Título: Virada brusca causou colisão
Autor: Taís Mendes
Fonte: O Globo, 20/10/2006, Rio, p. 20

Registros de radar mostram que manobra inesperada provocou choque entre barcos

Registros do radar do navio cargueiro Roko, que bateu numa traineira na Baía de Guanabara na noite de terça-feira, provocando a morte de oito pessoas, revelam que as duas embarcações estavam em rotas paralelas, em sentidos opostos, distantes cerca de 150 metros uma da outra. A plotagem ¿ apresentação gráfica dos registros do radar do navio ¿ mostra, ainda, que o barco Costa Azul navegava à direita do cargueiro e foi atingido pelo lado esquerdo. Segundo o capitão dos Portos, o capitão-de-mar-e-guerra Antônio Fernando Monteiro Dias, em algum momento da navegação uma das embarcações fez uma manobra brusca, provocando a colisão. Ontem a Marinha e o Corpo de Bombeiros resgataram os dois últimos corpos, concluindo a remoção das vítimas. O inquérito da Marinha poderá ser concluído em 30 dias.

O cargueiro frigorífico Roko, com 108 metros de comprimento, e não 180 como anunciado anteriormente, entrara na baía para abastecer antes de seguir para a Ucrânia. Por volta das 23h, a 1,5km da Ponte Rio-Niterói, o navio colidiu com o Costa Azul, de 15 metros de comprimento, de Santa Catarina, a serviço da empresa Tecsub, de Santos, que atua nas obras do emissário da Barra. O Roko navegava no canal de entrada e saída da baía. A embarcação menor tinha 12 pessoas a bordo: nove mergulhadores, dois marinheiros e o mestre-arrais. Quatro mergulhadores sobreviveram. Após a colisão, o Costa Azul naufragou e foi parar a 37 metros de profundidade.

Sem querer afirmar de quem foi o erro, o capitão dos Portos destacou que seria mais difícil para o navio cargueiro, com 108 metros de comprimento, fazer uma manobra brusca.

¿ É difícil um navio mercante fazer uma virada brusca. Ele se movimenta lentamente. Além disso, é regra que embarcações de menor porte, ao avistarem um cargueiro, saiam do caminho. É um processo rotineiro no mar ¿ disse o capitão dos portos. ¿ O navio vinha no máximo a 12 nós (20 km por hora) e o barco a nove nós (15 km por hora). Seria possível desviar. No mar não se deixa que as coisas aconteçam muito perto. O bom navegador toma medidas que evitam problemas a curta distância ¿ completou.

Segundo o oficial, as informações da plotagem mostram que o radar do Roko não apresentava problemas:

¿ A representação gráfica do radar detalha a rota do navio e mostra que a embarcação menor estava delimitada no radar.

De acordo com os registros do radar, o barco Costa Azul navegava em rumo sul, quase oposto ao navio Roko, que seguia no rumo norte, num afastamento de cerca de 150 metros entre eles.

¿ Algo aconteceu que as duas embarcações vieram a colidir. Todas as regras estavam sendo cumpridas até um determinado momento. Até chegar muito perto, os rumos eram paralelos. Nenhuma das duas precisava desviar. Não era para o navio desviar naquele momento. A regra de navegação permitia que as duas embarcações passassem uma pela outra sem nenhum problema ¿ acrescentou.

Embora tenha dito pela manhã que o navio manteve a posição até a colisão, à tarde o capitão dos portos preferiu não comentar o fato:

¿ Vamos analisar as informações com muito cuidado e não seria correto levantar hipóteses que podem não se concretizar. Um dos dois fez uma guinada brusca. Ou os dois, mas isso não é comum ¿ disse.

Contramestre e prático prestam depoimentos

O capitão dos portos voltou a dizer que 80% dos acidentes marítimos acontecem por falha humana, mas não descartou a possibilidade de uma problema mecânico.

¿ Em tese, por exemplo, o leme de uma das embarcações pode ter ficado preso ou pode ter acontecido uma falha mecânica, como o motor ter desligado e o mar ter jogado uma embarcação contra a outra. Mas também existe a possibilidade de as pessoas terem se distraído, sem perceber que outro navio está chegando. Isso infelizmente acontece.

O contramestre do Roko e o prático Expedito Damasco, contratado para auxiliar nas manobras dentro da Baía de Guanabara, prestaram depoimento ontem na Capitania dos Portos. O prático depôs durante quatro horas e deixou o prédio sem falar com a imprensa.

¿ O depoimento do prático é importante. Eu o conheço, é um profissional com 40 anos de experiência, um dos melhores que temos e viu tudo. Ele tem todas as informações, mas por enquanto não podemos divulgar ¿ disse o capitão-de-mar-e-guerra Monteiro Dias.

O cargueiro Roko e sua tripulação continuam impedidos de deixar o Rio. Embora as buscas aos corpos tenham sido concluídas ontem, a Marinha manterá embarcações na área do acidente e já pediu à empresa Costa azul, dona do barco, que o retire do canal de entrada do porto do Rio.

¿ Já solicitei oficialmente o plano de remoção. A embarcação está no canal varrido de acesso ao porto do Rio. Apesar da profundidade de 37 metros, é conveniente retirar a embarcação, mas ficará a cargo da empresa proprietária. Tudo que possa obstruir a navegação deve ser retirado. A Marinha dará apenas o apoio, caso seja necessário ¿ disse o capitão-de-mar-e-guerra Monteiro Dias.

O oficial destacou que a Marinha, que hoje tem nove embarcações, receberá mais duas na próximo segunda-feira para intensificar a fiscalização na Baía de Guanabara.

¿ Temos uma preocupação grande com a segurança. Para se ter uma idéia, este ano já fizemos o dobro de operações em relação ao ano passado. No mínimo cinco por semana. Nossa meta é orientar para que não ocorram problemas dessa natureza.