Título: PSDB QUER CONVOCAR GILBERTO CARVALHO À CPI
Autor: Bernardo de La Pena
Fonte: O Globo, 22/10/2006, O País, p. 18

Chefe de gabinete da Presidência admitiu ter telefonado para Lorenzetti no dia da prisão dos petistas envolvidos com o dossiê

BRASÍLIA. O PSDB vai propor amanhã a convocação do chefe de gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, para depor na CPI dos Sanguessugas. O auxiliar do presidente Lula admitiu na sexta-feira ter conversado por telefone duas vezes com o petista Jorge Lorenzetti no dia em que Gedimar Passos e Valdebran Padilha foram presos no Hotel Ibis de São Paulo com o R$1,7 milhão que seria pago em troca de um dossiê contra os tucanos. Lorenzetti, chefe do serviço de inteligência do PT na época, foi apontado no relatório preliminar da Polícia Federal sobre o caso como o responsável pela operação.

O relatório da PF foi entregue na sexta-feira à Justiça Federal de Mato Grosso. Para o sub-relator da CPI, Carlos Sampaio (PSDB-SP), a informação de que Carvalho falou com o chefe da operação é a prova de que no Palácio do Planalto se tinha conhecimento da operação para compra do dossiê:

¿ Gilberto Carvalho ligou para Lorenzetti no dia da prisão, quando ninguém no Brasil sabia quem eram os envolvidos. Ligou para ele por quê? Suponhamos que fosse porque ele era o coordenador de risco da campanha. Mas por que esperou a quebra do sigilo telefônico dele para contar isso? ¿ ataca o deputado.

Na sexta-feira, Carvalho disse que conversou duas vezes com Lorenzetti naquele dia e que seu único objetivo foi tentar saber mais informações sobre a prisão dos dois petistas. Ele explicou que havia recebido uma ligação de um funcionário do comitê da campanha pela reeleição do presidente Lula na manhã do dia 15. Carvalho teria sido orientado a ligar para Lorenzetti para saber mais sobre o assunto que teria sido classificado como grave e complicado.

O sub-relator da CPI diz acreditar também que o ex-assessor especial do presidente Lula Freud Godoy participou da operação. Embora no relatório da PF existam apenas referências aos depoimentos em que Freud negou ter participado do episódio, Sampaio disse que os documentos do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) revelam que Freud já movimentava elevadas quantias em dinheiro.

Freud depositou R$150 mil

O rastreamento feito pelo Coaf mostra que o auxiliar do presidente fez um depósito em dinheiro no valor de R$150 mil na conta de sua mulher, Simone Messeguer Godoy, no dia 24 de março de 2004. Ao explicar o depósito, Freud informou que o dinheiro fora obtido com prestação de serviços.

¿ Não sabia que um assessor da Presidência podia fazer isso. E não conheço nenhum caso de alguém que tenha feito um depósito neste valor em dinheiro que não seja para despistar a origem dos recursos ¿ afirmou o subrelator.

Apesar de considerar difícil encontrar a origem dos reais que seriam entregues ao empresário Luiz Antônio Vedoin em troca do dossiê contra tucanos, o delegado Diógenes Curado Filho, responsável pela investigação da Polícia Federal, afirma no seu relatório que existem fortes indícios de que parte do dinheiro saiu do jogo do bicho no Rio de Janeiro.

Investigação conduzida pelo setor de inteligência da PF no Rio esclareceu o significado dos carimbos ¿Caxias-118¿ e ¿119 - Cpo Grande¿ que marcavam as cintas de papel que envolviam uma parte do dinheiro apreendido com Valdebran e Gedimar. ¿O número 118 é a identificação de uma banca de jogo de bicho no município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Por conseqüência, o número 119 seria a identificação da banca de jogo do bicho do bairro de Campo Grande, na Zona Oeste do Rio¿, explica o delegado no relatório enviado à Justiça.

O dinheiro, segundo a Polícia Federal, teria sido retirado do ¿descarrego¿, que seria uma espécie de garantia repassada por todos os bicheiros. O ¿descarrego¿ é uma parcela variável da arrecadação de cada banca, controlada pela cúpula do jogo de bicho, e que serve para o pagamento de apostadores que ganhem grandes quantias em qualquer banca de jogo de bicho. A PF fez operações nas duas bancas de bicho, em Caxias e Campo Grande, mas o delegado informa no relatório não ter encontrado nada. Ele acredita que isso aconteceu porque desde o começo da investigação foram divulgadas fotos das fitas que envolviam o dinheiro com o carimbo.

Ao pedir mais prazo para as investigações, o delegado diz que são necessárias mais operações para comprovar que parte do dinheiro teve origem na contravenção carioca.

Dólares em fase final de apuração

A PF aposta no rastreamento que está sendo feito sobre a origem dos US$248 mil que faziam parte do total de R$1,7 milhão apreendido. ¿As investigações sobre a origem dos dólares estão em sua fase final e demandarão medidas que serão tratadas em conjunto com a Justiça, o Ministério Público e esta Polícia Federal¿, escreveu o delegado.

Parte dos dólares apreendidos tinha numeração seqüencial, o que facilitou a identificação com a ajuda do governo americano. ¿As séries de notas entraram no Brasil pelo Banco Sofisa. Até aquele momento havia controle sobre a numeração das cédulas. O banco vendeu a corretoras de câmbio que, por sua vez, venderam às casas de câmbio que repassaram a particulares. Em todo esse caminho não existiu mais controle de notas e, pior, começaram a surgir fraudes para esconder a real operação de compra de dólares, revelando os já conhecidos laranjas¿, diz o relatório.

No documento, o delegado destaca o trabalho de investigação conduzido pela Polícia Federal em Brasília, Mato Grosso, São Paulo e Rio de Janeiro, e por divisões como a de Combate aos Crimes Financeiros e a de Inteligência.