Título: DIFÍCIL ESCOLHA ENTRE PAIS E FILHOS
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 22/10/2006, O País, p. 8
Giambiagi defende mudança na Previdência Social
O economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Fabio Giambiagi já foi hostilizado muitas vezes por defender mudanças drásticas nas regras da aposentadoria. Ele insiste que este é o problema mais dramático do setor público, mas tratado com hipocrisia pela sociedade. Por isso mesmo, não vem sendo discutido pelos candidatos à Presidência da República. Trata-se de "uma escolha entre nossos pais ou nossos filhos", diz ele no livro "Reforma da Previdência ¿ O encontro marcado", que acaba de chegar às livrarias.
Por que a questão da Previdência é tão grave?
GIAMBIAGI:A despesa do INSS era de 2,6% do PIB em 1988; chegou a 5% do PIB em 1994, no lançamento do Plano Real;, atingiu 6,5% do PIB em 2002, último ano do governo Fernando Henrique; e atingirá 8% do PIB em 2007. Mais do que triplicou o seu peso na economia. E é de agora em diante que o envelhecimento da população vai se tornar crítico. A população de idosos dobrará em 30 anos.
Se é crucial, por que nem Lula nem Alckmin apresentaram propostas para resolvê-lo?
FABIO GIAMBIAGI: Os custos são visíveis e imediatos e os benefícios, são difusos. Uma reforma possibilitaria crescimento econômico maior nos próximos 20 anos e evitaria que as contas públicas entrassem em colapso. São coisas que a sociedade não pode ver imediatamente.
Por que é difícil para os governantes discutirem abertamente?
GIAMBIAGI: Havendo duas forças polares em conflito, cada uma tem medo de piscar primeiro. Se um dos grupos aceitar discutir, usando uma metáfora futebolística, pode cair em impedimento diante da sociedade.
E depois da eleição?
GIAMBIAGI: Passada a eleição, deveria ser objeto de negociação política e de entendimento entre os pólos que se aglutinam em torno do PT e do PSDB.
Como conciliar a receita amarga com as limitações políticas?
GIAMBIAGI: Uma reforma desse tipo será sempre controversa. Vai gerar animosidade e oposição. Mas a população tem que saber que as regras do jogo de hoje geram um malefício similar ao que existia na época da inflação alta, em que os aumentos salariais eram enormes, mas depois o seu poder de compra ia caindo. A sociedade vai ter que optar entre comprometer a capacidade de crescimento do país ou aceitar novas regras. É uma escolha entre nossos pais ou nossos filhos.
Qual é a sua proposta?
GIAMBIAGI: Realizar mudanças graduais para as novas aposentadorias. O valor seria corrigido pela inflação, mas sem novos aumentos reais. Inclui a desvinculação entre o piso e o salário mínimo, que afeta a maior parte da população, mas não seria tão difícil aprovar, porque não haveria perdas. Outras medidas afetam mais a classe média, grande beneficiária das aposentadorias por tempo de contribuição. Nesse caso, haveria perdas.
Poderia detalhar a proposta?
GIAMBIAGI: Adoção, a partir de 2010, da idade mínima de 55 anos para mulheres e de 60 anos para os homens, já em vigor para os funcionários públicos, com aumento gradual, nos 20 anos seguintes. Redução de cinco para dois anos da diferença entre homens e mulheres. Quem quiser se aposentar por idade terá que contribuir mais tempo: os atuais 12,5 anos passariam a até 25 anos em 20 anos. Nesse período, proponho eliminar os regimes especiais que reduzem em cinco anos o tempo de aposentadoria de professores e do meio rural.
Os reajustes acima da inflação diminuem a desigualdade?
GIAMBIAGI: Preservar o poder aquisitivo dos nossos pais e avós é justíssimo. Mas, nos últimos 12 anos, a aposentadoria básica aumentou 95%, enquanto o rendimento médio real de quem está na ativa é hoje menor do que quando foi lançado o Plano Real. Isso não faz sentido.
E quem não contribuiu?
GIAMBIAGI: Continua com o benefício assistencial do LOAS, equivalente hoje a um salário mínimo, a partir de 65 anos. Mas no futuro ele não seria concedido na mesma idade e valor de quem contribuiu. A proposta é, após um período de transição, elevar a idade para 70 anos e o valor do benefício ficar em torno de 75% do piso previdenciário.
É de agora em diante que o envelhecimento da população vai se tornar crítico. A população de idosos dobrará em 30 anos.
Passada a eleição, deveria ser objeto de negociação política entre os pólos que se aglutinam em torno do PT e do PSDB