSPONDER DO LEGACY ESTAVA INOPERANTE
Autor: Heliana Frazao
Fonte: O Globo, 20/10/2006, O País, p. 18
Boeing se desestabilizou ao ser atingido e caiu de forma tão violenta que agonia só teria durado 20 segundos
SALVADOR. Os resultados das primeiras análise das caixas-pretas do Boeing e do Legacy, feitas em Ottawa, no Canadá, comprovam que o transponder ¿ equipamento que emite sinais do avião para os radares em solo ¿ do jato da Excel Aire estava inoperante no momento da colisão com a aeronave da Gol, no dia 29 de setembro, quando morreram 154 pessoas. Ainda segundo a leitura dos equipamentos, o Legacy se comunicou com a torre de controle em terra até se aproximar de Brasília. Cerca de quatro minutos antes, perdeu contato, e o radar de terra passou a sinalizar, mas sem precisão. As informações foram passadas ao ministro da Defesa, Waldir Pires, pelo presidente da comissão que investiga o acidente, o coronel Rufino Antônio Ferreira, que retornou quarta-feira ao Brasil.
Cauda do Boeing foi atingida
Segundo o ministro, já se sabe também que a cauda do avião da Gol foi atingida pelo Legacy, o que, segundo avaliações técnicas, teria sido decisivo para a sua queda. De acordo com Waldir Pires, tudo leva a crer que, ao ser atingido na cauda, o Boeing se desestabilizou, embicou e caiu violentamente, em parafuso. O ministro supõe que a perda de altitude se deu de forma tão drástica que, em cerca de 20 segundos, os passageiros devem ter perdido os sentidos ou morrido, por não resistirem à pressão. O choque entre o Boeing 737-800 da Gol e o jato Legacy se deu no norte do Mato Grosso, sobre a Serra do Cachimbo, provocando a maior tragédia da aviação comercial brasileira.
¿ O avião nem chegou a planar, entrou em queda de uma forma descomunal. Pelo menos essa é a conclusão a que chegaram os técnicos a partir de análises da forma como a aeronave caiu. Eu não sou técnico, foi o que eles me informaram. Nos conforta saber que as pessoas não sofreram até o fim. Sua agonia foi breve ¿ disse Waldir, depois de conversar com Rufino. Ele explicou que o encontro não teve como objetivo uma prestação de contas técnica.
¿ O coronel Rufino me procurou para dizer que estava encerrando a missão de ter levado as caixas-pretas, e que continuaria acompanhando todo o processo de investigação. As informações mais técnicas, ele passaria aos seus superiores da Aeronáutica, e eu respeitei isso
Segundo Waldir, ainda não são claras as razões que levaram à inoperância do transponder, embora já existam elementos capazes de apontar o que ocorreu com o equipamento.
¿ Esses levantamentos são criteriosos, mas é fundamental sabermos o que houve. Deu pane? O transponder estava desligado? Houve uma interrupção momentânea nos contatos? Isso tudo precisa ser investigado em profundidade, assim como é necessária também uma análise no transponder do Boeing, para sabermos se estava funcionando com precisão. Não podemos descartar nenhuma hipótese ¿ disse.
O ministro também afirmou que, na comunicação entre o piloto do Legacy e o centro de controle de vôo, antes de passar por Brasília, o piloto teria comunicado que voava a 37 mil pés. Waldir Pires observa que os operadores de vôo sabiam da posição, mas esperavam que o jato cumprisse o plano de vôo, baixando para 36 mil pés entre Brasília e a posição Teres.
¿ Essa posição do jato até Brasília era a esperada. A partir de então, ele deveria ter descido para 36 mil pés. A obrigação de qualquer piloto é cumprir o plano de vôo, mas até aonde se sabe, a tragédia se deu a 37 mil pés, o que significa que alguém estava voando na altitude errada, e sabe-se também que o Boeing deveria estar a 37 mil pés ¿ salientou.
Waldir ressaltou que ainda são muitas as interrogações e que não há nada de conclusivo. Disse que as investigações continuam no Brasil e no Canadá, onde foi feito um levantamento completo de todo o material, inclusive da caixa-preta do Boeing, que estava bastante danificada.
¿ Não temos prazo mínimo, nem máximo, para conclusões, porque não queremos fazer nada de forma açodada. De máximo, somente o esforço para chegarmos aos fatos reais e concluirmos a liberação dos corpos de todas as 154 vítimas. De resto, temos que tirar lições dessa tragédia. Sabermos se houve falha humana ou técnica, para justificar algo sem precedentes na história da aeronáutica brasileira.
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