Título: PF: CINCO LARANJAS COMPRARAM US$ 249.900
Autor: Jailton de Carvalho
Fonte: O Globo, 24/10/2006, O País, p. 9

Quantia vendida pela Vicatur chamou a atenção dos policiais por ser pouco mais dos US$ 248.800 do dossiê

BRASÍLIA. Numa tentativa de apertar o cerco sobre os donos do dinheiro usado por petistas para a compra do dossiê contra políticos tucanos, a Polícia Federal está tentando localizar pelo menos cinco pessoas que teriam sido usadas como laranjas em operações que resultaram na venda de US$249.900 pela corretora Vicatur, em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, entre agosto e setembro. O valor é apenas US$1.100 acima dos US$ 248.800 que um grupo de petistas arrecadou para comprar um dossiê da família Vedoin. Para a polícia, a coincidência de valores é uma importante pista para se chegar à origem do dinheiro.

A polícia não tem dúvidas de que os compradores do lote de US$249.900 são laranjas. Em levantamento preliminar, os policiais que estão atuando no caso descobriram que nenhuma dessas pessoas teria capacidade de comprar valores expressivos de moeda estrangeira.

¿ São pessoas pobres e humildes. Ao que tudo indica, não tinham noção do que acontecia ¿ disse um policial.

A PF não associou a procura de laranjas às casas de câmbio Diskline, de São Paulo, e Centaurus, de Florianópolis, que também são investigadas por suspeita de terem recebido dólares do Banco Sofisa, de São Paulo, e repassado a petistas responsáveis pela compra do dossiê.

Empresa diz que opera legalmente

A PF não sabe se eles fizeram papel de laranjas para a Vicatur ou se agiram a pedido do cliente interessado em esconder sua identidade. Os policiais estão tendo dificuldades para esclarecer esse aspecto do caso porque em quase todas as buscas em casas de câmbio foram descobertos indícios de uso de laranjas. Em alguns casos, as pessoas emprestam nomes, números de identidade e CPF para justificar transações de terceiros. Em outros casos, os dados são usados à revelia dessas pessoas.

Mas, mesmo sem condições de estabelecer com nitidez essas diferenças, a PF chegou a cogitar um pedido de prisão de algumas pessoas envolvidas nas transações da Vicatur com os laranjas. Seria uma medida de impacto. Para a PF, a prisão de laranjas e funcionários da empresa poderia facilitar possíveis confissões. Mas o vazamento prévio da informação sobre as investigações em torno da Vicatur fez a polícia mudar de planos. Uma busca que estava prevista para ontem teria sido suspensa.

A Vicatur, de Nova Iguaçu; a Diskline, de São Paulo; e a Centaurus, de Florianópolis, negaram qualquer operação irregular. Marco Apolo, representante dos sócios da Vicatur, não quis, porém, revelar o nome da corretora na qual a empresa compra dólares. A casa de câmbio funciona na Avenida Governador Amaral Peixoto, no Centro de Nova Iguaçu, e seus proprietários são Fernando Manoel Ribas Soares e Sirley da Silva Chaves.

¿ A empresa funciona na legalidade. Todas as operações feitas são informadas ao Banco Central e ao Banco do Brasil. A documentação será apresentada, seja na delegacia ou em juízo. Não há nenhuma relação com dossiê ¿ disse Apolo.

Sirley chegou a admitir que os dólares podem ter sido retirados por várias pessoas. Mas Apolo a interrompeu.

¿ Aqui não tem criminoso fugitivo da polícia. Estão querendo pegar um bode expiatório nessa história ¿ disse ele.

Clóvis da Costa, diretor da Diskline, não quis dar entrevistas. Funcionários da empresa negaram a operação e disseram que a casa só faz ¿negócios legais e registrados¿, com identidade e CPF de compradores.

¿ A atividade da empresa é mais de turismo que de câmbio. Não tem sentido fazer nada irregular ¿ disse uma funcionária.

Em Florianópolis, o doleiro Vilson Anjos, dono da Centaurus, negou a conexão da empresa com Jorge Lorenzetti. Segundo o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), a empresa teria vendido US$150 mil para Lorenzetti, apontado pela PF como articulador da compra do dossiê.

Anjos disse que só conhece Lorenzetti pela TV e nunca fez qualquer operação de câmbio com ele. O empresário admitiu, no entanto, que sua casa de câmbio é a única da cidade que faz transações com a corretora Action, de São Paulo, que teria repassado US$150 mil que entraram no país via Banco Sofisa.

¿ As operações de venda de dólares são de valor médio entre US$1 mil e US$4 mil. Logo, uma operação nesse montante estaria fora dos padrões do nosso negócio. Não há venda superior nem igual, para pessoa física ou jurídica, em valores superior há US$7 mil em todos os nossos registros ¿ disse Anjos.